São Paulo, quinta-feira, 09 de novembro de 2006

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análise

Crescer 5% em 2007 fica cada vez mais difícil

MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL

A derrapada da indústria no terceiro trimestre, que sinaliza um desempenho ainda tímido da economia brasileira, reduziu projeções para a taxa de crescimento neste ano e torna ainda mais ambiciosa e difícil de cumprir a meta de crescer 5% no ano que vem.
A indústria cresceu apenas 0,4% no terceiro trimestre, o que fez com que analistas do setor privado revissem suas projeções para o crescimento da economia neste ano, ajustando-as para valores ao redor de 3%, com grande parte dizendo esperar taxa até mais modesta, transformando os 3% na projeção dos otimistas.
"Uma pessoa otimista poderia esperar algo como 3% ou 3,2% [em 2006], mas se a produção se comportar mais ou menos como se comportou até agora, fica em 2,2%", disse José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, que estima para este ano crescimento em torno de 2,8%.
A projeção dos analistas da MB Associados é a mesma. Sergio Vale, economista da consultoria, diz que apenas um desempenho muito atípico no último trimestre deste ano poderia fazer com que a economia cresça a taxas mais vitaminadas do que os modestos 3%, algo que ele diz considerar improvável.
Vale explica: no ano passado, o quarto trimestre já foi atípico, com a indústria, excepcionalmente, pisando no acelerador no mês de dezembro. O resultado, diz ele, foi a necessidade de ajustar estoques no início deste ano, e carregar estoques indesejados traz custos adicionais. Para o economista, é improvável que o setor industrial repita o erro neste ano.
"A indústria deve ter aprendido a lição, essa situação não vai se repetir", argumenta ele, que lembra ainda que as condições hoje são ainda mais desfavoráveis para o setor, enfrentando a concorrência forte de importados, estimulados pela alta do real frente ao dólar.
Quanto pior o desempenho neste ano, argumentam os analistas, mais difícil será crescer os 5% esperados pelo governo. Primeiro, uma boa parte dos economistas diz acreditar que o Brasil não investe o suficiente para crescer a essa velocidade sem gerar gargalos e, por conseqüência, pressões inflacionárias. Segundo, nem a estatística ajudará. Caso estivéssemos crescendo mais rápido agora, o PIB do próximo ano "carregaria" parte do crescimento por meio do efeito que os estatísticos chamam de "carry over": como o PIB no final do ano é maior que o do resto do ano, ainda que não cresça nada nos primeiros trimestres, a economia cresce em relação à media dos 12 meses anteriores. Assim, o efeito no começo de 2007 será menor com crescimento baixo no final de 2006.
Neste ano, pelo menos, a sensação de bem-estar que o crescimento esperado de 3% ou menos deve ser um pouco maior do que o dado geral sugere. O consumo das famílias, esperam os analistas, deve crescer em torno de 5%, vitaminado por importados baratos, ganhos de renda e de poder de compra por conta da inflação menor. Mas o cenário não deve se repetir com tanta facilidade em 2007. "O lado da demanda, do consumo tende a se estabilizar. A inflação não deve fugir de controle, mas não vai recuar mais. Não devem se repetir [na mesma intensidade] os efeitos que tivemos neste ano, com ganhos de renda, expansão do crédito e valorização da moeda", diz Gonçalves, do Fator.
Apesar de todos estes estímulos em 2005, argumenta o economista, já foi impossível chegar a 5% neste ano. Em 2007, diz ele, a procura por bens e serviços não deve ter desempenho tão favorável. "Crescer a qualquer custo é possível, mas o preço será pago em 2008. O governo sabe que é melhor ir devagar agora e melhorar as coisas para crescer mais depois", diz o analista do Fator.
O câmbio atrapalhou a indústria, a impediu de crescer, mas mesmo um real menos forte não criaria todas as condições para crescer à velocidade que deseja o governo, diz Vale, da MB. "A grande questão, além da questão conjuntural do câmbio, é estrutural, gira em torno da questão fiscal. Precisa ter uma reforma completa da Previdência, dos gastos públicos, com menos gastos correntes e mais gastos de investimentos", completa.


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