São Paulo, terça-feira, 09 de outubro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

OMC inicia debate decisivo sobre agricultura

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MONTREUX

A OMC (Organização Mundial do Comércio) iniciou ontem duas semanas de debates sobre a liberalização da agricultura, o grande nó da Rodada Doha de negociações comerciais, lançada em 2001 e praticamente parada desde então.
Por mais que a palavra "decisiva" para qualificar a nova negociação possa estar desgastada, pela quantidade de vezes que foi usada, sem ter decidido nada, desta vez há dois motivos para adotá-la, a saber:
1) O tempo está definitivamente se esgotando para se alcançar ao menos um esboço de acordo. Há virtual consenso de que ou se chega a um entendimento até o fim do ano ou Doha poderá ser dada como morta.
2) Agora, há parâmetros bem definidos a partir dos quais negociar, desde que os presidentes dos grupos negociadores de agricultura, Crawford Falconer, e de bens industriais, Don Stephenson, apresentaram seus textos, há dois meses.
Os números por eles apresentados eram para "pegar ou largar", na avaliação então obtida pela Folha no comando da OMC. Há 20 dias, os EUA "pegaram", ou seja, aceitaram negociar a redução de seus subsídios para entre US$ 12,8 bilhões e US$ 16 bilhões por ano -antes, insistiam oficialmente em US$ 22 bilhões e, extra-oficialmente, em US$ 18 bilhões.
Como também os europeus aceitaram a faixa de redução de suas tarifas agrícolas, a bola veio para o campo do Brasil e do G20, o grupo de países em desenvolvimento que ele lidera, obrigados em tese a reduzir suas tarifas industriais, conforme cobrou no dia 4 deste mês a negociadora-chefe norte-americana, Susan Schwab.
Mas, nas duas semanas de negociação agrícola, o Brasil dirá que não é bem assim. Primeiro, porque os EUA querem aceitar apenas a parte superior da faixa de corte proposta por Falconer (US$ 16 bilhões), quando o G20 cobra US$ 12 bilhões como teto máximo.
Segundo, porque "dá com uma mão, mas tira com a outra", como diz Clodoaldo Hugueney, embaixador do Brasil em Genebra, a sede da OMC.
Qual é o truque? Os americanos se recusam a aceitar, além do teto global, um limite também para produtos.
No caso dos europeus, o truque é parecido, sempre segundo o embaixador: reduzem as tarifas mas colocam uma série de produtos na lista de "sensíveis", que podem manter uma proteção mais elevada.
Tudo somado, tem-se que o Brasil só aceita reduzir suas tarifas de bens industriais "na dependência do nível de ambição em agricultura, que está longe de ter sido estabelecido [nos textos de Falconer e Stephenson]", diz Hugueney.
Ainda assim, o diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, disse ontem em seminário sobre exportações que "nunca se esteve tão perto de um acordo em agricultura". Mas adicionou uma nota de cautela: "Na comparação com a situação de 18 meses atrás, andamos milhas e milhas. Estamos perto da linha de chegada? Ainda não".
Na avaliação dos especialistas em comércio, a dificuldade do Brasil para reduzir suas tarifas industriais não é interna, mas externa. Argentina e África do Sul ficaram profundamente insatisfeitas com as propostas de Stephenson. Como são parte do G20, para o Brasil fica difícil ceder qualquer coisa sem quebrar o grupo, conforme a avaliação obtida pela Folha no comando da OMC. Hugueney nega, no entanto, que esse seja o nó principal. Para ele, a questão continua a ser o nível baixo de concessões do mundo rico na área agrícola.
Ou seja, seria o mesmíssimo problema que emperrou a negociação nos últimos seis anos.


O jornalista CLÓVIS ROSSI viajou a Montreux a convite do Centro de Comércio Internacional, braço técnico conjunto da OMC e da Unctad


Texto Anterior: Justiça do PR suspende leilão de três trechos
Próximo Texto: Vaivém das commodities
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.