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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
O esperado nunca acontece
A valorização cambial pode
pôr em risco o dinamismo
da economia e ressuscitar
a vulnerabilidade externa
ESTAMOS entrando provavelmente em uma nova fase da
economia internacional. Pela
primeira vez, a China e a Índia são os
países que mais contribuem para o
crescimento mundial, segundo estimativas do FMI. A participação dos
países em desenvolvimento no PIB
global vem aumentando de maneira
contínua. Países como China, Rússia, Brasil e Índia estão adquirindo
uma importância econômica e política gradualmente maior.
Nem sempre os países desenvolvidos encaram essas mudanças com
tranqüilidade. As velhas potências
econômicas, embora ainda dominantes, estão em processo de declínio relativo aparentemente inexorável. O seu comportamento é cada
vez mais defensivo e protecionista.
Não querem abrir espaço para os
que vêm de baixo.
Os países do G7 (EUA, Japão, Alemanha, França, Reino Unido, Itália
e Canadá) ainda respondem por
40% do PIB mundial, mas sua participação tende a diminuir. São países
economicamente maduros, basicamente acomodados e satisfeitos,
com populações estacionárias ou cadentes. O crescimento demográfico
que ainda conseguem registrar resulta, freqüentemente, dos fluxos de
imigrantes legais ou ilegais provenientes da América Latina, da África
ou da Ásia. Atualmente, os países do
G7 abrigam apenas 11% da população do planeta. Os países em desenvolvimento, 85%.
Na crise financeira recente, as
economias emergentes desempenharam um papel estabilizador,
compensando os efeitos recessivos
oriundos dos EUA e da Europa. Tumulto financeiro no Norte e -quem
diria?- relativa calma no Sul.
Como dizia Keynes, "the expected
never happens; it is the unexpected
always" (o esperado nunca acontece; é o inesperado sempre). Quem
poderia prever que uma grave crise
financeira nos EUA e na Europa teria, pelo menos em uma fase inicial,
repercussões tão modestas na periferia do sistema internacional?
Enquanto as velhas potências se
debatem com surpreendente fragilidade financeira, países como o Brasil estão assoberbados por influxos
excessivos de capital que, quando
não são neutralizados ou contidos,
contribuem para a valorização da
moeda nacional, solapando a competitividade externa.
O que está por trás dessa relativa
tranqüilidade dos emergentes é o
grande progresso que esses países fizeram em termos de redução das
suas vulnerabilidades financeiras.
As contas públicas e os sistemas financeiros nacionais foram fortalecidos. Houve um notável ajustamento
das contas externas. Em boa parte
do mundo emergente, os balanços
de pagamento tornaram-se superavitários e as reservas internacionais
aumentaram de forma expressiva.
Com algum atraso, o Brasil acompanhou essa onda e está hoje em posição razoavelmente confortável.
Mas atenção: não há muito espaço
para complacência. A situação internacional pode se complicar. Se a
economia americana entrar em recessão, se a crise financeira no Norte
se agravar, é pouco provável que países como o Brasil saiam ilesos.
Por isso, é essencial deter a valorização cambial, que vem produzindo
efeitos cada vez mais claros nos setores de "tradeables" e nas contas
externas brasileiras. A valorização
não é inevitável. Uma combinação
de abrandamento da política monetária, com intervenções cambiais esterilizadas e controles sobre a entrada de capitais, pode ser suficiente
para enfrentar o problema. Se ele
não for enfrentado, estaremos colocando em risco o dinamismo da economia e ressuscitando o problema
da vulnerabilidade externa.
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 52, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa
um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net
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