São Paulo, domingo, 08 de junho de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Investimento da China deixa a AL em segundo plano, diz especialista

Chineses preferem negócios com regimes autoritários, afirma americano

RAUL JUSTE LORES
DE PEQUIM

Quando o presidente chinês, Hu Jintao, visitou a América Latina, em 2004, prometeu investir US$ 100 bilhões no Brasil e na Argentina. Menos de 0,1% disso chegou ao Brasil -em 2006, último dado oficial chinês, só US$ 71 milhões foram investidos no país- de um total de US$ 21 bilhões que as empresas chinesas investiram no exterior naquele ano.
Os chineses compraram campos de petróleo no Cazaquistão, minas de ferro na África do Sul, a companhia de telecomunicações do Paquistão e a divisão de computadores pessoais da IBM pela Lenovo.
Para um especialista nas relações comerciais chinesas, a América Latina pode esperar sentada. Os investimentos virão, mas vão demorar.
"A China prefere investir onde você fala com quatro autoridades e fecha negócio, sem esperar barreiras políticas e jurídicas depois. Nessa situação, ditaduras africanas levam vantagem", diz o jornalista americano Joshua Kurlantzick, que há dez anos acompanha o esforço de relações públicas chinesas pelo mundo.
Seu estudo originou o livro "Charm Offensive - How China's Soft Power Is Transforming the World" ("Ofensiva de Charme - Como o Poder de Persuasão da China Está Transformando o Mundo"), da Yale University Press.
Além de investimentos, o governo chinês investiu pesado na cooperação internacional com empréstimos a países pobres, uma política de boa vizinhança no Sudeste Asiático e um discurso de não-intervenção oposto ao da gestão do presidente americano, George W. Bush. Leia os principais trechos da entrevista que ele concedeu, de Washington, à Folha.

 


Estabilidade à chinesa
A China vai investir muito pelo mundo. Mas vai demorar um tanto. As promessas de investimentos foram parte de uma estratégia para conquistar aliados. Quando se trata de ir atrás de matérias-primas ou fazer investimentos pesados, os chineses ainda se sentem mais confortáveis em falar com quatro autoridades poderosas e fechar o negócio rápido, sem temer problemas futuros. Essa "estabilidade" que os chineses buscam é mais fácil de obter em regimes autoritários, como as ditaduras africanas, em que a China colocou muito dinheiro.
Os chineses investiram na África do Sul, que é uma democracia, mas que o partido do governo tem pouquíssimas chances de ser derrotado. Mudanças de partidos, de atores, relatórios de impacto ambiental, leis trabalhistas e outras barreiras burocráticas certamente afugentam os chineses.

Terras no Brasil
A China quer comprar terras no Brasil, na Argentina e em outros países para produzir alimentos para saciar sua população, mas é algo que desperta reservas em qualquer país. Imagine que um americano quisesse comprar muitas terras no Brasil, nem precisa ser na Amazônia. Choveriam críticas.

Comprar expertise
A estratégia chinesa tem sido a de comprar outras empresas para ganhar uma marca e conquistar expertise. Há certas coisas que as empresas chinesas ainda não estão preparadas para enfrentar se forem para o Ocidente. Experimente voltar a uma loja na China em que comprou um produto que deu problemas uma semana depois da compra. É um desespero. As empresas não têm o menor know-how em serviços.

Executivos chineses
Empresas e governo decidem investimentos de forma intimamente relacionada. Os chineses têm investido mais em países de sua esfera de influência, sobretudo no Sudeste Asiático. Executivos chineses na Tailândia me disseram que o país era favorável porque ali eles podiam colocar seus filhos em escolas com mandarim no currículo e tinham restaurantes chineses por todos os lados. Esses executivos pesam nas decisões. Fora São Paulo, em que outra cidade do Brasil eles teriam essas possibilidades?

Sem desagradar aos EUA
A China respeita o Brasil, mas é bem cautelosa com o que considera a "área de influência dos Estados Unidos".


Texto Anterior: Frases
Próximo Texto: Frase
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.