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VINICIUS TORRES FREIRE
Parou de chover, ficou a enchente
Situação da indústria parou de piorar, parece. Mas, depois do temporal, ainda estamos com água suja até o pescoço
QUEM ESTÁ ALAGADO e com
água suja pela casa, pelo carro ou pelos joelhos não se
consola ao ver o céu clarear nos meses das periódicas chuvas de verão e
da contínua inépcia governamental
para lidar com as cheias. Assim parece, por ora, a situação da indústria:
parou de chover, mas ainda estamos
inundados de maus presságios.
Até junho, agosto, a produção das
fábricas vinha crescendo cada vez
mais devagar. O resultado de outubro, divulgado ontem pelo IBGE,
veio de acordo com as previsões
mais pessimistas, as mais corretas
deste ano exasperante. Mas, agora, a
atividade industrial dá a impressão
de que parou de piorar. Por ora.
A situação está um tico menos penosa mesmo para quem se afogou e
entrou de fato em recessão, encolheu, como os fabricantes de calçados, têxteis, móveis e os de matérias-primas elaboradas para a indústria.
Foram os setores que mais apanharam dos produtos importados e que
perderam negócios de exportação.
O resultado de novembro, pelos
primeiros indicadores, não vai tomando um aspecto muito bom, porém. Nada desastroso. Nada inspirador. Agora, para ver se a indústria
desencalha, é preciso esperar fevereiro, depois de passados os números distorcidos por festas de final de
ano e férias. E quando, segundo o
economista padrão, a queda de juros
estaria enfim fazendo efeito total.
Ou será que entramos em um ciclo
longo de estável mediocridade?
A produção de bens de capital, de
máquinas e equipamentos, vinha
sendo o caso de sucesso, ou de menor insucesso, do ano. Mas há dúvidas e sinais incômodos sobre seu
destino. Como setores importantes,
tal qual o de insumos industriais, estão apanhando e as empresas cada
vez mais procuram matérias-primas importadas mais baratas, fica a
questão: quem vai comprar mais
máquinas para produzir e elaborar
tais insumos por aqui, no Brasil?
O otimista dirá que, no último ciclo de real forte e importações baratas, a renovação produtiva facultada
pela compra no exterior de máquinas mais modernas acabou por aumentar a produtividade da indústria
nacional e auxiliou a disparada das
exportações. Esse ciclo anterior
(1994-1998, sob FHC) de sustentação do câmbio quase fixo e do real
forte, que influenciou tal renovação
produtiva, ajudou a quebrar o governo e a estourar a dívida pública.
Agora, a conta do câmbio está
caindo na cabeça de empresas, trabalhadores dos setores de bens semiduráveis (móveis, roupas, plásticos etc.) e na renda média do trabalho em geral. Muita máquina também tem sido importada, como antes. Mas este ciclo de real forte ocorre sob a sombra da expansão da China. Antes fabricantes de quinquilharias, os chineses agora produzem
maquinário moderno, compraram
parte da IBM, vendem computadores e daqui a pouco vão chegar com
seus carros baratésimos.
A dúvida que suscita alguma esperança é aquela a respeito das centenas de bilhões de reais ainda estacionados a mamar nos juros ainda altos
pagos pelo governo endividado. Se
os juros continuarem a cair, seria
enfim necessário procurar algum
destino mais rentável para ao menos parte desse dinheiro. Ou a esquisita economia brasileira virá com
mais surpresa ruim?
vinit@uol.com.br
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