São Paulo, sábado, 07 de dezembro de 2002

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ARTIGO

O estilo da gestão O'Neill

JOÃO MARCUS MARINHO NUNES
ESPECIAL PARA A FOLHA

Paul O'Neill tomou posse como secretário do Tesouro americano no dia 20 de janeiro de 2001. O posto era a coroação de uma carreira distinguida, tanto no setor público como no setor privado. Foi presidente da Alcoa e da International Paper e, entre 1974 e 1977, foi diretor-adjunto do "Office of Budget and Management" (OBM) durante as gestões dos presidentes Nixon e Ford, período durante o qual trabalhou com o atual vice-presidente Dick Cheney e com Alan Greenspan.
Mas, depois da dupla Rubin-Summers, secretários do Tesouro de Clinton, ninguém teria uma vida fácil. Ao assumir o posto, Rubin impôs sua visão, que ficou conhecida como "Doutrina Rubin", segundo a qual superávits fiscais permitem a manutenção de juros reais baixos e aumento nos investimentos privados, que impulsionam o progresso técnico e o crescimento sustentado com inflação baixa.
Não importa que a "Doutrina Rubin" nunca tenha sido demonstrada na teoria. Na prática, foi exatamente isso que aconteceu, com os Estados Unidos usufruindo o mais longo período de expansão econômica da sua história.
Paul O'Neill, ao contrário de Rubin, desde o início primou pela controvérsia. Mais do que a maioria dos membros do gabinete Bush, O'Neill falava o que pensava, sem qualquer preocupação com os efeitos dos seus comentários sobre os mercados, ou mesmo se refletiam a política da administração Bush.
Poucos meses após tomar posse, por exemplo, seus comentários sobre o dólar, na prática negando que o governo tivesse uma preocupação especial com um dólar forte -fama da qual Rubin também gozava- perturbaram os mercados e deixaram os "traders" perplexos.
As comparações com Rubin, feitas por comentaristas, sempre foram desfavoráveis a O'Neill. Em julho deste ano, as diferenças entre os dois atingiram o seu ponto mais alto. Enquanto as bolsas registravam fortes quedas, O'Neill estava fazendo um "tour" pela Ásia, sendo criticado por não fazer nenhum pronunciamento oficial na tentativa de elevar a confiança do investidor. Ao ser interpelado por jornalistas, O'Neill disse "que estava surpreso pela sua ausência ter sido notada". Esse comportamento contrastava com o de Rubin durante as crises asiática e russa.
As gafes em que se envolveu são memoráveis. Sua descrição do colapso da Enron como exemplo da "genialidade do capitalismo" chocou o establishment enquanto que seu comentário de que uma ajuda financeira ao Brasil muito provavelmente "sairia rapidamente do país para contas na Suíça" provocou uma corrida contra o real e um pequeno incidente diplomático.
O mercado americano reagiu bem ao anúncio do seu pedido de demissão. Nos mercados emergentes, a expectativa é de que o próximo secretário cause menos tumulto.


João Marcus Marinho Nunes, economista, é sócio da ForeSee Asset Management e autor de "O Vôo da Águia: A Economia Americana no Fim do Milênio", Saraiva, 2002


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