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São Paulo, sexta-feira, 07 de fevereiro de 2003

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FUSÃO NO AR

José Viegas (Defesa) refuta idéia de ajuda "de mãe para filho" para as empresas e vê reestruturação do setor

Para ministro, Varig não tinha alternativa

ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Na avaliação do governo, a Varig não tinha outra opção que não fosse caminhar para a fusão com a TAM: "Era fazer ou fazer", disse ontem à Folha o ministro da Defesa, José Viegas, classificando a operação como o início de reestruturação do setor aéreo.
A decisão das duas companhias foi uma espécie de exigência do governo para ajudar o setor. Primeiro, alongando as dívidas da própria Varig. Depois, num prazo estimado em cinco meses, com aporte de recursos do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social).
"Mas o BNDES não vai agir como a mamãe ajudando o filhinho. Não existe isso: se der tantos milhões para a Varig, vai ter que dar para essa ou aquela", disse Viegas, no fim da tarde, em seu gabinete, onde ele recebeu na terça-feira o presidente da Vasp, Wagner Canhedo, e vai receber na próxima quarta-feira o da Gol, Constantino Júnior.
O ministro conclamou os credores privados da Varig a agir em "equanimidade" com os credores públicos no alongamento da dívida da empresa. E avisou que qualquer ajuda à nova empresa que surgir da fusão vai depender dos passos efetivos nesse sentido. Significa, também, um apoio "ao setor", não a empresas.

Folha - A operação de fusão Varig-TAM é para valer ou só para justificar um apoio financeiro do BNDES?
José Viegas -
Acho que sim, que é para valer. É claro que há todo um longo processo até a efetivação de uma nova sociedade acionária, com estimativas de ativos e passivos, negociação com os credores e com o governo, harmonização de frotas e rotas etc., mas o processo já foi deflagrado. A expectativa é chegar até junho com uma situação completamente nova, pronta e acabada.

Folha - Tudo ao que o sr. se referiu ainda falta fazer. E o que já foi feito para a fusão, se é que algo já foi feito?
Viegas -
O que foi feito foi um entendimento político das duas empresas de fazer a fusão. Esse é um propósito efetivo e está consignado oficialmente num protocolo público. Era fazer ou fazer. O processo está estabelecido.

Folha - Mas totalmente embrionário do ponto de vista prático?
Viegas -
Como não poderia deixar de ser, porque estamos no início de um processo que leva meses. O mais importante, que é a vontade política, é inquestionável.

Folha - Onde entra o governo nisso? O Gabinete Civil, a Defesa e o Desenvolvimento pressionaram pela fusão?
Viegas -
É preciso ficar claro que esse processo é eminentemente empresarial. O governo não negociou isso.

Folha - Então, por que o anúncio foi feito dentro do governo, dentro do seu ministério?
Viegas -
Porque o processo de fusão faz parte de um processo de reestruturação do setor da aviação civil, que está desestruturado. As companhias se engajaram em políticas de concorrência definidas como predatórias, selvagens mesmo. É impossível que, nas condições atuais, uma companhia aérea opere com lucro no Brasil. Para que o setor seja sustentável, é preciso que as próprias empresas cuidem de sua saúde.

Folha - Qual o papel do governo?
Viegas -
É estimular ações empresariais de racionalidade econômica. Além disso, trabalhar para um novo quadro institucional, um novo marco regulatório.

Folha - O setor de aviação está em crise no mundo todo, até nos EUA. O Brasil comporta mais de uma grande companhia aérea ou vai acabar com as existentes e criar uma Air Latina, digamos?
Viegas -
No fundo, a resposta depende do mercado e de uma reação inteligente das companhias. Se haverá uma, duas, três ou quatro, vai depender da demanda e da inteligência delas. É evidente que existe um excesso de oferta, mas existem também outros problemas, o câmbio etc.

Folha - Em tese, tudo isso não leva à sobrevivência de uma só grande companhia?
Viegas -
Vamos admitir que sim, que, em tese, só quando você tiver apenas uma empresa você terá escala econômica suficiente para um mercado como um nosso. Mas isso é compatível com a realidade? E a concentração? O que dirá o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica)?

Folha - O pacote do BNDES vai sair só para TAM-Varig, ou a Gol e a Vasp têm direito a exigir fatia?
Viegas -
A Gol e a Vasp podem pedir o que as outras pediram, ou seja, zero dinheiro e um apoiozinho em favor da racionalidade administrativa. Mas o BNDES não vai agir como a mamãe ajudando o filhinho. Não existe isso: se der tantos milhões para a Varig, vai ter que dar para essa ou aquela. Existe o princípio da equanimidade, mas há situações diferentes, e reações diferentes, sem privilégio.
O governo dispõe de verbas, dispõe de financiadores que certamente estarão dispostos a ajudar numa operação de socorro, sempre que o setor der mostras inequívocas de que se recupera. No caso da fusão, isso deve demorar em torno de cinco meses.


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