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OPINIÃO ECONÔMICA
Brasil na cola do mundo
GESNER OLIVEIRA
Os números da economia
estão bons para o último trimestre do ano. Salvo por uma catástrofe no mundo (não descartável, mas improvável), a recuperação brasileira deve prosseguir nos
próximos 12 meses. E a partir daí?
É bom encomendar uma boa bola
de cristal para o Dia das Crianças
do ano que vem.
A última semana trouxe boas
notícias em termos de inflação, o
que desmentiu projeções pessimistas de aumento generalizado
de preços. Esse último estaria associado a um imaginário excesso
de demanda na economia, tampouco confirmado pelos dados.
As expectativas do setor privado
estão otimistas, a julgar pelos resultados parciais da Sondagem
Conjuntural da indústria de
transformação da Fundação Getúlio Vargas divulgados na quinta-feira. Das 424 empresas pesquisadas, 50% prevêem uma melhora na situação dos negócios no
período de outubro de 2004 a
março de 2005, contra 5% que
vislumbram uma piora, com um
saldo, portanto, de 45 pontos percentuais. Essa diferença era de 36
pontos há 12 meses. Ainda segundo a sondagem, verificou-se
maior nível de demanda, redução
de estoques e melhora do quadro
corrente de negócios.
Não se deve esperar mudança
na política econômica depois das
eleições municipais. Isso é bom
porque afasta o risco de uma
aventura. Mas é ruim porque não
abre perspectivas de maior criatividade para elevar o investimento e as condições para o crescimento sustentado.
Na ausência de grandes novidades no plano interno, as chances
de um bom desempenho da economia no próximo ano repousam
sobre a economia mundial. Em
contraste com o passado, é cada
vez mais difícil para uma economia emergente descolar do comportamento da economia internacional.
No mundo, os momentos mais
difíceis parecem reservados, por
vezes, às lideranças mais medíocres. George W. Bush é a ilustração patente dessa espécie de capricho da história. Dado o horário do fechamento desta edição,
não é possível comentar o debate
de ontem à noite entre Bush e
Kerry.
No último confronto entre os
dois, o tema central era política
externa e segurança interna e não
houve sequer menção à Rodada
Doha da OMC, ou à coordenação
macroeconômica para a estabilidade da economia mundial, ou,
ao menos, a planos de desenvolvimento para áreas mais tensas do
ponto de vista geopolítico. Em
contraste com a atitude de construção institucional que deu lugar ao sistema de Bretton Woods
após a Segunda Guerra Mundial,
o mapa-múndi da política externa dos EUA se reduziu aos destroços do Iraque e às cavernas do
Afeganistão.
Embora Kerry seja muito melhor do que Bush, há motivo para
inquietação em relação à política
econômica dos EUA nas duas alternativas. Mas as dificuldades
com os desequilíbrios fiscal e do
balanço de pagamentos não são
problemas para os próximos 12
meses. Tampouco a China deixará de ser um dos motores do crescimento da economia mundial
nesse período, ainda que seus desequilíbrios sejam mais graves.
Assim, EUA e China serão problemas de médio prazo, não de curto
prazo.
Curiosamente, com o preço do
petróleo ocorre um fenômeno inverso. As projeções de demanda e
oferta mundiais indicam que não
há um problema estrutural de excesso de procura. No médio prazo,
portanto, o petróleo não é um
problema. Mas não deixa de ser
angustiante a persistência de altos patamares de preço no curto
prazo.
Assim, salvo pelos sustos do petróleo, as perspectivas para 2005
são boas. Mas, para embarcar em
um vôo de longa distância, para
ingressar em uma fase de vigorosa expansão, como a da Índia e a
da China, o Brasil precisaria de
uma estrutura consistente de incentivos ao investimento produtivo. Só assim seria possível dilatar
o prazo das expectativas otimistas detectadas pelas sondagens da
FGV.
Infelizmente, isso ainda não
ocorre. Tome-se o problema da
infra-estrutura. O empreendedor
nos setores estratégicos da economia se encontra encurralado em
uma espécie de limbo burocrático, algo parecido com a situação
de Tom Hanks no curioso "Terminal", de Steven Spielberg. Não
há um novo modelo de inversão
em funcionamento, nem se pode
retornar ao marco regulatório do
governo anterior. E, o que é pior,
não há a companhia de Catherine Zeta-Jones.
Gesner Oliveira, 48, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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