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OPINIÃO ECONÔMICA
Reforma processual
é um processo
GESNER OLIVEIRA
O mundo anda à velocidade
da luz. O Brasil vai devagar,
quase parando. Assim mesmo, há
mudanças em curso, como a reforma processual, que podem modernizar as relações econômicas no
país.
O governo federal enfrenta dificuldade em fixar uma agenda de
prioridades no Congresso. As derrotas do Executivo na Câmara
nesta semana na indicação de nomes para o Conselho Nacional de
Justiça e para o Conselho Nacional do Ministério Público reforçam essa impressão.
Mas seria um equívoco imaginar que está tudo parado. O Executivo não detém o monopólio das
reformas institucionais. Tampouco há um Dia D a partir do qual
todas as reformas serão aprovadas
e o Brasil será um outro país. As
reformas encerram um processo
complexo de mudança que demanda alterações profundas, não
apenas de leis e regulamentos mas
de mentalidade e cultura.
É por isso que as reformas costumam requerer mais de uma administração para acontecer. Foi assim com a Lei de Responsabilidade Fiscal, que fez cinco anos nesta
semana e que resultou de longo e
penoso processo prévio de amadurecimento; e que ainda precisa de
aperfeiçoamentos para garantir a
boa gestão das contas públicas. Será assim com o vasto conjunto de
projetos que compõem a chamada
reforma processual.
Este ano avança rapidamente
sem que vários projetos importantes apresentem chance de aprovação. A infra-estrutura do país está
em frangalhos, mas ainda se discute se as agências reguladoras devem ou não ter mais autonomia.
Reformas como a sindical e a trabalhista são tão urgentes quanto
delicadas do ponto de vista político. À medida que 2006 se aproxima, as chances de avanço nessas e
em outras matérias diminuem.
Não se decide muita coisa em ano
de eleição presidencial e Copa do
Mundo.
Em contraste com tais mudanças, a reforma processual gera menos potencial de divergência. Embora a discussão técnica seja complexa, não há objeção de natureza
político-partidária. O trabalho das
assessorias dos parlamentares está
andando rapidamente, apesar da
paralisia do Congresso.
Exemplo disso é o projeto que
prevê reformulação do processo de
execução de título judicial, já
aprovado pela Câmara e pendente de exame pelo Senado. Há boas
chances de aprová-lo neste ano. Se
isso acontecer, não será uma revolução na economia, mas um passo
importante terá sido dado.
A cobrança de dívidas na Justiça
constitui processo moroso e burocrático no Brasil. Isso aumenta o
risco e inibe a oferta de crédito e o
investimento. A proposta em tramitação torna o procedimento
mais ágil. Uma das mudanças é a
eliminação da necessidade de
abrir uma nova ação na Justiça
para efetuar a cobrança de algo
que já foi reconhecido como dívida em sentença condenatória. Na
atualidade, alguém que já obteve
uma sentença favorável depois de
anos é obrigado a começar novo
calvário para conseguir receber o
dinheiro. Muitas vezes morre antes de receber a quantia que lhe é
devida.
Tal ineficiência da Justiça acentua a concentração de renda. Pequenos credores não dispõem de
recursos para enfrentar a batalha
jurídico-burocrática e acabam desistindo. A inoperância do Judiciário distorce a concorrência em favor das grandes empresas.
Apesar de virtudes, o projeto
ainda precisa ser aperfeiçoado em
vários aspectos, conforme ressalta
nota técnica do consultor do Senado Bruno Dantas. Ainda persiste
grave problema de incentivos e assimetria de informação entre o devedor e o credor. Um exemplo claro é a dificuldade de receber créditos pela necessidade de levantar os
bens do devedor. Em outros países,
como os EUA e a Alemanha, é o
devedor, e não o credor, que tem
de apresentar bens suscetíveis de
penhora.
O sistema judiciário brasileiro é
ineficiente e impõe altos custos para a sociedade, especialmente para os mais pobres e para as empresas de menor porte. A reforma
processual não vai ser aprovada
na íntegra nem vai alterar esse
quadro da noite para o dia. Mais
uma razão para acelerar a tramitação de projetos de natureza técnica e consensual de forma a reduzir o hiato que separa o Brasil dos
países que já atingiram maturidade institucional.
Gesner Oliveira, 48, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, presidente do Instituto Tendências de Direito e Economia e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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