São Paulo, quinta-feira, 06 de julho de 2000


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OPINIÃO ECONÔMICA

Viés de baixa para os juros, de alta para o dólar

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

O economista , caro leitor, é um ser eminentemente infeliz. Veja o meu caso, por exemplo. Durante anos, avisei que o Brasil havia tomado um rumo errado. Fui tratado de Cassandra para baixo. Veio a crise em 1998-99, os vaticínios se confirmaram e poucos me agradeceram por isso.
Agora as perspectivas da economia melhoraram, mas a opinião pública não quer acreditar. Estive ontem no programa de televisão da Maria Lydia aqui em São Paulo. As minhas previsões de recuperação da economia foram recebidas a patadas por alguns telespectadores.
Um pequeno sintoma de como é grande a insatisfação da população com o governo e de como é baixa, talvez irrecuperavelmente baixa, a credibilidade dos economistas no Brasil.
Mas não era propriamente sobre isso que eu queria falar hoje. Queria era voltar a tratar de juros e câmbio. As expectativas mais favoráveis para a economia estão condicionadas, em larga medida, à possibilidade de seguir a orientação indicada no título deste artigo. Juros menores reduziriam o custo da dívida pública interna e estimulariam a recuperação da economia e do emprego, além de provocar a desejada depreciação cambial.
O pensamento ortodoxo resiste, em geral, à diminuição das taxas de juro. Olavo Setúbal, do Banco Itaú, por exemplo, sustenta que o Banco Central tem que ser visto como guardião da moeda, e não como indutor do desenvolvimento.
Tem razão o importante banqueiro. Porém o Banco Central também não deve, em nome da defesa da moeda, sufocar o crescimento da economia. No Brasil, taxas de juro anormalmente elevadas e uma bateria de restrições à expansão do crédito interno funcionam como freio permanente ao desenvolvimento.
Está ficando cada vez mais evidente que, salvo uma deterioração abrupta do quadro nacional ou internacional, há espaço e motivos para continuar diminuindo os juros.
Menos clara é a necessidade de uma depreciação adicional, mesmo moderada, da taxa de câmbio. Muitos se impressionam com o tamanho da desvalorização do real em relação ao dólar desde janeiro de 1999 (cerca de 50% em termos nominais).
Não há dúvida de que a desvalorização foi expressiva. Os seus efeitos positivos sobre as contas externas ainda não se esgotaram.
Mesmo assim, alguma depreciação adicional é recomendável. Isso por vários motivos. Eis alguns deles:
Primeiro, o superávit da balança comercial tem ficado bem abaixo do previsto. Em consequência, continuam altos demais o déficit em conta corrente, a dependência em relação a capitais externos e a vulnerabilidade da economia.
Segundo, a retomada do crescimento tende a pressionar o saldo comercial. Com a expansão do economia, cresce a procura por importações. Além disso, o aquecimento da demanda doméstica tende a induzir as empresas a redirecionar vendas do mercado externo para o interno.
Terceiro, como a inflação brasileira é significativamente maior do que a dos seus principais parceiros comerciais, a mera estabilização do câmbio nominal resultará em valorização do câmbio em termos reais.
Finalmente, como o euro caiu fortemente em relação ao dólar, a desvalorização efetiva do real é menor do que às vezes se imagina. Segundo a Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex), entre dezembro de 1998 e maio de 2000, a moeda brasileira registrou uma apreciação de 6% em termos reais relativamente a uma cesta de seis moedas européias. Como os mercados europeus são muito importantes para o Brasil, essa apreciação retarda a recuperação das nossas contas externas.
Por esses e outros motivos, é recomendável que a política do Banco Central seja orientada por um duplo viés: de baixa para os juros, de alta para o dólar.
Ou será que o partido do juro alto e do câmbio forte já não fez estrago suficiente neste país?


Paulo Nogueira Batista Jr., 45, economista e professor da Fundação Getúlio Vargas-SP, escreve às quintas-feiras nesta coluna.
E-mail - pnbjr@attglobal.net


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