São Paulo, terça-feira, 08 de outubro de 2002

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VAREJO

Com custos em dólar e sem poder reajustar valores, laboratórios retiram abatimentos que concediam a farmácias

Sem desconto, preço de remédio deve subir

CÍNTIA CARDOSO
JOSÉ ALAN DIAS
DA REPORTAGEM LOCAL

O setor de medicamentos ensaia transferir para o consumidor os repasses de custos decorrentes da contínua escalada do dólar.
A Febrafarma (Federação Brasileira da Indústria Farmacêutica) sustenta que os preços do setor acumulam defasagem entre 15% e 18% desde janeiro, data do único reajuste oficial deste ano. Segundo a entidade, o congelamento de preços dos medicamentos foi calculado com a cotação do dólar a R$ 2,36. Com isso, as indústrias alegam que têm absorvido o impacto da variação cambial.
Por conta da disparada do dólar, pelo menos um laboratório já ameaçou interromper parte da produção. A direção do laboratório Biosintética divulgou que pode suspender a fabricação de uma série de medicamentos devido à elevação dos custos dos insumos importados. Cerca de 90% dos sais (insumos) usados pelos laboratórios no Brasil vêm do exterior.
Com os preços controlados pelo governo tanto no chamado preço referencial de fábrica (aquele cobrado de varejistas) como pelo de venda final, a alternativa usada pelos laboratórios tem sido elementar: encurtaram os descontos concedidos a distribuidores e redes de drogarias, que, por sua vez, tratarão de minimizar ou cancelar os descontos aos consumidores.
Dessa forma, em tese, o setor não desrespeitaria determinação de não vender a preços superiores ao máximo estabelecido pela tabela fixada pela Câmara do Medicamento, órgão ligado ao Ministério da Saúde. Mas ainda que indiretamente também não estaria deixando de promover reajustes.
O agravante é que os produtos que começam a perder descontos são justamente os de uso continuado -para doenças cardiopáticas, diabéticas e tratamento de hipertensão. Por serem os de maior consumo -e nos quais as concorrência é mais acirrada-, os laboratórios usam da política de descontos para o varejo, obrigando-os a repassar aos consumidores, como forma de obter ganho em escala no mercado.
De acordo com a Abafarma (Associação Brasileira do Atacado Farmacêutico), 5 dos 20 principais laboratórios instalados no Brasil já reduziram os descontos para as distribuidoras em pelo menos dois pontos percentuais.
Feitas as contas em toda a cadeia, os reajustes dos preços para o consumidor pode variar de 2% a 3% nos próximos meses. ""As distribuidoras trabalham com margem operacional de 10%. Com esse percentual, têm que fazer comprar, armazenar e tirar o lucro. Se cortar dois pontos, tira 20% da margem operacional. Não há como evitar o repasse", diz Jorge Fróes, presidente de Abafarma.
"Quem compra direto dos laboratórios são as grandes redes. As farmácias independentes compram dos atacadistas, que reduziram os prazos para pagamento e os descontos", diz Geraldo Monteiro, do sindicato das farmácias de São Paulo, que representa cerca de 15 mil estabelecimentos.
Representantes das redes de farmácias argumentam que, devido ao controle de preços do governo, a margem bruta de lucro do setor não supera 1,4%. "Se diminuírem ainda mais a margem de lucro, as redes não terão nem como cobrir seus custos", diz Sérgio Menna Barreto, presidente da Abrafarma (Associação Brasileira das Redes de Farmácia).
A algumas redes, entretanto, a política de cortes de descontos concedidos ainda não chegou. É o caso da Drogasil. Segundo o diretor-geral da empresa, Cláudio Poberto Ely, as condições de desconto para a rede estão mantidas e não há perigo de desabastecimento de medicamentos.

Outros impactos
Os serviços odontológicos também vão sofrer reajustes. Quase todos os procedimentos -de uma simples obturação a um implante dentário- dependem de materiais importados que não têm similares nacionais.
Alguns fornecedores de produtos odontológicos já anunciam aumentos de até 30%.


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