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GLOBALIZAÇÃO
Protecionismo pós-11 de Setembro, alta do petróleo e ameaça da gripe do frango não devem reduzir fluxos
Comércio mundial desafia "profetas do apocalipse"
ALAN BEATTIE
DO "FINANCIAL TIMES"
A ascensão do comércio internacional foi por muito tempo vista como inevitável. Agora, crescem dúvidas quanto à sua persistência, em meio a repetidas predições de que a globalização pode
não só terminar paralisada como
invertida.
O novo século mal tinha dois
anos quando a exuberância da
bolha globalizante dos anos 1990
se defrontou com uma realidade
menos que animadora. Imediatamente depois da recessão norte-americana de 2001, vieram os ataques do 11 de Setembro e as medidas de segurança conseqüentes.
De lá para cá, a confiança voltou
a ser abalada pelo conflito no Iraque, pelos atentados em Bali, Madri e Londres, pela difusão da Sars
e mais tarde da gripe aviária e por
um aumento acumulado de 200%
nos preços do petróleo. Guerra,
peste, doença e miséria: como escreveu Drew Matus, economista
do Lehman Brothers, era "como
se o Livro das Revelações estivesse
acontecendo ao vivo".
O clima continua desfavorável.
Existem rumores sombrios de
protecionismo dos dois lados do
Atlântico. Essas tendências podem passar por uma escalada e
gerar protecionismo real, caso
surja um deslocamento macroeconômico mundial, como um colapso no dólar que arremesse os
Estados Unidos em uma recessão.
O mundo não poderia perder o
país consumidor por excelência.
Mas, até agora, a durabilidade da
integração econômica e do comércio internacional vem se provando notável.
O medo de que o 11 de Setembro
pudesse causar paralisação do comércio internacional era comum
não só entre os economistas perpetuamente pessimistas de Wall
Street mas também entre aqueles
do setor de transportes.
Raymond Maguire, especialista
em transportes no banco de investimento UBS, diz que, "depois
do 11 de Setembro, as companhias
de navegação antecipavam o fim
do mundo e começaram a oferecer contratos de frete a preços
muito baixos a fim de garantir a
ocupação de seus navios". Os fretes para contêineres em rotas do
Pacífico caíram 15% em 2001 e
mais 12% no ano seguinte.
Parece claro que os temores
quanto ao custo das medidas de
segurança eram exagerados. Simeon Djankov, economista do
departamento de assessoria a empresas do Banco Mundial, pesquisou as companhias de navegação
e descobriu que estão enfrentando a situação com facilidade.
Djankov calcula que, para os exportadores europeus aos Estados
Unidos, a segurança adicional
custe 15 a mais por contêiner
médio, custo desprezível diante
do valor de US$ 60 mil da carga
que ele transporta.
Terceirização e cadeias
O vigor do comércio internacional deve muito a duas tendências.
Nos serviços, a rápida difusão da
digitalização causou um boom na
terceirização internacional de serviços, permitindo que atividades
cada vez mais complexas fossem
transferidas a fornecedores em
outros países. Para os produtos, a
logística sofisticada permitiu que
as cadeias de suprimento se estendessem mais, freqüentemente na
direção da China.
Em retrospecto, o evento mais
simbólico de 2001 para o comércio internacional não foi o 11 de
Setembro, mas a adesão da China
à OMC (Organização Mundial do
Comércio), dois meses depois.
Em três anos, as exportações do
país dobraram e os chineses se
tornaram os terceiros maiores exportadores do mundo.
Até agora, essas forças de integração superaram as resistências
com bastante facilidade. A gripe
aviária e uma alta sustentada nos
preços do petróleo podem impor
desafios mais severos.
Combustível mais caro é um fator que não deve causar reversão
na tendência de transferência da
produção industrial para fora dos
países ricos. Mas pode ajudar os
países em desenvolvimento que
se localizam a distância relativamente curta de seus mercados.
"As fábricas chinesas não voltarão a Ontário ou ao Ohio, mas o
México talvez receba uma nova
chance", disse Rubin. "Agora, estamos enfrentando esse novo
choque do petróleo há dois anos e
meio e devemos começar a ver
efeitos de redução do comércio
internacional em breve."
Outros observadores contestam
a importância dos custos de
transporte. Alan Winters, um dos
mais importantes economistas
especializados em comércio internacional, diz que a desaceleração no comércio depois de 1973
era mais provavelmente resultado
da recessão nos países ricos, causada pelo choque do petróleo.
A mais recente fonte de preocupação é a difusão do vírus H5N1,
da gripe aviária. Se ele começar a
causar mortes em escala considerável nos países ricos, sem dúvida
causará paralisação nos setores de
comércio internacional e turismo.
A gripe aviária decerto está prejudicando os criadores de aves.
Produtores franceses estão sofrendo com proibições de exportação e queda na demanda doméstica. Os criadores brasileiros,
que tinham 35% do mercado
mundial de exportação, registram
queda de demanda e acúmulo em
seus estoques europeus.
Mas analistas do Rabobank,
uma das maiores instituições de
crédito agrícola do mundo, dizem
que os efeitos da doença sobre o
comércio mundial de alimentos
não devem ser dramáticos.
Certamente, existe o potencial
de um choque sério. Um grande
incidente terrorista; uma alta no
número de casos humanos da gripe aviária; uma recessão longa ou
profunda que convença governos
a adotar medidas protecionistas.
A ascensão do comércio internacional não é inevitável nem irreversível. Mas, nos últimos anos,
apostar contra o comércio mais livre e contra a capacidade da economia mundial para enfrentar
choques desestabilizadores provou ser uma estratégia perdedora.
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