São Paulo, domingo, 09 de julho de 2006

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CUT promete dar "apoio crítico" a Lula

Com novo dirigente, maior central sindical do país diz que pressionará governo por mais investimentos na área social

Redução de juros, jornada de trabalho mais curta e combate à terceirização estão na lista de prioridades da nova liderança da CUT


CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Sob o comando de Artur Henrique da Silva Santos, 44, a CUT (Central Única dos Trabalhadores) vai apoiar a reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas pretende ser mais "crítica" em relação ao governo petista. Em congresso realizado no início de junho, Santos foi eleito o novo presidente da maior central sindical da América Latina. A CUT representa cerca de 3.000 sindicatos e 21 milhões de trabalhadores.
Sociólogo de formação e representante dos eletricitários, ele diz que a central quer mobilizar os trabalhadores para pressionar o governo a mudar a política econômica, investir em áreas sociais e negociar a pauta dos trabalhadores. "É preciso reduzir a jornada de trabalho sem reduzir salários, limitar as horas extras e combater a terceirização". Leia os principais trechos da entrevista:

 

FOLHA - A CUT anunciou em seu congresso apoio à reeleição de Lula. Como será esse apoio?
ARTUR HENRIQUE DA SILVA SANTOS -
No congresso, decidimos que é preciso impedir o retrocesso e a volta de um projeto neoliberal de privatização. Mas tem de haver mobilização dos movimentos sociais para pressionar por mudanças. Não basta apenas dizer que apoiamos a reeleição de Lula. Queremos mobilizar os trabalhadores para poder pressionar o governo. Sem pressão, não haverá mudanças. É preciso apoiar, mas com uma visão crítica.

FOLHA - Como a central vai pressionar por mudanças? A CUT foi acusada de ter uma atuação "chapa-branca" em relação ao governo.
SANTOS -
Em vez de levantar bandeiras contra isso ou aquilo, vamos continuar fazendo propostas para convencer a sociedade e os movimentos sociais a pressionar o governo por mudanças. Em relação à conduta da CUT, durante o governo Lula, os sindicatos não fizeram greves apenas em empresas privadas. As greves ocorreram em empresas públicas, nas que são controladas pelo Estado. Houve paralisações de bancários, metalúrgicos, eletricitários e do funcionalismo. Foram greves de enfrentamento com o governo em relação às propostas apresentadas.

FOLHA - Na prática, como será o apoio à reeleição?
SANTOS -
Os sindicatos vão discutir com os trabalhadores o que representa o projeto do PSDB e do PFL e o que representa o projeto de Lula. Isso não quer dizer que votar no Lula significa que todos os nossos problemas estão resolvidos. Não basta reeleger Lula. Os movimentos sociais têm de retomar com força as mobilizações para implementar as reivindicações dos trabalhadores. É preciso reduzir a jornada de trabalho sem reduzir salários, limitar as horas extras, combater a terceirização. A CUT, no próximo período, tem de retomar um processo muito forte com as demais centrais sindicais e fazer uma grande campanha de mobilização. É preciso colocar a massa na rua para pressionar [o governo].

FOLHA - Onde o governo Lula falhou, na sua avaliação?
SANTOS -
O ponto positivo deste governo foi abrir espaço de diálogo e negociação com os movimentos sociais. Durante o governo FHC, e mesmo em São Paulo, não se conseguia nem sequer conversar e negociar. A CUT mobilizava os trabalhadores e colava cartazes do tipo "diga não a isso" ou "não àquilo". Agora, é obrigada a apresentar alternativas, tem de ser propositiva. Em várias áreas, como na reforma agrária, na questão da Previdência, da saúde, é preciso haver mudanças claras de rumos quando se fala no papel do Estado. Falta sair dessa armadilha da política macroeconômica para garantir mais investimentos nas políticas públicas e sociais. Faltou investir na saúde, na educação e na contratação de trabalhadores por concurso público. Não para inchar a máquina, mas é preciso acabar com a terceirização. Pretendemos fazer uma campanha nacional para mostrar os prejuízos da terceirização e trabalhar essa questão nas negociações coletivas e mudando a legislação. Queremos que os terceirizados possam ser representados por aqueles sindicatos que estão na chamada categoria principal.

FOLHA - O que é necessário mudar na política econômica?
SANTOS -
É preciso implementar no Brasil uma política de redução mais acentuada da taxa de juros e do superávit primário, além de ampliar o Conselho Monetário Nacional. Não é possível continuar, num segundo mandato do governo Lula, com somente três pessoas tomando decisões na questão macroeconômica: o presidente do Banco Central, o ministro da Fazenda e o ministro do Planejamento. Tem de democratizar o conselho com a participação de empresários e trabalhadores. E incluir, além da meta de inflação, metas de crescimento e emprego. Apesar de o governo Lula ter gerado empregos, o número ainda é insuficiente para a quantidade de pessoas que estão fora do mercado. Quando se estabelecem metas de crescimento e emprego, você força a discussão do Orçamento. Precisamos de mais dinheiro para investir em políticas públicas e infra-estrutura.

FOLHA - O que muda na CUT com essa nova gestão?
SANTOS -
É preciso mudar a estrutura da central, formar novos dirigentes e ampliar a organização no local de trabalho. Na década de 80, o novo sindicalismo tirou os dirigentes do castelo da estrutura sindical e foi para a porta das empresas. Agora, para poder acompanhar as mudanças no mundo do trabalho, é preciso organizar os trabalhadores no interior da fábrica, do banco, da escola e ocupar esse espaço de representação. Isso exige uma mudança cultural muito forte no Brasil. Grandes empresas já chegaram à conclusão de que, quando há mais organização no local de trabalho, surgem menos processos na Justiça porque os conflitos são resolvidos no local de trabalho. Mas poucos empresários pensam assim.


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