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Brasil é alvo de ricos em pacto antipirataria
Tratado é negociado a portas fechadas por EUA, Japão, União Europeia e outros oito países; China também pode ser afetada
Se o acordo for firmado, afetará a distribuição de remédios genéricos e de conteúdo na internet, com impacto sobre os usuários
LUCIANA COELHO
DE GENEBRA
ANDREA MURTA
DE WASHINGTON
Um acordo sobre propriedade intelectual negociado a portas fechadas por EUA, Japão,
União Europeia e outros oito
países terá como alvo maior
Brasil e China, segundo apurou
a Folha. Se selado, afetará de
distribuição de remédios genéricos a conteúdo na internet.
O Acta (acordo comercial antipirataria, na sigla em inglês)
passa ao largo de instituições
multilaterais como a OMC e a
Organização Mundial para
Propriedade Intelectual (Ompi) e teve seu cronograma de
negociações acelerado recentemente para permitir sua assinatura até o fim deste ano.
Caso a meta seja cumprida,
segundo um rascunho divulgado na semana passada pela UE
e os EUA, mudará radicalmente a distribuição de conteúdo
sem licença na rede -infratores perderão o acesso à internet- e afetará o comércio de
medicamentos genéricos, facilitando a apreensão de cargas
em países de trânsito.
Criará ainda uma dubiedade
de fóruns de arbitragem que
causa preocupação nas instituições envolvidas. Tanto a
OMC como a Ompi confirmaram ter recebido na semana
passada pedidos de parlamentares europeus, insatisfeitos
com a negociação, para examinar o acordo sob o aspecto institucional.
Mas, excluídas até agora das
conversas, nenhuma delas vê
espaço para um parecer.
Embora as negociações tenham começado em 2007, os
primeiros rascunhos do acordo
vieram à luz apenas no mês
passado, primeiro sob a forma
de um texto vazado, ao qual a
Folha teve acesso, depois em
uma versão lapidada divulgada
pela própria UE ante a pressão.
Apesar de o número de países
envolvidos ser restrito (há apenas dois em desenvolvimento,
Marrocos e México), analistas e
diplomatas ouvidos pela Folha
nos EUA, na Europa, no Canadá e no Brasil creem que o Acta
logo se tornará uma moeda de
troca em futuros tratados.
Sob essa ótica, países que
queiram fechar acordos com os
EUA e a UE teriam como condição a assinatura do tratado,
mesmo que não tenham participado de sua confecção.
"Haverá muita pressão para
a adesão ao Acta, especialmente sobre o Brasil, a Índia, a China, a Rússia e, em escala um
pouco menor, a África do Sul",
disse à Folha por telefone Sean
Flynn, que coordena o Programa de Justiça da Informação e
Propriedade Intelectual da Escola de Direito de Washington,
na American University.
Fora do debate como os demais Brics, Brasília não vê a iniciativa com bons olhos.
"É um acordo plurilateral
feito sem a participação dos
países em desenvolvimento,
com umas poucas exceções",
afirma o embaixador do Brasil
na OMC, Roberto Azevedo. "É
uma tentativa de impor padrões ao resto do mundo e fere
os Trips [o acordo de propriedade intelectual e comércio assinado na OMC em 1994]."
Há riscos mesmo que o país
não se una aos signatários. O
Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Direito-Rio alerta
que o Acta pode virar instrumento de pressão para alterar a
legislação doméstica.
Consenso a favor
Os EUA não escondem que
há forte consenso político e
empresarial em favor do Acta,
em parte devido à expectativa
de que o acordo final exportará
uma visão mais semelhante às
leis americanas do que outras.
"O rascunho foi bem avaliado
por Washington, pois aborda as
preocupações do país", afirmou
Mark Esper, vice-presidente
executivo para propriedade intelectual da Câmara de Comércio americana. "Pelo que o [escritório americano para o Comércio] USTrade nos diz, a versão final será coerente com as
leis dos EUA e o escopo será parecido com acordos de livre comércio que já temos."
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