São Paulo, sábado, 09 de outubro de 2004

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LUÍS NASSIF

As guerras entre nações

Há uma análise que se aplica a tempos de guerra, da chamada guerra psicossocial. São estratégias que se adotam visando minar a vontade do adversário. É interessante dissecar um pouco essa visão quase militar da guerra entre as nações.
Nas disputas entre países, as armas utilizadas basicamente por aqueles que estão em um estágio superior de consciência (e, por isso mesmo, são hegemônicos) baseiam-se nessas estratégias psicossociais.
O subdesenvolvimento é um estado de espírito, assim como a miséria. O obstáculo maior de toda política desenvolvimentista é convencer a opinião pública de que o país, um dia, pode ambicionar a ser hegemônico. O objetivo de todo país hegemônico é o oposto, o de convencer os países de sua zona de influência a se contentar em serem caudatários.
Em um tempo em que o grau de consciência nacional era menor, em que as informações eram menos difundidas, tal visão passava por teoria conspiratória ou paranóia. À medida que as grandes disputas comerciais desnudam o jogo entre as nações, essas hipóteses passam a ser verossímeis.
Há três elementos que são trabalhados dentro dessa guerra: a imagem, as palavras e a música. Quando se define que tal teoria é "moderna" e que seus adversários são "jurássicos", está se recorrendo claramente à palavra.
A música "Imagine", de John Lennon, foi um elemento importante para derrubar a vontade norte-americana na Guerra do Vietnã.
A repetição do termo globalização é um aspecto de construção do imaginário, visando vender uma hegemonia pactuada dos EUA. Quando sai de cena Clinton e entra a era Bush, muda-se a estratégia para a hegemonia imposta. Não coincidentemente, a palavra globalização sai de moda.
A mais objetiva dessas ferramentas é a imagem, porque é sensorialmente direta. O caso do arrastão no Rio de Janeiro, sempre em vésperas de eleições, é tipicamente o uso da operação utilizando imagens. Imagens de guerra são censuradas nos EUA por seu efeito corrosivo sobre a opinião pública.
Por isso mesmo, um dos pontos centrais da visão de estadista de Vargas foi trabalhar a auto-estima nacional. Foi um processo que se iniciou nos anos 30 e que se valeu da literatura, da palavra, da música e das artes plásticas.
Com o advento do regime militar, a política passa a ser excludente. Ocorre um divórcio entre opinião pública e governo, entre povo e empresários. Mas mantém-se o ideário desenvolvimentista.
No Brasil, conseguiu-se destruir o imaginário nacional aproveitando a perda de rumo (normal) no período de transição para o regime democrático, especialmente dois governos anormalmente desastrosos, o de Figueiredo e o de Sarney.
Desmoronou o trabalho de décadas de Getúlio, Capanema, Villa-Lobos, Portinari, Jorge Amado, de construção de uma identidade nacional.
O desafio, agora, é iniciar a reconstrução. Nesse ponto, é relevante o papel internacional de Lula, assumindo sua condição de brasileiro com a mesma objetividade de um texano rude.

E-mail - Luisnassif@uol.com.br


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