São Paulo, sexta-feira, 09 de julho de 2004

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LUÍS NASSIF

A diplomacia brasileira

O neonacionalismo brasileiro tem forte componente diplomático e geopolítico. Na verdade, o pensamento estratégico no Brasil vem evoluindo desde o Império. Na época, a consolidação do país estava centrada no Prata. Até a Revolução de 30, na América do Sul.
Até recentemente, nas Américas.
A grande transformação começa a ocorrer agora, com os primeiros ensaios do governo Fernando Henrique Cardoso, aprofundados no governo Lula, de uma atuação diplomática centrada no mundo.
Para consolidar seu papel de interlocutor global, o grande desafio geopolítico brasileiro é a integração da América do Sul, transformando a região em um megapaís, nos moldes da União Européia.
Será a maneira de ganhar escala, conseguir unir o Atlântico ao Pacífico e se inserir no comércio internacional com vantagens comparativas consistentes. De certo modo, repetindo a saga americana do século 19.
As negociações comerciais em torno do Mercosul estarão sempre sujeitas a fricções. A integração física, não. Segundo estudos desses especialistas, a América do Sul tem sete espaços de tráfego consistente, ambientes capazes de gerar negócios e dinamismo: 1) o litoral Atlântico; 2) o planalto brasileiro; 3) a bacia do Prata; 4) a bacia amazônica; 5) o litoral do Pacífico; 6) a cordilheira dos Andes e 7) o Orinoco-Caribe. Mas a Amazônia só se transformará em um centro em que se articulam ações de produção se se integrar com os vizinhos do continente.
O desafio estratégico consiste na montagem da estrutura para unir esses espaços por redes de energia elétrica, logística de acesso e comunicação. Dois terços da América do Sul não são dotados das três coisas. Unido, o continente sul-americano seria auto-suficiente em quase todas as matérias-primas essenciais.
O movimento de integração começou imperceptivelmente há alguns anos, quando ministros do Planejamento do Mercosul começaram a se reunir para pensar na integração física do continente. Depois, a idéia evoluiu quando se percebeu que o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) poderia se associar ao CAF (Cooperação Andina de Fomento), ganhando escala e capacidade de captação.
Até o final do ano está na agenda a reestruturação da Alide (Associação Latino-Americana das Instituições de Fomento Econômico) para que trabalhem em conjunto, em co-financiamento das obras de infra-estrutura necessárias. Juntará BNDES, BNB, Basa e BDMG, do Brasil, bancos de desenvolvimento da Argentina e do Chile, entre outros.
O CCR (Convênio de Crédito Recíproco) é visto como a grande ferramenta de integração comercial -uma espécie de câmara de compensação, permitindo aos países da região negociar com suas próprias moedas. Quando o dólar deixar de arbitrar as negociações comerciais, haverá enorme avanço no comércio da América do Sul.
A grande resistência aos CCRs tem sido, historicamente, do Banco Central. A desculpa é o risco de crédito -que jamais ocorreu nas relações entre os países da região.
Um dos grandes desafios será sustentar o conceito de grande empresa nacional ou latino-americana em um contexto de globalização. Mas isso é tema para uma próxima coluna.

E-mail - Luisnassif@uol.com.br


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