São Paulo, domingo, 08 de julho de 2007

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Inflação reacende conflito entre BC e Fazenda

Confusão sobre meta expõe desunião na equipe econômica, que inviabiliza debate aprofundado sobre questões importantes

Divisão já surte efeitos na economia, como a exigência de investidores por retorno maior nas negociações de títulos públicos com governo

SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Se ainda restava alguma dúvida, ficou claro para os cerca de 20 empresários e consultores financeiros presentes num jantar realizado em Brasília, na quarta-feira passada, com o ministro Paulo Bernardo (Planejamento), que a disputa de bastidores entre o ministro Guido Mantega (Fazenda) e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, recrudesceu.
Eles foram atrás de respostas após a confusão gerada com o anúncio de duas metas de inflação para 2009 -a de 4,5% de Mantega e a de 4% de Meirelles- e saíram com a certeza de que a equipe econômica nunca esteve tão desunida.
Segundo relato à Folha de pessoas que estiveram no jantar, chamou a atenção o fato de a divisão de opiniões, que sempre existiu entre Mantega e Meirelles, agora estar inviabilizando um debate mais aprofundado entre eles sobre questões importantes para o país.
Mantega, Bernardo e Meirelles teriam, por exemplo, discutido isoladamente com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva seus argumentos para fixar a inflação de 2009. Somente na reunião do CMN (Conselho Monetário Nacional) -formado pelos dois ministros e o presidente do BC- os três trataram cara a cara do assunto.
Mas, quando aconteceu essa reunião, o presidente Lula já posicionara publicamente que a meta de 4,5% era a melhor.
Bernardo, que até então havia defendido a meta menor, de 4%, teria fechado com os 4,5% de Mantega. Meirelles então apresentou ao conselho os argumentos que já havia discutido com Lula: seria muito ruim para a economia sinalizar que a inflação sairia do patamar atual, na casa de 3%, para 4,5% em três anos. Foi dada a ele, então, a missão de segurar as expectativas do mercado em 4%.
Para algumas pessoas presentes ao jantar, o episódio mostrou que o "pito" dado por Lula, no início do ano, nos ministros da área econômica e a determinação de evitarem divergências públicas só acirrou a rixa entre Mantega e Meirelles nos bastidores.

Efeitos
O recrudescimento da divisão na equipe econômica já surte efeitos na economia. Um deles é sentido pelo Tesouro Nacional: os investidores exigem retorno maior do governo nas negociações de títulos públicos. E o motivo é o fato de a inflação embutida no cálculo do ganho esperado nessas transações ter subido.
Segundo técnicos da equipe econômica, a alta de 3,2% para 3,8% na inflação de longo prazo entre o final de maio e esta semana é explicada, em boa parte, pela ligeira piora no cenário internacional. Mas eles consideram que o desfecho do debate sobre a meta para 2009 gerou incertezas e aumentou o poder de estragos que as notícias ruins do exterior, sobretudo dos EUA, têm no Brasil.
O rumo da inflação depois do anúncio da meta para 2009 foi tema de um almoço com 24 economistas e analistas na Andima (Associação Nacional das Instituições do Mercado Financeiro), na última sexta. A maior parte deles não pretende, neste primeiro momento, revisar para cima a projeção de inflação no longo prazo.
Com isso, é possível até que o BC comemore certa estabilidade nas pesquisas semanais que faz para medir as expectativas em relação à inflação. No entanto há dúvidas se os empresários, que em última instância são os formadores de preços, irão seguir esse caminho. Avalia-se que, nessa área da economia, vale mais a palavra de Lula defendendo inflação de 4,5%.


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