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"Cavallo precisa de mais poderes"
ROGERIO WASSERMANN
DE BUENOS AIRES
A concessão de mais poderes ao
ministro da Economia da Argentina, Domingo Cavallo, dará ao
governo "uma velocidade maior",
afirma o presidente da União Industrial Argentina (UIA), Ignacio
de Mendiguren. "Apoiamos o governo, mas queremos mais capacidade de execução."
A Argentina viveu forte turbulência na semana passada. Boatos
que circulavam no mercado criaram a expectativa de que anúncios importantes poderiam ser
feitos neste fim de semana.
A hipótese mais provável é que
o ministro da Economia assuma o
controle dos órgãos de seguridade social. Assim, teria condições
de apresentar um programa de
corte de gastos públicos mais factível aos olhos do mercado.
Para o industrial Mendiguren,
momentos de crise como o que a
Argentina vive permitem a obtenção de consensos políticos. "Sem
isso, será difícil conseguir encontrar tranquilidade nos mercados,
que estão tão nervosos." Ele concedeu entrevista à Folha na tarde
de sexta-feira, em Buenos Aires.
Folha - O sr. vê uma solução para
a crise econômica da Argentina?
Ignacio de Mendiguren - A saída
é implementar uma série de medidas que ainda não se concretizaram, como os acordos de competitividade, medidas que visam a
reativação, a geração de demanda, por meio da redução de impostos. Hoje a economia necessita
imperiosamente gerar demanda.
Folha - Essas questões não ficam
em segundo plano neste momento
de crise mais aguda, com um índice
de risco-país (sobretaxa paga na
obtenção de empréstimos em relação ao que pagam os EUA) acima
dos 1.100 pontos, que impede investimentos e a obtenção de créditos pelas empresas?
Mendiguren - Sem dúvida, mas o
risco-país às vezes segue caminhos diferentes da economia real.
É sobretudo um índice financeiro,
que castiga muito o país, mas consideramos que a Argentina baixará o risco-país quando conseguir
reativar a economia.
Folha - Há tempo para isso?
Mendiguren - Claro. Situações
de crise permitem consensos que
em outros momentos seria mais
difícil obter, entre setores políticos, sociais, produtores, banqueiros, para apoiar as medidas que
propõe o ministro Cavallo.
Folha - A proximidade das eleições legislativas não torna um
acordo político mais difícil?
Mendiguren - Primeiro temos de
pensar em como chegar a outubro. Para permitir o sucesso das
medidas econômicas, o setor político deve pensar a longo prazo.
Folha - O sr. crê na viabilidade política do atual governo?
Mendiguren - Acho que este governo está passando por problemas, mas todos os setores econômicos já manifestaram seu apoio.
Queremos é maior velocidade na
execução de medidas.
Folha - A concessão de poderes
maiores a Cavallo dará mais velocidade ao governo?
Mendiguren - Acho que sim. Até
aqui ele dedicou muito tempo à
megatroca de títulos para refinanciamento da dívida, e não pôde
dedicar toda sua energia à reativação econômica. Acreditamos que
agora possa se dedicar a isso.
Folha - A presença de Cavallo no
governo é essencial?
Mendiguren - Preferimos trabalhar com Cavallo, porque é uma
pessoa com uma grande experiência internacional e muito eficiente na tomada de decisões.
Folha - No Brasil, consideram que
a crise cambial é consequência da
crise argentina, e os argentinos
culpam a desvalorização do real
pelo aprofundamento de sua crise.
Quem está com a razão?
Mendiguren - É fundamental
que a Argentina e o Brasil consigam consensos políticos. Hoje a
situação técnica no Mercosul é
muito difícil. Já está claramente
demonstrado que as duas políticas econômicas são divergentes,
não convergentes. O que se deve
fazer, até que se possa falar outra
vez em harmonizar políticas macroeconômicas, é conseguir acordos transitórios para evitar que as
assimetrias entre os dois países
destruam empregos e sigam produzindo quebras de empresas. Se
isso acontecer, o risco é que as
pessoas, na Argentina, relacionem o Mercosul à quebra de empresas e ao desemprego.
Folha - A resolução 258, que oferece desconto à importação de
bens de capital de fora do bloco,
não dificulta esse entendimento?
Mendiguren - Esse é um tema
menor, que pode ser resolvido
dentro de um marco político global. Se para o Brasil isso é importante, muito mais preocupante
para a Argentina é a desvalorização diária da moeda brasileira.
Folha - O sr. acha que o ministro
Cavallo deveria revogar ou alterar
a resolução?
Mendiguren - Não a conheço em
profundidade. Mas o que me
preocupa é que Brasil e Argentina
não consigam encontrar soluções
pontuais para os problemas que
temos, porque está em jogo algo
muito mais importante, a viabilidade de um bloco comercial.
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