São Paulo, domingo, 08 de junho de 2008

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Professor de Harvard propõe menos imposto para mulher

Tributação por gênero proporciona vantagens econômicas e sociais, diz economista

Para pesquisador, proposta aumenta o PIB, diminui a carga tributária em geral e também muda as relações do trabalho doméstico


CRISTIANE BARBIERI
DA REPORTAGEM LOCAL

Alberto Alesina, professor de Economia da Universidade Harvard, lançou, no fim do ano passado, uma discussão que colocou em xeque sua respeitada carreira acadêmica: as mulheres trabalhadoras deveriam pagar menos impostos do que os homens. Dessa maneira, defende Alesina, não só seriam incentivadas a ir ao mercado de trabalho, como o PIB (Produto Interno Bruto) cresceria, os impostos em geral recuariam e as relações de trabalho dentro da própria casa tenderiam a ser mais justas, no longo prazo.
O tiroteio logo começou.
Acadêmicos acusaram-no de ser "naïve", de trazer de volta propostas radicais do feminismo e de voltar aos tempos pré-Revolução Francesa. Alesina não só rebateu as críticas como viu a proposta ser adotada como plataforma pelo Partido Popular espanhol. Na Itália, um parlamentar de esquerda e outro de direita uniram-se para formular uma lei parecida. As discussões também começaram a ganhar corpo na Alemanha, na Áustria, na França e na Dinamarca. Alesina concedeu à Folha a entrevista a seguir.

 

FOLHA - Como é a proposta?
ALBERTO ALESINA
- Resume-se em reduzir os impostos das mulheres que trabalham, de modo a aumentar sua participação na força de trabalho. Esse tipo de imposto também poderia fazer com que as obrigações entre o trabalho doméstico e o profissional fossem mais bem distribuídas entre marido e mulher porque, para a família, ficaria mais lucrativo que a mulher saísse para trabalhar.

FOLHA - O senhor defende a idéia de que, com as mulheres trabalhadoras pagando menos impostos, o PIB tende a crescer. Por quê?
ALESINA
- Em muitos países, como nos latinos, onde a participação das mulheres na força de trabalho é menor, o aumento do PIB poderia ser substancial. A tributação por gênero pode ser uma política muito mais eficaz do que cotas, ações afirmativas, subsídios etc.

FOLHA - A proposta do imposto baseado em gênero não poderia causar o efeito oposto: aumentar o desemprego masculino e reduzir os salários médios em geral?
ALESINA
- Não, esse é exatamente o ponto. Mesmo se for cobrado um pouco mais de impostos dos homens, eles ainda irão querer trabalhar. Mas, se forem cortados os impostos das mulheres, isso simplesmente iria estimular muito a força de trabalho, e os índices gerais de emprego aumentariam.

FOLHA - Por que essa política deveria ser restrita a mulheres? A redução de impostos não poderia ser usada com outras minorias?
ALESINA
- O problema é que essas políticas implicam o rearranjo e a redistribuição das funções familiares. Há evidências de que as mulheres são especialmente sensíveis ao corte de impostos. Mas não há certeza sobre outras minorias. O que aconteceria com pessoas com origens em raças diferentes?

FOLHA - Por que o senhor defende que a mudança na tributação poderia também transformar o comportamento social?
ALESINA
- No curto prazo, mudar a tributação pode levar mais mulheres ao mercado de trabalho. No longo, criar incentivos para a reorganização da família. Os homens tenderiam a tomar para si mais afazeres domésticos, precisamente porque as mulheres terão de ter tempo para trabalhar fora, e os maridos se beneficiarão do aumento dos salários delas.

FOLHA - Quão grande deveria ser a diferença entre os tributos pagos por homens e mulheres?
ALESINA
- Depende do país e do mercado de trabalho. A diferença pode ser substancial.

FOLHA - Todos os países e culturas precisam de impostos baseados em gênero?
ALESINA
- Culturas nas quais homens e mulheres ocupam essencialmente os mesmos papéis nas tarefas domésticas e no mercado de trabalho não precisam desse tipo de diferenciação, é claro. Mas a maioria das culturas não é assim.

FOLHA - O efeito da tributação por gênero poderia ser maior em países em desenvolvimento, como o Brasil e a China?
ALESINA
- Nos países em desenvolvimento nos quais a participação feminina na força de trabalho é pequena, pode ajudar ainda mais no crescimento econômico. Por outro lado, [o impacto pode ser menor] porque nesses países geralmente há alta evasão de tributos.

FOLHA - Só as mulheres casadas deveriam pagar menos imposto?
ALESINA
- Talvez sim, talvez não. Se você cortar tributos apenas das mulheres casadas, talvez estimule o casamento por razões "erradas". Mulheres sozinhas também tendem a ser mais pobres. Assim, dar a elas uma vantagem pode não ser uma má idéia em termos de proposta redistributiva.

FOLHA - Só as mulheres se beneficiariam dos impostos menores?
ALESINA
- Não, também seus maridos ganham diretamente. A sociedade como um todo poderia ser beneficiada porque mais pessoas trabalhariam e a tributação pode ser menor em média, precisamente porque mais trabalhadores estariam contribuindo. Com isso, cresceria o bem-estar geral e o PIB.


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