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OPINIÃO ECONÔMICA
Uma nova oportunidade
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
O novo acordo do Brasil com o FMI surpreendeu por sua dimensão e pela rapidez com que foi concluído. Ele vai no sentido contrário da posição oficial do governo Bush em relação à política anterior da instituição de conceder megarresgates financeiros a países em desenvolvimento. Os riscos de um colapso do sistema bancário internacional, que poderia ocorrer caso o Brasil suspendesse seus pagamentos, fez com que o governo republicano abandonasse seus pontos ideológicos mais radicais e adotasse um pragmatismo defensivo. A ajuda ao
Uruguai já tinha sido um sinal claro desses novos tempos.
Essa nova ajuda internacional ao Brasil é significativa tanto em
sua dimensão absoluta como relativa. Os vencimentos de papéis
brasileiros em 2003 somam algo
como US$ 28 bilhões, contra o desembolso de dinheiro novo do
FMI da ordem de US$ 24 bilhões.
Como se espera ainda algum programa adicional com o Bird e o
BID, poderemos contar com recursos institucionais para a rolagem da quase totalidade de nossa
dívida externa. Se for realizado
esse novo programa sem problemas com o Fundo durante os próximos 15 meses, e com a acomodação do chamado risco Brasil
nos mercados de capitais, poderemos ter a volta da entrada de recursos voluntários privados ao
longo do próximo ano. Pagaremos caro por esses capitais, que
terão prazo mais reduzido, mas
ainda assim estaremos trilhando
um caminho de recuperação em
nossa solvência externa.
Os detalhes do acordo que são
conhecidos também refletem os
tempos difíceis que vivem hoje os
mercados financeiros internacionais. As chamadas "condicionalidades" que acompanham o novo
empréstimo são leves e centradas
apenas na manutenção do superávit fiscal primário, que está previsto na LDO (Lei de Diretrizes
Orçamentárias) do ano que vem.
A única condição que abre possibilidade de algum endurecimento
nas condições do programa é a
que se refere ao superávit "mínimo" de 3,75% do PIB. Nada parecido com as tradicionais amarras
na política econômica dos governos que recebem ajuda do FMI.
Essas novas condições são importantes dada a delicadeza da situação política que vivemos e a
necessidade de apoio explícito dos
candidatos a presidente ao empréstimo.
No meu entendimento, os candidatos que fazem oposição ao
governo FHC não têm outra saída senão apoiar o acordo negociado, sob o risco de passarem a
imagem de incendiários. O susto
com a corrida ao dólar nas últimas semanas foi muito forte e
criou um clima de pânico em parcela importante da população.
Ninguém vai correr o risco de reacender essa chama com declarações muito explícitas de oposição
a essa nova ajuda externa. Por
outro lado, as limitações conhecidas são pequenas quando comparadas com as dificuldades de um
novo mandato presidencial marcado por uma crise externa de solvência. Mais uma vez repito que
devemos essa chance à crise nas
economias americana e mundial
de hoje.
O ponto mais importante desse
novo capítulo na longa história
de nossas crises externas é o entendimento de que temos mais
uma chance para enfrentar, de
uma forma clara e firme, a questão de nossa fragilidade financeira em moeda forte. As lições das
crises internacionais por que passamos nos últimos oito anos já
são suficientemente claras para
mostrar a necessidade de reduzirmos, ao longo dos próximos anos,
nosso déficit em conta corrente
dos níveis atuais de cerca de 4%
do PIB para algo próximo de 2%.
Sem esse passo não vamos conseguir estabilizar nossa taxa de
câmbio e, em consequência, reduzir a taxa de juros no mercado interno.
Esse compromisso faz parte dos
programas dos candidatos mais
competitivos nas próximas eleições, o que representa um avanço
importante. Faz-se necessário
agora o detalhamento das medidas objetivas e de longo prazo,
que vão permitir chegarmos a
uma situação segura e estável em
relação ao balanço de pagamentos. As dificuldades operacionais
para se chegar a esse objetivo são
enormes e vão exigir idéias claras
por parte do próximo presidente.
Isso não está garantido, ao menos
no caso do candidato José Serra.
Ele e um grupo de economistas
que trabalharam no primeiro
mandato de FHC sempre defenderam essa correção de rumo.
Perderam a batalha para o grupo
mais liberal liderado pelo atual
ministro da Fazenda, mas deixaram um plano de vôo detalhado
para uma aterrissagem mais suave de nossa economia. Seu governo deve centrar sua política econômica nesse rumo.
No caso do PT existe um diagnóstico semelhante, mas os instrumentos de ação estão ultrapassados pelos tempos. O governo
Lula pode mirar no alvo correto e
atingir um objetivo completamente diferente.
No caso de Ciro Gomes não consigo visualizar com clareza essas
idéias. A campanha do ex-governador do Ceará baseia-se em
pontos isolados, de fácil compreensão pela opinião pública,
como uma renegociação inviável
das dívidas externa e interna e
uma reforma tributária que os
tempos mostraram inviáveis. Não
existe um desenho consistente e
articulado de como enfrentar os
problemas mais graves de nossa
economia. Portanto não é possível avaliar as possibilidades de
sucesso ou não de seu governo na
administração de nossa economia, mesmo com a ajuda dos bilhões de dólares do FMI.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 59, engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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