|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO ECONÔMICA
Um novo modelo de crescimento
GERALDO CARBONE
A necessidade da retomada
do crescimento econômico
tem sido uma constante no Brasil
nos últimos 30 anos. Depois do
chamado "milagre brasileiro", a
falta de ciclos longos e sustentados
de crescimento é um tema permanente entre economistas, jornalistas, políticos etc.
Os "culpados" por essa situação
variam ao longo do tempo: a crise
do petróleo na década de 70, o processo inflacionário na década de
80, a política de estabilização de
preços nos anos 90. Se a sociedade
brasileira não se posicionar rapidamente, logo estaremos em busca do "culpado" da primeira década do século 21.
Analisando-se um conjunto de
países, entre 1990 e 2002, nota-se
que há uma correlação positiva e
significante (87%) entre a formação bruta de capital -tomada como indicador do nível de investimento- e a taxa de crescimento
do PIB.
Claro que o investimento não é o
único fator determinante da expansão econômica, mas, sem ele,
dificilmente ela ocorre, já que o
crescimento provocado exclusivamente por aumento do consumo
se sustenta por curtíssimo tempo.
Além disso, o aumento do nível de
investimento é o motor dos ganhos de produtividade, sem os
quais um país -e o Brasil não foge à regra- não consegue inserir-se competitivamente no mapa global.
Logo, parece evidente que a discussão sobre crescimento econômico tem de passar necessariamente pela questão do financiamento do investimento. Esse financiamento se dá basicamente
por duas vias: poupança doméstica ou poupança proveniente do
resto do mundo, esta última expressa pelo déficit em conta corrente do balanço de pagamentos.
Financiar o fluxo de investimentos por expressiva captação de
poupança externa até pode ser viável para países com longa história
de estabilidade, como os EUA,
mas já se mostrou inadequado para nações como o Brasil. As crises
do balanço de pagamentos das décadas de 80, 90 e do ano passado
validam esse argumento.
Fica claro, portanto, que precisamos de um modelo que privilegie
o crescimento da poupança interna como forma de financiar um
novo ciclo de expansão econômica.
Ora, a poupança interna é a soma das poupanças pública e privada. A poupança do setor público
mostra um decréscimo constante
ao longo dos últimos 30 anos, como demonstra o déficit do setor
público. Em outras palavras, o setor público brasileiro tem influenciado negativamente a formação
da poupança interna. Há um sem-número de justificativas para tal
-carências sociais, desequilíbrio
da Previdência Social, elevação
dos encargos sobre a dívida pública-, mas o fato é que não há formação de poupança no setor público brasileiro.
No caso da poupança privada
também se nota uma tendência de
queda, fortemente estimulada pelo aumento da carga tributária,
nos últimos anos. O gráfico na página ilustra a dimensão desse aumento, colocando o Brasil entre os
países de maior carga tributária do
mundo, completamente fora do
padrão observado nas demais economias em desenvolvimento.
É evidente, portanto, que o país
tem um problema estrutural com
relação ao financiamento do seu
crescimento. A poupança externa
foi o grande motor do crescimento
nas décadas de 50 e 60. E, a partir
de então, a sociedade não foi capaz
de gerar poupança interna para
substituir a poupança do resto do
mundo. O resultado tem sido um
baixo crescimento econômico,
que já se torna crônico, com todas
as suas consequências negativas
no campo social.
Esses fatos sugerem que uma
discussão séria a respeito do crescimento econômico deveria passar pelo encaminhamento de propostas que viabilizassem o aumento da taxa interna de poupança. A
taxa Selic ou as taxas de juros do
cheque especial podem ser relevantes para explicar o baixo nível
de consumo, mas nunca poderiam
ser responsabilizadas pelo baixo
nível de crescimento do país. Crescimento acelerado do consumo
sem aumento na capacidade de investir acaba gerando, cedo ou tarde, inflação ou desequilíbrio nas
contas externas.
Daí a importância de alguns
princípios econômicos fundamentais para o aumento da taxa de
poupança e da capacidade de investimento e crescimento:
a) inflação reduzida para estimular a poupança doméstica e
atrair capitais de longo prazo do
exterior. No mundo atual, taxas de
inflação acima de 5% ao ano já são
consideradas elevadas e acima de
10% ao ano são proibitivas;
b) disciplina fiscal, incluindo-se
aí a Previdência Social, que possibilite menor carga tributária e,
portanto, a liberação de recursos
da sociedade para a formação da
poupança doméstica privada.
Além disso, a percepção de disciplina permanente permite um
alongamento dos prazos da dívida
do setor público.
c) Um mercado de capitais desenvolvido, fundamental na alocação da poupança privada em instrumentos de prazo mais longo,
que financiarão os investimentos
de longa maturação dos setores
público e privado. O provedor de
capitais de longo prazo no mundo
desenvolvido não é o setor bancário, é o mercado de capitais.
Sem dúvida, há espaço para a redução das taxas de juros de curto
prazo no Brasil, especialmente se
confirmada a tendência de queda
na inflação. É possível que estejamos diante dessa nova tendência
já nos próximos meses. Quando
isso acontecer, crescerá o consumo das famílias e surgirá a necessidade de um novo ciclo de investimentos. E a verdade é que o país
não tem um modelo de financiamento sustentável (leia-se não inflacionário ou não prejudicial à
saúde das contas externas), além
de apresentar gargalos importantes na infra-estrutura, especialmente no setor elétrico e de transportes.
A sociedade brasileira precisa
definir urgentemente um novo
modelo de crescimento sustentado e de inserção na economia
mundial. Se persistirmos nessa visão de curto prazo de que a taxa de
câmbio é que determina a competitividade externa e que a taxa de
juros de curto prazo é que determina o nível de crescimento econômico, outra década terá passado e continuaremos a perder espaço no mapa global.
A elevação da poupança interna
passa pela permanente disciplina
fiscal, mas, principalmente, por
uma redução da carga tributária.
Logo, parece urgente uma discussão aberta sobre a dimensão e a
natureza do gasto público no Brasil. Buscar equilíbrio fiscal única e
exclusivamente por aumento de
impostos não permite crescimento econômico, especialmente
quando já se atingem patamares
escandinavos na relação arrecadação/PIB.
Seria saudável dirigir o debate
para essas questões fundamentais,
caso contrário estaremos buscando, em breve, o culpado pelo baixo
crescimento da primeira década
do século 21. E, pelo andar da carruagem, o culpado da vez será a taxa Selic!!!
Geraldo Carbone é presidente do BankBoston no Brasil, diretor da Febraban e da Amcham.
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: DICAS/ FOLHA INVEST - Bolsa: Corretora Ágora Senior sugere os papéis da Siderúrgica Tubarão Índice
|