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OMC inicia debate decisivo sobre agricultura
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MONTREUX
A OMC (Organização Mundial do Comércio) iniciou ontem duas semanas de debates
sobre a liberalização da agricultura, o grande nó da Rodada
Doha de negociações comerciais, lançada em 2001 e praticamente parada desde então.
Por mais que a palavra "decisiva" para qualificar a nova negociação possa estar desgastada, pela quantidade de vezes
que foi usada, sem ter decidido
nada, desta vez há dois motivos
para adotá-la, a saber:
1) O tempo está definitivamente se esgotando para se alcançar ao menos um esboço de
acordo. Há virtual consenso de
que ou se chega a um entendimento até o fim do ano ou Doha
poderá ser dada como morta.
2) Agora, há parâmetros bem
definidos a partir dos quais negociar, desde que os presidentes dos grupos negociadores de
agricultura, Crawford Falconer, e de bens industriais, Don
Stephenson, apresentaram
seus textos, há dois meses.
Os números por eles apresentados eram para "pegar ou
largar", na avaliação então obtida pela Folha no comando da
OMC. Há 20 dias, os EUA "pegaram", ou seja, aceitaram negociar a redução de seus subsídios para entre US$ 12,8 bilhões e US$ 16 bilhões por ano
-antes, insistiam oficialmente
em US$ 22 bilhões e, extra-oficialmente, em US$ 18 bilhões.
Como também os europeus
aceitaram a faixa de redução de
suas tarifas agrícolas, a bola
veio para o campo do Brasil e
do G20, o grupo de países em
desenvolvimento que ele lidera, obrigados em tese a reduzir
suas tarifas industriais, conforme cobrou no dia 4 deste mês a
negociadora-chefe norte-americana, Susan Schwab.
Mas, nas duas semanas de
negociação agrícola, o Brasil dirá que não é bem assim. Primeiro, porque os EUA querem
aceitar apenas a parte superior
da faixa de corte proposta por
Falconer (US$ 16 bilhões),
quando o G20 cobra US$ 12 bilhões como teto máximo.
Segundo, porque "dá com
uma mão, mas tira com a outra", como diz Clodoaldo Hugueney, embaixador do Brasil
em Genebra, a sede da OMC.
Qual é o truque? Os americanos se recusam a aceitar, além
do teto global, um limite também para produtos.
No caso dos europeus, o truque é parecido, sempre segundo o embaixador: reduzem as
tarifas mas colocam uma série
de produtos na lista de "sensíveis", que podem manter uma
proteção mais elevada.
Tudo somado, tem-se que o
Brasil só aceita reduzir suas tarifas de bens industriais "na dependência do nível de ambição
em agricultura, que está longe
de ter sido estabelecido [nos
textos de Falconer e Stephenson]", diz Hugueney.
Ainda assim, o diretor-geral
da OMC, Pascal Lamy, disse
ontem em seminário sobre exportações que "nunca se esteve
tão perto de um acordo em
agricultura". Mas adicionou
uma nota de cautela: "Na comparação com a situação de 18
meses atrás, andamos milhas e
milhas. Estamos perto da linha
de chegada? Ainda não".
Na avaliação dos especialistas em comércio, a dificuldade
do Brasil para reduzir suas tarifas industriais não é interna,
mas externa. Argentina e África do Sul ficaram profundamente insatisfeitas com as propostas de Stephenson. Como
são parte do G20, para o Brasil
fica difícil ceder qualquer coisa
sem quebrar o grupo, conforme a avaliação obtida pela Folha no comando da OMC.
Hugueney nega, no entanto,
que esse seja o nó principal. Para ele, a questão continua a ser
o nível baixo de concessões do
mundo rico na área agrícola.
Ou seja, seria o mesmíssimo
problema que emperrou a negociação nos últimos seis anos.
O jornalista CLÓVIS ROSSI viajou a Montreux a
convite do Centro de Comércio Internacional,
braço técnico conjunto da OMC e da Unctad
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