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LUÍS NASSIF
O guerreiro da tecnologia
Na semana passada, foi lançado, no Rio de Janeiro, o livro "Engenharia da Transparência: Vida e Obra de Lobo Carneiro", de autoria da jornalista Terezinha Costa. Fernando Luiz Lobo
Carneiro é importante demais para a história do país para ser devidamente reconhecido. No país das
irrelevâncias, das planilhas, dos bilharecos, da retórica superficial, do
ouro dos tolos, Lobo Carneiro foi
grande demais, fundamental demais para ser notado.
Ele foi uma das figuras centrais
da criação de uma tecnologia brasileira. É da mesma raça do brigadeiro Montenegro, que foi aos Estados Unidos, importou a experiência do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) e criou
as bases do que viria a ser a futura
indústria aeroespacial brasileira.
Ou do almirante Álvaro Alberto,
que atravessou mares e moveu
montanhas para dotar o país de
tecnologia nuclear. Ou ainda de
Alberto Pereira de Castro, do IPT, e
de lá também Ernesto Pichle, que
fez questão de morrer trabalhando
e ser enterrado com suas botas de
trabalho.
Lobo Carneiro nasceu em 1913,
no Rio de Janeiro. Formou-se aos
21 anos pela Escola Politécnica da
Universidade Federal do Brasil, futura Faculdade de Engenharia da
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Nos anos 40, publicou o "Ensaio Brasileiro", método para calcular a resistência do concreto à
tração e que deu dimensão internacional à incipiente engenharia
brasileira. Ajudou a fundar o Coppe (Coordenação dos Programas
de Pós-Graduação de Engenharia
da UFRJ) e o Inmetro (Instituto
Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial).
Nos anos 50, tornou-se suplente
de deputado. Sua atuação foi fundamental para a aprovação da lei
de criação da Petrobras. Por trás
da intensa discussão política que
desembocou na campanha do "petróleo é nosso" e dos acesos debates
no Clube Militar, houve uma importante discussão técnica que ficou em segundo plano -mas que
foi decisiva para a adesão da UDN
à idéia.
Discutia-se se a Petrobras deveria dominar todo o ciclo, da prospecção à comercialização do combustível. Havia muita pressão para
que houvesse desmembramento
-o que, para uma empresa infante, teria sido fatal.
Coube a Lobo Carneiro convencer tecnicamente o grande engenheiro Maurício Joppert, deputado
pela UDN, da importância de
manter o controle de toda a cadeia.
O meio-campo entre ambos foi feito por Mário Bittencourt Sampaio,
que no governo Dutra havia sido
responsável pela implementação
do Plano Salte e pelo início da petroquímica brasileira. Joppert convenceu Bilac Pinto, a grande liderança udenista da época.
A contribuição de Lobo Carneiro
não parou aí. Nos anos seguintes,
com seu conhecimento técnico na
área de concreto, monitorou as
pesquisas do Coppe com a Petrobras que resultaram em um dos
grandes feitos da tecnologia nacional no século 20: a tecnologia para
prospecção de petróleo em águas
profundas, setor em que o país detém a liderança absoluta.
Anos atrás, escrevi sobre Lobo
Carneiro. Recebi uma cartinha
manuscrita sua, com a letra trêmula dos velhos, agradecendo à
lembrança. Mais que isso, manifestando surpresa que alguém -de
fora do meio técnico- soubesse
dele.
Soube por acaso. Nos 25 anos da
Petrobras, jovem repórter ainda,
propus à revista em que trabalhava levantar a história do movimento "o petróleo é nosso".
Foi Mário Bittencourt Sampaio
quem me falou de Lobo Carneiro.
Na ocasião, ele estava fora do país.
Décadas depois, quando me escreveu, telefonei para combinar conhecê-lo.
Não deu tempo. Morreu em
2001. Não enriqueceu com suas
descobertas, ao contrário dos economistas que implementaram
planos de estabilização na economia. Não deturpou o objetivo de
descobertas que livraram o país da
dependência externa do petróleo,
diferentemente dos economistas
que criaram um rombo nas contas
externas para irrigar esse grande
negócio da arbitragem de taxas
com recursos brasileiros no exterior.
Quando o Brasil tornar-se, enfim, um país maduro, certamente
será candidato ao panteão em que
os países costumam enterrar seus
grandes.
E-mail - Luisnassif@uol.com.br
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