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Após negociações tensas, decisão sobre Itaipu é adiada
Lula e presidente paraguaio firmam posições e não chegam a acordo sobre energia
Para Brasil, paraguaios "ideologizam" negociações; Lugo insiste em receber mais pela energia produzida em hidrelétrica na fronteira
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
LETÍCIA SANDER
ENVIADA ESPECIAL A CAMPO GRANDE
Apesar das declarações e gestos públicos de simpatia mútua
de ontem, foi o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva
quem se irritou com o seu colega do Paraguai, Fernando Lugo,
e suspendeu a reunião da véspera de ministros e assessores
dos dois países.
As equipes passaram quase
três horas no Itamaraty, mas
nem chegaram a discutir o pacote de mais de US$ 1,5 bilhão
do Brasil para o Paraguai.
Lula vinha recebendo um bolo diário de notícias da imprensa paraguaia, classificando o
Brasil de "imperialista e explorador". Um jornal chegou a publicar que ele havia "afrouxado" e cederia às pressões.
Lula já chegou para o encontro com Lugo de mau humor.
Antes da reunião de trabalho,
trancou-se com ele no gabinete
do chanceler Celso Amorim
(que ficou do lado de fora) e,
conforme a Folha apurou, reclamou da "ideologização" das
negociações. Lugo reafirmou
que só aceitaria um pacote com
mudanças em Itaipu. Lula respondeu que não havia acordo.
Os ministros Amorim e Edison Lobão (Minas e Energia), o
secretário-exetivo da Fazenda,
Nélson Machado, e os presidentes e diretores de BNDES,
Itaipu Binacional e Eletrobrás
ficaram numa sala ao lado, com
seus correspondentes paraguaios, sem saber o que fazer. O
clima era de constrangimento.
Quando saíram do gabinete,
os dois presidentes tinham um
discurso diferente. Lugo insistiu em dizer que a revisão de
Itaipu era uma questão de honra para o Paraguai e que ele recebia muitas pressões internas.
Lula reagiu afirmando que "nenhum brasileiro aceita a acusação de que a dívida do Paraguai
com o Brasil é espúria".
Em seguida, o chanceler paraguaio, Hector Lacognata, voltou à carga, admitindo que
"Itaipu é uma bandeira" e criticando o Brasil por não reconhecer um "erro histórico" (ao
fazer o tratado, que, na visão
deles, seria contrário aos interesses paraguaios).
Amorim tentou contemporizar, falando na "boa vontade"
brasileira e do pacote de mais
de uma dúzia de convênios e
programas de cooperação que
o governo havia preparado.
Mas o ministro da Fazenda paraguaio, Dionísio Borda, voltou
ao tema Itaipu.
"Para o jantar"
Lula, então, olhou para ministros e assessores brasileiros:
"Não temos mais o que fazer,
vamos para o jantar".
Todos saíram sem reunião e
sem assinatura de atos, pronunciamento e entrevista.
O jantar foi no Palácio da Alvorada, com Lula falante, contando reminiscências de sua
época de sindicalista, e Lugo
calado, quase taciturno.
Conforme a Folha apurou,
Lula considera que Lugo está
"refém" de suas promessas da
campanha eleitoral, de que falaria duro com o Brasil e mudaria o tratado para aumentar o
preço da energia excedente que
vende ao sócio no empreendimento. Fragilizado politicamente por causa das notícias
de paternidade enquanto ainda
era bispo católico, ele estaria se
"agarrando" a essa bandeira
para manter popularidade.
O Brasil não aceita mudar os
termos do tratado para permitir que o Paraguai venda o excedente de energia (mais de
90% da sua parte) para a Argentina e o Chile nem concorda com a argumentação de que
paga pouco pela energia. O preço é de US$ 45, mas US$ 42 entram como abatimento da dívida do Paraguai com o Brasil,
que financiou sozinho a construção da usina.
O impasse empurrou as negociações, que já duram meses,
para a estaca zero. Os dois presidentes, porém, anunciaram
ontem que terão encontro entre 14 e 15 de junho, em Assunção, para fechar um "pacote".
Lula disse que o Brasil aceita
duas reivindicações paraguaias: a direção paritária e a finalização de obras complementares. Para Lugo, porém,
esses compromissos são pouco
e não resolvem o impasse.
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