São Paulo, domingo, 09 de dezembro de 2001

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ANÁLISE

Com colapso mais do que anunciado, contágio argentino deve ser limitado

JAMES THORNHILL
DA REUTERS, EM LONDRES

O contágio em outros mercados emergentes, caso a Argentina entre em colapso financeiro, seria provavelmente limitado, porque os investidores tiveram tempo de sobra para se posicionar para um cenário que agora parece cada vez mais próximo.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) anunciou na quarta-feira que não completaria a mais recente revisão da situação argentina agora, retardando o desembolso de US$ 1,3 bilhão em empréstimos. A notícia coloca em questão a capacidade argentina para manter em dia o serviço de sua dívida. (Uma parcela vence no dia19.) Mas outros mercados emergentes têm se mantido firmes.
"A crise russa de 1998 apanhou muita gente de surpresa, mas todos estão cientes da Argentina. Isso deve limitar o contágio", diz Henry Stipp, da Zurich Scudder Financial Investments.
Os analistas ressaltam que os administradores de fundos de investimento tiveram meses para fazer o ajuste de suas estratégias, levando em conta o risco de uma moratória ou ainda uma desvalorização do peso.
Enquanto isso, o perfil do investimento em mercados emergentes sofreu uma mudança considerável, com muitos dos investidores fugindo dos papéis desses países, devido aos problemas argentinos e à crise financeira turca.
"Neste ano houve pouca procura por essa classe de ativos. Investidores que não sejam especializados saíram. Esse tipo de investimento ficou nas mãos de fundos de mercados emergentes apenas", afirma Alex Garrard, estrategista de mercados emergentes do UBS Warburg.

Brasil
A maior parte dos analistas considera que o Brasil é o país com mais chances de ser afetado pelo contágio da Argentina, mas eles estão impressionados com a capacidade que o mercado brasileiro demonstrou de se descolar do vizinho nas últimas semanas.
"A percepção geral entre os investidores é a de que o mercado brasileiro seja capaz de continuar suportado a pressão da Argentina", afirma Garrard, do UBS.
Outros ressaltam o progresso brasileiro no combate aos problemas fiscais, em contraste com a confusão nas finanças públicas argentinas.
"O Brasil fez o trabalho duro da reforma fiscal nos últimos dez anos, enquanto a Argentina mal começou", diz Jerome Booth, diretor de pesquisa da Ashmore Investment Management.
No entanto, Garrard considera que o Brasil continua em risco, devido ao caótico final de jogo na Argentina e aos resgates que ele pode causar nos fundos exclusivos de investimento em mercados emergentes.
O analista menciona uma desvalorização forçada do peso como um cenário potencialmente caótico, mas acrescentou que a dolarização (adoção da moeda norte-americana como moeda nacional na Argentina) ou a desvalorização controlada sejam cenários mais prováveis.
Stipp, da Zurich Scudder, ecoa a opinião de Garrard: "Muito depende do rumo que a Argentina vai tomar agora. Se eles desvalorizarem sua moeda, o Brasil será afetado".
Cita também as eleições presidenciais brasileiras, em outubro de 2002, como um fator que pode fazer com que investidores se tornem ainda mais avessos a riscos.
Stipp aponta para o Chile como outra vítima potencial de contágio na região. Uma desvalorização poderia pressionar o peso chileno, já que o país compete em mercados semelhantes aos da Argentina.

Rússia
Se os fundos de investimentos em mercados emergentes virem um aumento nos saques depois de uma medida extrema na Argentina, a Rússia talvez se mostre vulnerável.
Garrard, do UBS, diz que os resgates provavelmente atingiriam os países que mais pesam nas carteiras dos investidores. O forte desempenho dos títulos da dívida russa neste ano sugere que ela se enquadre na categoria. O fato de que a Rússia acaba de sair de uma crise também pode colocá-la em risco.
"Quando as pessoas começarem a perguntar quem será o próximo, os países que tiveram problemas recentemente podem ser atingidos", diz Stipp, da Zurich Scudder.
Os emergentes da Europa como um todo são vistos como bem isolados do contágio argentino. Esses países têm uma dependência maior da União Européia (e não dos EUA), o que os diferencia da América Latina e da Ásia. Os investidores os vêem em uma trilha de convergência econômica, a longo prazo, em direção à União Européia.
Os mercados asiáticos mal reagiram aos mais recentes problemas argentinos, e os analistas não esperam que essa tendência se altere.
"Não houve qualquer efeito perceptível da crise Argentina. A fraqueza do iene é uma questão muito mais importante para os mercados asiáticos", afirma John Stuermer, analista de mercados emergentes do Bear Stearns.
Uma desvalorização do peso pode causar especulação amena contra o dólar de Hong Kong e sua âncora cambial, disse Stuermer, ainda que ele tenha acrescentado que as autoridades haviam agido rapidamente para negar que Hong Kong estivesse pensando em abandonar seu câmbio.


Tradução de Paulo Migliacci


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