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ARTIGO
O futuro da integração turca à União Européia
JEFFREY SACHS
ESPECIAL PARA A FOLHA
Os mundos islâmico e não islâmico parecem estar atracados
num círculo vicioso de ódio que
está convencendo muitos moderados de cada lado que o abismo
cultural e político que os divide é
fundo demais para poder ser atravessado. Nesse contexto, a hesitação e as discussões na Europa sobre a possível entrada da Turquia
na União Européia (UE) assumem um significado especial.
A participação turca na UE provavelmente será discutida na cúpula de líderes da UE que terá lugar em dezembro, em Copenhague. Desde os anos 1960, a Europa
regularmente -e com razão-
observava que a Turquia não tinha satisfeito várias condições necessárias para ser membro do
grupo, especialmente com relação ao respeito pelos direitos humanos e o Estado de direito.
Não se sabe se a Europa aceitaria a Turquia, uma sociedade islâmica, dentro do agrupamento europeu, sob quaisquer condições.
Os sentimentos antiislâmicos são
profundos na Europa, refletindo
mil anos de rivalidades, guerra e
choques culturais. Muitos turcos
temem que a exclusão de seu país
da UE não tenha nada a ver com
políticas ou instituições específicas, mas com a hostilidade européia permanente em relação às
sociedades islâmicas.
Com a ampliação da UE em
sentido leste agora prestes a acontecer, não surpreende que idéias
perigosas e profundamente sentidas estejam vindo à tona. O ex-presidente francês Valery Giscard
d'Estaing, atual presidente da
Convenção sobre o Futuro da Europa, declarou recentemente que
""a Turquia não é um país europeu" e que a entrada da Turquia
na UE seria ""o fim da Europa".
Na condição de admirador da
UE e defensor da entrada da Turquia na UE, acho que Giscard erra
em sua caracterização grosseira.
Mas sei que ele reflete um ponto
de vista arraigado, embora esteja
longe de representar a opinião
majoritária na Europa.
A explosão de Giscard foi uma
provocação também por outro
motivo. A Turquia acaba de demonstrar o dinamismo de suas
credenciais democráticas, promovendo eleições apesar da crise
econômica que atravessa. O vencedor foi o Partido da Justiça e do
Desenvolvimento. O novo primeiro-ministro, Abdullah Gul,
declarou imediatamente que o
aceso à Europa é prioridade.
Na frente econômica, o passo
dado em direção à UE forçaria a
Turquia a continuar a aperfeiçoar
suas instituições e fortalecer o Estado de direito, com isso acrescentando estabilidade institucional de longo prazo a suas instituições políticas, o que, por sua vez,
ajudaria a estabilizar o norte da
África e o Oriente Médio.
Cada entrada de um país novo
na UE no último quarto de século,
como aconteceu com a entrada da
Espanha e de Portugal antes de
1986, e, mais recentemente, os esforços dos países pós-comunistas
centro-europeus nesse sentido,
tem incentivado a modernização
das instituições e contribuído para a estabilidade e a moderação
nas políticas nacionais. Ademais,
ao incentivar essa reforma institucional, as perspectivas econômicas também se tornam mais positivas, entre outras coisas devido à
capacidade da Turquia de atrair
investimentos externos diretos.
Na frente política, o efeito demonstrativo mundial da participação da Turquia na UE exerceria
consequências enormes. A afirmação feita pelos fundamentalistas islâmicos de que o Ocidente é
antiislâmico seria desmentida. A
própria Turquia poderia atuar como ponte mais confiável para as
sociedades da Ásia Central, desde
o Azerbaijão até o Quirguistão,
países que hoje correm o risco de
desestabilização devido à guerra
contra o terrorismo e a disputas
em torno de petróleo.
Felizmente, quando Giscard
d'Estaing expressou seus sentimentos perigosos, muitos na Comissão Européia e em toda a Europa declararam que o ex-presidente francês falava em seu próprio nome. A União Européia
precisa reafirmar essa posição de
maneira mais clara, demonstrando sua boa fé: respondendo ao desafio histórico de negociar a entrada da Turquia na UE.
Jeffrey D. Sachs é professor de economia e diretor do Instituto da Terra da
Universidade Columbia (EUA).
Tradução de Clara Allain
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