|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO ECONÔMICA
Uma nova política de juros
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
A mudança na forma de intervenção do Banco Central
no mercado de taxa de juros, o
principal instrumento de política
monetária no Brasil, é hoje um
dos pontos importantes de uma
agenda de reformas microeconômicas. Ela não está incluída no
elenco de propostas do governo,
mas deve ser ponto de reflexão
dos economistas brasileiros.
Já existe um trabalho, realizado
por um grupo de técnicos de um
dos grandes bancos internacionais que operam no Brasil, que
toca de uma forma competente
nessa questão. Mas é preciso que
essa reflexão comece a ser feita de
maneira pública e sem as restrições normalmente existentes dentro de uma instituição financeira.
As condições macroeconômicas
do Brasil hoje permitem que um
mecanismo importante como a
intervenção no mercado monetário possa ser discutida sem receios. Mesmo porque não se está
discutindo a base da política monetária, que é a possibilidade de
intervenção sobre a demanda
agregada via elevação ou redução das taxas de juros. Também
não está em questão o modelo de
metas de inflação, adotado há alguns anos no Brasil com relativo
sucesso.
Estaremos apenas buscando
um processo de mudanças que coloque o mercado brasileiro em linha com o que ocorre na quase
totalidade das economias com
tradição de estabilidade de preços. Trata-se, portanto, de um esforço de aperfeiçoamento dos mecanismos de mercado para chegar
a uma institucionalidade mais
eficiente que a de hoje. Por outro
lado, essas mudanças caminham
no sentido de uma redução importante na conta de juros do governo.
Faço essas observações para que
não se catalogue essa minha posição como mais uma irresponsabilidade de um desenvolvimentista
brasileiro. Lembro que sou hoje
um dos mais antigos profissionais
do mercado financeiro em atividade no Brasil. Sempre mantive
um equilíbrio entre teoria e prática nestes meus mais de 37 anos
como sobrevivente de uma atividade perigosa e traiçoeira. Também já estive duas vezes no governo, quando vivi a experiência de
tratar das questões monetárias e
de operação de mercado do outro
lado da cerca.
Mostradas essas minhas credenciais, passo agora a detalhar o
que me parece ser um "road map"
seguro para essas mudanças.
Creio que deveríamos evoluir para um sistema operacional no
qual as taxas de intervenção do
BC migrariam para as operações
de mercado aberto, com um prazo de 60 dias e 120 dias. Isso em
um primeiro momento de transição do sistema atual e que vem
sendo mantido inalterado por
mais de 20 anos.
No sistema proposto, as reuniões do Copom definiriam essas
duas taxas em função de uma
análise cuidadosa da situação
macroeconômica e das expectativas dos agentes econômicos. Na
situação de hoje, poderíamos ter
uma taxa de 14% ao ano para as
operações de 30 dias e de 16% para as de 60 dias. Já a taxa de um
dia poderia ser fixada em algo
próximo a 8% ao ano. Com isso,
já teríamos três pontos fixados de
uma teórica "yield curve", o que
permitiria definir a parte mais
longa da curva no mercado à vista e de juros futuros.
Mais adiante, o prazo de 60 dias
poderia ser alongado progressivamente, e as operações de 30 dias
poderiam ser retiradas do mecanismo de intervenção do Banco
Central. Feita essa transição com
sucesso, poderíamos ter a volta da
fixação de um custo para a troca
de reservas bancárias no overnight como base da atuação do
Banco Central. Com a curva de
juros, construída autonomamente pelo mercado e fazendo parte
de nossos mecanismos operacionais, poderíamos, finalmente,
convergir para a institucionalidade padrão das economias mais
avançadas.
Nesse sistema, os títulos de prazos mais longos, tanto privados
como públicos, poderiam estar indexados tanto à taxa de 30 como
à de 60 dias. Poderia ser usado
também um tratamento fiscal
mais favorável para os títulos
mais longos -e o governo o está
propondo-, como um instrumento adicional de alongamento
dos prazos. A retirada desses mecanismos de indexação e o alongamento voluntário dos prazos
dos títulos prefixados só ocorreriam ao longo de um período de
tempo maior, à medida que a
confiança na estabilidade de nossa economia permitisse.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 61,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
Texto Anterior: Barril de pólvora: Petróleo caro pode levar BC a aumentar a a taxa de juro Próximo Texto: Luís Nassif: O Pacto de Lisboa Índice
|