São Paulo, quinta-feira, 07 de dezembro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VINICIUS TORRES FREIRE

Parou de chover, ficou a enchente

Situação da indústria parou de piorar, parece. Mas, depois do temporal, ainda estamos com água suja até o pescoço

QUEM ESTÁ ALAGADO e com água suja pela casa, pelo carro ou pelos joelhos não se consola ao ver o céu clarear nos meses das periódicas chuvas de verão e da contínua inépcia governamental para lidar com as cheias. Assim parece, por ora, a situação da indústria: parou de chover, mas ainda estamos inundados de maus presságios.
Até junho, agosto, a produção das fábricas vinha crescendo cada vez mais devagar. O resultado de outubro, divulgado ontem pelo IBGE, veio de acordo com as previsões mais pessimistas, as mais corretas deste ano exasperante. Mas, agora, a atividade industrial dá a impressão de que parou de piorar. Por ora.
A situação está um tico menos penosa mesmo para quem se afogou e entrou de fato em recessão, encolheu, como os fabricantes de calçados, têxteis, móveis e os de matérias-primas elaboradas para a indústria. Foram os setores que mais apanharam dos produtos importados e que perderam negócios de exportação.
O resultado de novembro, pelos primeiros indicadores, não vai tomando um aspecto muito bom, porém. Nada desastroso. Nada inspirador. Agora, para ver se a indústria desencalha, é preciso esperar fevereiro, depois de passados os números distorcidos por festas de final de ano e férias. E quando, segundo o economista padrão, a queda de juros estaria enfim fazendo efeito total.
Ou será que entramos em um ciclo longo de estável mediocridade?
A produção de bens de capital, de máquinas e equipamentos, vinha sendo o caso de sucesso, ou de menor insucesso, do ano. Mas há dúvidas e sinais incômodos sobre seu destino. Como setores importantes, tal qual o de insumos industriais, estão apanhando e as empresas cada vez mais procuram matérias-primas importadas mais baratas, fica a questão: quem vai comprar mais máquinas para produzir e elaborar tais insumos por aqui, no Brasil?
O otimista dirá que, no último ciclo de real forte e importações baratas, a renovação produtiva facultada pela compra no exterior de máquinas mais modernas acabou por aumentar a produtividade da indústria nacional e auxiliou a disparada das exportações. Esse ciclo anterior (1994-1998, sob FHC) de sustentação do câmbio quase fixo e do real forte, que influenciou tal renovação produtiva, ajudou a quebrar o governo e a estourar a dívida pública.
Agora, a conta do câmbio está caindo na cabeça de empresas, trabalhadores dos setores de bens semiduráveis (móveis, roupas, plásticos etc.) e na renda média do trabalho em geral. Muita máquina também tem sido importada, como antes. Mas este ciclo de real forte ocorre sob a sombra da expansão da China. Antes fabricantes de quinquilharias, os chineses agora produzem maquinário moderno, compraram parte da IBM, vendem computadores e daqui a pouco vão chegar com seus carros baratésimos.
A dúvida que suscita alguma esperança é aquela a respeito das centenas de bilhões de reais ainda estacionados a mamar nos juros ainda altos pagos pelo governo endividado. Se os juros continuarem a cair, seria enfim necessário procurar algum destino mais rentável para ao menos parte desse dinheiro. Ou a esquisita economia brasileira virá com mais surpresa ruim?


vinit@uol.com.br

Texto Anterior: Paulo Nogueira Batista Jr.: O rei está nu!
Próximo Texto: Previdência pode restringir pensões, afirma ministro
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.