São Paulo, domingo, 08 de novembro de 2009

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G20 deixa de lado medidas para o câmbio

Comunicado final de reunião na Escócia nem cita debate sobre a subvalorização de moedas como o dólar e o yuan

Gordon Brown sugere taxar operações financeiras, mas G20 decide que países criarão uma "cesta de opções" a ser analisada apenas em abril

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL À ESCÓCIA

A excessiva sobrevalorização do real, principal preocupação conjuntural do governo brasileiro, não aparece nem tangencialmente no comunicado final da reunião de ministros da Fazenda e presidentes de bancos centrais, encerrada ontem em Saint Andrews, na Escócia.
Aliás, a palavra "câmbio" não é mencionada em nenhuma linha. Não quer dizer que o tema não tenha sido discutido. Foi levantado pelo ministro Guido Mantega, tal como anunciara à Folha. Mas Mantega não especificou países cujas moedas estão subvalorizadas (são essencialmente o dólar e o yuan chinês, a ele indexado).
Preferiu dizer que é preciso encarar o problema dos desníveis cambiais, em especial de moedas que são reservas mundiais (caso do dólar).
Os norte-americanos reconhecem a subvalorização de sua moeda, mas dizem que necessitam dela, por enquanto, para alavancar sua incipiente recuperação, já que facilita as exportações.
O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, comentou outro tipo de desequilíbrio, aquele entre os países que consomem demais (leia-se: EUA) e aqueles que exportam ou poupam demais (a China principalmente, mas não só).
"Não eliminaremos os desequilíbrios e não criaremos bases para um desenvolvimento sustentado sem resolver essa situação", disse Meirelles a seus colegas. Discurso adequado, na medida em que o principal eixo das discussões de ontem era a "Moldura para o Crescimento Forte, Sustentável e Equilibrado", lançada na cúpula de Pittsburgh (EUA), há um mês e meio.
O debate sobre os dois desequilíbrios (o cambial e o buraco entre consumidores e exportadores) foi jogado para o ano que vem, no marco do cronograma definido ontem para o que Alistair Darling, o ministro anfitrião, chamou de mecanismos para "assegurar que a próxima década seja uma década de crescimento".
O cronograma funciona assim:
1 - Até janeiro, os países do G20 estabelecem seus programas e projeções para suas próprias molduras.
Em tese, são neles que aparecerão propostas para corrigir ambos os desequilíbrios.
2 - Em abril, com o assessoramento do FMI e do Banco Mundial, faz-se uma análise da "consistência coletiva" das políticas nacionais ou regionais, para verificar se são compatíveis com os objetivos comuns.
3 - Na cúpula do G20 no Canadá, em junho, os chefes de governo terão à mão "uma cesta de opções políticas para alcançar os objetivos".
4 - Por fim, em outra cúpula, na Coreia do Sul, em novembro, haverá a sintonia fina das avaliações e serão desenvolvidas "recomendações políticas mais específicas".
Meirelles fez questão de enfatizar ontem que o FMI e o Banco Mundial apenas apoiam as análises, mas que as decisões pertencem ao G20.
O cuidado do presidente do BC se explica: o Brasil, assim como outros emergentes, queria que o próprio G20, e não o Fundo, ficasse como o xerife das políticas a serem adotadas.
Como não havia muita novidade no pacote em discussão, virou notícia o discurso de abertura do primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, em que ele propôs o que parecia ser uma espécie de IOF global sobre transações financeiras.
As TVs e as agências, até então sem assunto, deram destaque a esse item, mas o destaque não sobreviveu ao comunicado final, em que ele não aparece nem remotamente.
Na verdade, Brown sugeriu a taxa como uma de quatro fórmulas possíveis para fazer com que os bancos paguem por eventuais futuros pacotes de socorro, em vez de o peso recair sobre o contribuinte, como está acontecendo agora.
"Não tem nenhuma semelhança com o IOF do Brasil", disparou Dominique Strauss-Kahn, diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional. Strauss-Kahn informou que o Fundo está estudando várias fórmulas para fazer com que os bancos paguem por seus excessos, mas só em abril terá propostas acabadas.
A informação é recolhida no comunicado final, que diz que serão analisadas "as opções sobre como o setor financeiro poderá contribuir para pagar os prejuízos associados com as intervenções governamentais para consertar o sistema bancário".
Meirelles não se emocionou tanto quanto os jornalistas com a ideia de taxar os bancos, pela simples razão de que o Brasil já tem essa espécie de seguro, na forma do Fundo Garantidor de Crédito, que, lembrou o presidente do Banco Central, teve "papel fundamental" na crise, entre outras razões, por permitir a garantia de depósitos e a compra de carteiras de crédito de instituições pequenas e médias.


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