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INTEGRAÇÃO
Mecanismo que permite exportação dentro do Mercosul sem o uso do dólar seria o embrião de moeda única, segundo Lessa
BNDES prepara relançamento dos CCRs
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
O BNDES está pronto para restabelecer os CCRs (Convênios de
Crédito Recíprocos), um mecanismo que o ministro argentino
da Economia, Roberto Lavagna,
definiu como "o instrumento
mais concreto, direto e imediato"
de que Brasil e Argentina dispõem para revigorar a cooperação entre os dois países.
Lavagna tem razão: os CCRs são
uma espécie de câmara de compensação, na qual os exportadores de um lado e outro podem
usar a moeda nacional para pagar
suas compras, eliminando ou reduzindo a necessidade do dólar.
Para Carlos Lessa, o presidente
do BNDES, os CCRs são mais que
isso: configuram uma espécie de
embrião de moeda única para o
Mercosul, uma idéia que foi posta
no papel na segunda-feira, em
reunião entre os vice-chanceleres
do Brasil e da Argentina.
Lavagna e seu colega brasileiro,
Antonio Palocci Filho, discutiram
o relançamento dos CCRs no jantar que compartilharam anteontem, na residência do embaixador
argentino Juan José Uranga.
Mas os dois não falaram de
moeda única.
O relançamento dos CCRs não é
o único tentáculo que o BNDES
está esticando em direção aos países da América do Sul.
Ao contrário, o banco está colocando carne (ou seja, dinheiro)
no esqueleto de política externa
desenhada por Lula, que coloca
toda a prioridade na América do
Sul (África é uma segunda prioridade, pelo menos para este ano).
A ênfase na América do Sul é fácil de explicar: "A capacidade de
ação que temos nessa área não
pode ser comparada com a que
possuímos, por exemplo, na
América Central", diz Marcelo
Vasconcelos, diplomata lotado na
nova subsecretaria criada para
cuidar de América do Sul.
Mas o exercício de liderança
sub-regional que Lula pretende
desenvolver ficaria manco sem
recursos financeiros.
Some-se a isso o fato de que o
BNDES tem recebido poucos projetos sedutores do setor privado e
está armado o cenário para as linhas de financiamento que foram
ou logo serão abertas para Venezuela, Argentina e Bolívia.
No caso da Argentina, houve
um ruído na divulgação do financiamento. O vice-chanceler Martín Redrado anunciou que haveria US$ 1 bilhão do BNDES para
financiar exportações argentinas
para qualquer parte do mundo.
Errado. São US$ 500 milhões
para financiar exportações argentinas para o Brasil e idêntica
quantia para a operação inversa.
Um dos projetos será a construção de uma estrada de Mendoza,
junto à cordilheira dos Andes, até
Santiago. O Brasil entraria com
parte dos equipamentos.
Da mesma forma, o financiamento à Venezuela destina-se à
compra do que o Brasil sonha em
exportar para o mundo (aviões,
máquinas e equipamentos).
"Valor agregado", entusiasma-se Carlos Lessa.
Com a Bolívia, o problema é de
outra natureza. Trata-se de sair da
armadilha do preço dolarizado do
gás boliviano fornecido ao Brasil.
Operação diplomática complicada pois a simples menção da hipótese de renegociar o contrato
poderia levar ao colapso do já frágil governo boliviano, dada a importância dos recursos vindos da
venda do gás para o país.
Mas o fato de o BNDES estar
operando em várias frentes não
significa que o relacionamento
Brasil/Argentina deixe de ser
prioridade. Só a partir do restabelecimento do que o embaixador
brasileiro em Buenos Aires, Botafogo Gonçalves, chama de "anos
de ouro do Mercosul" seria possível de fato sonhar com projetos
que alcançassem mais países.
O embaixador vê um momento
favorável agora em que desapareceu a disparidade de políticas
cambiais e a Argentina dá os primeiros e tímidos passos para a
sua recuperação econômica.
O Brasil se dispõe a ajudar por
meio do que Botafogo Gonçalves
chama de "condições especiais",
válidas para o período de crise.
Entre elas, permitir que a Argentina continue violando a TEC
(Tarifa Externa Comum, válida
para as importações dos quatro
países do Mercosul) na área de
bens de capital. É a maneira de
comprar mais baratos os equipamentos indispensáveis para a reconstrução econômica. É uma
concessão que causa queixas surdas no próprio Itamaraty e mais
ruidosas entre empresários.
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