São Paulo, domingo, 06 de setembro de 2009

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G20 põe banqueiros no "corredor da morte"

Autoridades econômicas discutem o aumento da regulação e a taxação de bancos e seus executivos para evitar abusos

Europeus visam os bônus pagos aos banqueiros; já os EUA defendem regras para que as instituições não emprestem "sem limite"

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LONDRES

Enquanto ministros da Fazenda e presidentes de bancos centrais do G20 se reúnem, em Londres, para preparar a cúpula do grupo marcada para os dias 24 e 25 nos Estados Unidos, Caroline White dedica-se a terminar à sua própria maneira de lembrar o primeiro aniversário, no dia 15, da quebra do Lehman Brothers, que precipitou o derretimento do sistema financeiro e transformou o G20, até então corpo técnico pouco reconhecido, em uma espécie de gerente informal da economia mundial.
Caroline desenhou uma pasta para computador que batizou de "Luxuoso Corredor da Morte", relata o jornal britânico "Financial Times". Por fora, pele de crocodilo; por dentro peças de tecido que ela levou do banco falido, no último dia de trabalho nele, após 13 anos de carreira. Tudo coroado pelo logotipo do Lehman Brothers.
Caroline vive agora do "design" e se diz satisfeita com a mudança de rumo na carreira.
Mas os banqueiros e os executivos do setor financeiro ainda se sentem no "corredor da morte", até porque o luxo a eles associado está ameaçado pela ofensiva que os governos, principalmente europeus, lançam contra os ganhos do setor.
A grande discussão entre ministros e presidentes de BCs foi exatamente, para simplificar, se devem ser regulados ou taxados o capital dos bancos ou o dos banqueiros. Ou ambos.
Os europeus preferem atacar os banqueiros. Diz Elena Salgado, a ministra espanhola da Economia: "Todos os países estão pedindo esforços aos cidadãos para sair da crise. Parece lógico que sejam pedidos também aos banqueiros".
Reforçam, em carta aberta, os primeiros-ministros Angela Merkel (Alemanha) e Gordon Brown (Reino Unido) e o presidente Nicolas Sarkozy (França): "Nossos cidadãos estão profundamente consternados ante o retorno de práticas reprováveis apesar do dinheiro dos contribuintes que foi necessário mobilizar para apoiar o sistema financeiro".
Já os Estados Unidos visam o capital dos bancos. Seu secretário do Tesouro, Timothy Geithner, publicou artigo no "Financial Times" alinhando um sólido catálogo de oito pontos para a reforma da regulação do sistema financeiro, cujas falhas são tidas como a principal causa do colapso.
Um dos principais pontos é um limite rígido para a quantidade de dinheiro que um banco pode tomar emprestado, em relação ao seu capital próprio, o que, em tese, evitaria o que o jargão designa como "excessiva alavancagem" -ou seja, fazer operações com dinheiro alheio, até que a roda emperre.
Segundo ponto, parente do anterior: forçar os bancos a levantar bem mais capital no mercado de valores, via lançamento de ações.
Os grandes países emergentes, reunidos no Bric (Brasil, Rússia, Índia e China), também entram no que os banqueiros sentem como "corredor da morte", mesmo não tendo visto derreter seu sistema bancário, até porque fizeram poucas apostas de risco.
Ainda assim, em comunicado emitido na sexta, reclamam uma reforma do sistema financeiro para "não retornar a um padrão de regulação financeira frouxa e supervisão deficiente".

Taxa Tobin
Mas o que mais irritou os banqueiros foi uma proposta de lorde Adair Turner, presidente da Autoridade de Serviços Financeiros, uma espécie de xerife da City, o lendário centro britânico de negócios e, principalmente, finanças.
Ele ressuscitou a chamada Taxa Tobin, proposta pelo Nobel de Economia James Tobin, que queria taxar todas as transações monetárias transfronteiriças, justamente para conter a especulação com moedas.
Lorde Turner propôs a taxação das transações monetárias realizadas pelos bancos, com alíquota entre 0,1% e 0,2%, igualmente para conter operações especulativas.
"Seria uma loucura impor tal taxa unilateralmente sem que seja imposta ao mesmo tempo ao resto do mundo", reagiu furiosamente Richard Lambert, o diretor-geral da CBI (Confederação da Indústria Britânica), que é tida como "a voz dos negócios" no Reino Unido.
Mas a frase que mais indica como os executivos se sentem acuados veio depois: "A City não é alguma excrescência inchada que tira o equilíbrio de toda a economia do Reino Unido", afirmou.
Lambert calcula que os salários de todo o pessoal do setor financeiro representam pouco menos de 4% da economia britânica, enquanto os do serviço público chegam a 16%. O problema é que foram os gerentes desses 16% que tiveram que usar o dinheiro de todos os cidadãos para resgatar do "corredor da morte" incontáveis instituições que, do contrário, estariam hoje com seus logotipos enfeitando outras maletas.


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