São Paulo, quarta-feira, 07 de abril de 2004

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Lucro baixo barra autofinanciamento

JOSÉ ALAN DIAS
DA REPORTAGEM LOCAL

Para que o setor privado aumente a capacidade de investir em produção, não bastaria que o governo deixasse de ser seu rival na busca por recursos no mercado financeiro. As empresas dependeriam ainda de taxas de rentabilidade maiores que as encontradas hoje no Brasil para também poderem se autofinanciar.
No número da carta do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial) divulgado ontem, o empresário Paulo Cunha (presidente do grupo Ultra) argumenta que, mesmo em economias com baixa volatilidade e com mercado de capitais sofisticados, como os EUA, a principal fonte de financiamento das empresas até o final dos anos 80 foram os recursos próprios.
Cunha assinala que, entre 1946 e 1989, na média, os lucros retidos pelas empresas financiaram 79% dos investimentos americanos -o período é relevante porque a estrutura financeira dos EUA era até então muito mais semelhante à brasileira do que hoje.
No período 1970-1985, Canadá, França, Reino Unido e Alemanha igualmente usaram os lucros retidos para aumentar sua produção: na França, em média, 61% dos investimentos em expansão de capacidade tiveram essa origem e, no Reino Unido, chegou a 100%.
Pelos cálculos do Iedi, nos anos 70, no Brasil, a parcela do autofinanciamento como meio de expandir a produção chegava a 75%. ""Até pelas circunstâncias as empresas eram levadas a se autofinanciar: o mercado de capitais era incipiente, ninguém conseguia, como fazem hoje as grandes empresas, dinheiro no exterior. Sobrava o BNDES e um pouco de recursos dos bancos", diz Júlio Sérgio Gomes de Almeida, diretor-executivo do Iedi.
No relatório, o empresário Paulo Cunha admite que o quadro global de autofinanciamento sofreu alterações nas últimas duas décadas, em razão de juros reais próximos a zero, da sofisticação do mercado de capitais e pela própria queda de rentabilidade das companhias. Ou seja, esses fatores estimularam as empresas, inclusive no exterior, a usar mais recursos de terceiros.
""As recentes bolhas nas Bolsas dos Estados Unidos e no Japão podem forçar uma volta parcial ao modelo antigo, que é mais compatível com a estrutura financeira do Brasil", afirma Cunha.

Condições desfavoráveis
O problema é que, mesmo se quisessem recorrer ao autofinanciamento, dadas as condições atuais, as empresas brasileiras não conseguiriam. Em 1973, segundo o Iedi, as 500 maiores empresas não-financeiras do Brasil tiveram um lucro equivalente a 4,4% do PIB (Produto Interno Bruto). Em 2002, o lucro das 500 maiores foi equivalente a apenas 0,37% do PIB. Para piorar, a rentabilidade patrimonial das empresas, que, em 1973, foi de 15%, caiu para 3,1% entre 1995 e 2002.
""O modelo de autofinanciamento exige lucros elevados, que inexistem no Brasil, em razão do gigantesco peso dos juros, da carga tributária sobre o setor formal e de sua estrutura, que privilegia os impostos sobre bens e serviços", argumenta Cunha.

Revolução fiscal
O empresário afirma que o aumento da rentabilidade do setor produtivo (e expansão no volume de autofinanciamento das empresas) depende do que qualifica de revolução fiscal: que passaria, justamente, pela redução dos juros, mudança do perfil do gasto público e na estrutura tributária.


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