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ANÁLISE
Reação à terceirização externa desafia o bom senso
DO "FINANCIAL TIMES"
Os políticos normalmente
não procuram assumir o
crédito -muito menos em um
ano eleitoral- por projetos de lei
que tornarão os serviços governamentais menos eficientes e mais
dispendiosos. Mas seriam essas as
conseqüências lógicas da aprovação nesta semana, pelo Senado
dos EUA, de uma lei que proíbe
terceirizar contratos federais para
países em desenvolvimento?
Não é isso, evidentemente, que
os proponentes da medida dizem
pretender. Como diversas outras
propostas em discussão no Congresso e nos legislativos estaduais,
a medida tem por objetivo conter
a crescente transferência de atividades industriais e de serviços para locais de baixo custo, à qual
vem cada vez mais sendo imputada a culpa pela recuperação econômica com baixo emprego que
os EUA vêm atravessando.
Como todas as medidas de protecionismo comercial, restrições à
"terceirização externa" de trabalho para o governo podem servir
para estimular o emprego nos Estados Unidos, mas apenas no curto prazo. Boa parte do trabalho
transferido ao exterior no setor de
serviços, até agora, consiste de atividades rotineiras, como centrais
de atendimento telefônico e processamento de "back-office", que
podem ser computadorizadas. A
menos que os contribuintes estejam dispostos a pagar mais do que
já vêm fazendo para que sejam
realizadas manualmente nos
EUA, a transferência ao exterior
ou a automatização provavelmente será inevitável.
Não é certo ainda que as propostas em discussão venham a se
tornar lei. Mesmo que o façam,
talvez seu impacto direto seja limitado. Os contratos do governo
dos EUA representam uma proporção minúscula da terceirização externa realizada na Índia
-hoje, o país que mais se beneficia da tendência. No entanto, dada a atual histeria norte-americana sobre o tema, existe o risco de
que restrições mais draconianas
sejam adotadas no futuro.
A perspectiva está começando a
alarmar importantes empresas
norte-americanas, como a General Electric, que recentemente
alertaram seus acionistas quanto
à possibilidade de que as operações sejam materialmente afetadas por esse tipo de restrição. Algumas empresas enfrentam também pressão sindical para reduzir
a terceirização e temem se tornar
alvo de campanhas hostis de defesa do consumidor.
Diante da competição mundial
incansável, as empresas dos EUA
estão contando pesadamente
com medidas de corte de custos
para produzir o crescimento de
lucros necessário para justificar a
avaliação que suas ações vêm sustentando nas Bolsas. Muitas pretendem fazê-lo transferindo operações para o exterior. O que as
atrai não é só a economia de custos mas, cada vez mais, a disponibilidade abundante de capacitação profissional em áreas como a
ciência, a engenharia de software
e o desenvolvimento de produtos,
na Índia e em outros países.
Inibir seu acesso a esses recursos não só reduziria sua produtividade, o propulsor da futura
criação de empregos nos EUA,
mas também ameaçaria seu desempenho financeiro, elevaria o
custo do capital e reduziria sua capacidade para investir e se expandir. Certamente não é isso que desejam os políticos americanos.
Infelizmente, as vozes do bom
senso econômico foram dominadas pela demagogia eleitoral e pelas posições populistas. A tentativa -com base em indícios tênues- de imputar a culpa pelos
problemas econômicos dos Estados Unidos à terceirização externa indica que os democratas encaram essa causa como uma ferramenta para a vitória nas urnas.
A confusão evidente do governo
Bush quanto à melhor maneira de
reagir às acusações só serve para
encorajar essa crença.
As empresas parecem ter sido
apanhadas tão desprevenidas
quanto a Casa Branca, pela violência da reação. Algumas nem
sequer imaginavam que isso
aconteceria. Outras parecem ter
presumido que a questão era apenas uma moda de ano eleitoral,
que desaparecerá quando o pleito
estiver decidido. É possível que as
coisas transcorram assim, mas até
lá os danos já terão sido causados.
Os números decepcionantes sobre a criação de empregos em fevereiro, divulgados ontem, só servirão para alimentar as chamas.
Até que a quantidade -e, igualmente importante, a qualidade-
dos novos empregos aumente, o
frenesi quanto à terceirização externa provavelmente continuará,
e com ele o risco de erros tolos de
política. Se as empresas dos EUA
quiserem evitar as conseqüências
de um erro como esse, é melhor
que comecem a contra-atacar.
Tradução de Paulo Migliacci
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