São Paulo, terça-feira, 06 de junho de 2000


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OPINIÃO ECONÔMICA

Crescer e realizar

BENJAMIN STEINBRUCH

N ada é mais importante para pessoas, empresas e países do que a busca constante e até obsessiva do crescimento e da realização.
No dia-a-dia do trabalho e mesmo na vida pessoal, nunca podemos perder a perspectiva da ação indicada por essas palavras. Nas decisões governamentais é crucial o pensamento fixo no desenvolvimento da economia. Medidas recessivas, ainda que às vezes sejam necessárias, interferem brutalmente na vida de empresas e de milhões de pessoas. Provocam desemprego e sofrimento.
O governo da Argentina, por exemplo, baixou na segunda-feira da semana passada um pacote de medidas que deve ser um alerta para o Brasil. A principal decisão reduz de 12% a 15% os salários dos 140 mil funcionários públicos argentinos.
O corte, considerado corajoso, atinge US$ 938 milhões e foi feito como forma de buscar o equilíbrio em suas contas públicas. Para continuar tendo apoio da comunidade internacional, a Argentina precisa atingir uma meta difícil, estabelecida pelo FMI, a de terminar o ano com um déficit de até US$ 4,7 bilhões. Nos quatro primeiros meses do ano, o déficit acumulado já alcançava a metade desse valor, o que exigiu medidas imediatas do governo do presidente De La Rúa.
É interessante observar a razão pela qual a Argentina promove uma redução de salários, medida impensável para a realidade brasileira. A Argentina optou há quase uma década por uma política de câmbio fixo. Por determinação legal, a moeda do país, o peso, mantém-se estável em relação ao dólar na relação de um para um. Se o peso pudesse ser desvalorizado, o ajuste se faria sem mudança nominal nos salários, mas com perda real equivalente. No setor privado, os salários já vêm sendo naturalmente ajustados (para baixo) pelo mercado. Mas, no setor público, o corte precisa ser feito por decisão governamental.
Não cabe discutir agora a política cambial argentina. Importa observar que o pacote argentino tem caráter recessivo. Há poucos anos, medidas como essa tinham pouca repercussão no Brasil. Agora, não. Depois da consolidação do Mercosul, a Argentina transformou-se em um dos mais importantes parceiros comerciais brasileiros e as decisões tomadas em Buenos Aires têm efeito direto na economia brasileira.
O corte que houve lá, ao provocar uma queda na atividade econômica da Argentina, vai levar esse país a reduzir naturalmente suas importações. É claro que o impacto maior será sobre a própria economia argentina, mas muitos empregos poderão ser perdidos também no Brasil, em setores que exportam parte de sua produção para o país vizinho.
O pior dessa notícia é que ela vem exatamente no momento em que surgem os primeiros sinais de que a recuperação da economia brasileira começa a perder fôlego. Na última quarta-feira, a Fiesp, ao divulgar suas estatísticas mensais, mostrou que o nível de atividade da indústria paulista cresceu apenas 0,4% em abril, muito abaixo da previsão das empresas. Economistas que analisaram os dados da Fiesp juntaram informações preliminares, colhidas em maio em alguns setores da indústria, e concluíram que a retomada econômica parece ter diminuído consideravelmente seu ritmo. Ou seja, a taxa de crescimento do PIB para este ano, antes estimada entre 4% e 5%, pode não ser alcançada.
Crescer a uma taxa razoável, neste momento, é muito importante para o Brasil. Não pode o país perder a oportunidade que se apresenta de continuar a criar empregos nos próximos anos e atenuar seus problemas sociais.
Devemos continuar perseguindo uma redução gradual dos juros, para que tenhamos mais investimentos em produção e serviços, o que aumentará o número de empregos. Isso fará com que haja mais consumo, o que, por sua vez, aumentará riqueza e os impostos, e isso diminuirá a pesada divida social.


Benjamin Steinbruch, 46, empresário, é presidente dos conselhos de administração da Valepar e da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br


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