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VINICIUS TORRES FREIRE
O dólar dança na ópera de Pequim
Autoridades chineses dizem que vão vender dólar, "moeda fraca", e pioram a ressaca nas finanças dos Estados Unidos
"É O DRAGÃO" chinês, é o dragão chinês", gritavam os
ambulantes suados das
praias do Rio, quando vendiam esse
picolé gororoba, ao que parece extinto. Não deu praia de novo no mercado americano, ontem, em mais
uma ressaca devida aos rombos nos
bancos, rolos judiciais em instituições financeiras, calotes crescentes
dos americanos em cartões de crédito e, para piorar, também devido à
gelada que o dragão chinês deu no
dólar, que caiu a níveis recordes de 8,
27 ou 30 anos, a depender da moeda
estrangeira que se escolha.
Um vice-diretor do Banco Central
da China disse ontem que o dólar
"está perdendo seu valor como moeda mundial". A seguir, o vice-presidente do Congresso chinês sugeriu
que o país venda parte dos dólares
das reservas chinesas, uma brincadeirinha de US$ 1,4 trilhão, algo
mais que o equivalente ao PIB brasileiro deste ano. Na verdade, o vice do
Congresso disse que o país prefere
"moedas fortes a fracas, e vamos fazer ajustes [nas reservas]".
Não se trata do destampatório do
apocalipse, mas estimula investidores com ativos em dólares a se desfazer de parte deles, ou ao menos causa um susto e uma corridinha contra
as Bolsas americanas. Aos poucos,
investidores estrangeiros já vinham
vendendo ativos americanos, ações
inclusive. Empresas americanas não
procuram investir apenas em países
emergentes com crescimento brutal, mas também procuram "diversificar" sua cesta de receitas, dadas as
más perspectivas do dólar.
Nada tampouco de apocalíptico
aqui, pois as empresas americanas
por ora não apresentam um desempenho (lucros) tão ruim como o setor financeiro, embora estejam sendo reavaliados para baixo os ganhos
do quarto trimestre. Mas a finança
ultrapassa as piores expectativas.
Bancões de Wall Street estimam
que a evaporação do valor dos derivativos de crédito em seu poder e em
outras instituições financeiras deve
ficar em torno de US$ 65 bilhões
-até agora, admitira-se por escrito
que uns US$ 24 bilhões haviam virado pó, ou melhor, vapor.
A Bolsa perdeu o terreno ganho
desde o talho de juros do Fed, em setembro. Justiça e órgãos de supervisão do mercado financeiro nos EUA
intensificaram a varredura em balanços e padrões de empréstimo devido a contabilidade criativa, cotação exagerada de ativos e avaliação
"equivocada" de preços de casas, enfim, a farra da bolha imobiliária e
dos derivativos que, como todas as
bolhas, acaba em parte na polícia.
O nível de alerta também subiu
para "laranja" no que diz respeito a
dívidas de cartão de crédito, pois o
calote cresce. As ações de bancos, seguradoras, corretoras etc. marcam
os piores resultados do ano. O índice
de volatilidade da Bolsa de Opções
de Chicago, o VIX (não confundir
com "Vixe!"), indicador de variações
do preço das ações, voltou ao nível
de setembro, anterior ao talho de juros do Fed, ainda durante o primeiro
ato da crise do aperto de crédito.
Isso não é uma crise de dívidas
imobiliárias. É uma crise do modo
pelo qual o centro do mundo fazia
negócios financeiros neste século e
do modo americano de crescer com
a ajuda de bolhas, típico da última
década. Não tem cara de catástrofe,
mas vai demorar mais que o esperado para limpar a sujeira sob o tapete.
vinit@uol.com.br
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