São Paulo, sexta-feira, 10 de janeiro de 2003

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LUÍS NASSIF

Habemus ministro da Justiça

Atenção com o novo ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Até agora, dentre todos os ministros de Lula, foi o que demonstrou maior clareza sobre a missão de sua pasta e sobre a maneira de atingir os objetivos.
O Brasil tem um vício secular de reduzir todos os problemas a soluções legais. Problemas macroeconômicos? Apresente-se um pacote. Problemas de criminalidade? Crie-se uma nova lei. Esse academicismo ululante sempre foi mais acentuado no campo jurídico. Tanto que, nas últimas décadas, toda discussão sobre a morosidade da Justiça girava em torno de uma genérica reforma do Judiciário, com criação de controle externo e quetais.
Nesta semana dei a palestra de abertura do Ano Jurídico na 5ª Região da Justiça Federal, em Fortaleza. O desafio que coloquei foi simples. Não existe nem controle externo nem controle interno do Judiciário por uma razão óbvia: nem o Judiciário se conhece.
É fenômeno semelhante ao que afetou as empresas nos anos 90. O empresário julgava conhecer sua empresa. Quando era indagado sobre o custo de produção de cada produto, o tempo médio de fabricação e de atendimento, o grau de satisfação do seu cliente, o empresário de nada sabia. Simplesmente porque não tinha conhecimento de ferramentas básicas de gestão e de indicadores.
O mesmo sucede com o Judiciário. Há juizes denodados, que trabalham noite e dia; e aqueles que encostam o corpo. Quem é um, quem é outro? Não se sabe porque não existem estatísticas. O preguiçoso não se sente cobrado nem o trabalhador estimulado.
Do mesmo modo, não existe padronização nem racionalização de procedimentos. O ministro Márcio menciona processo criminal que durou dez anos. Desse total, sete anos decorreram de erros primários, desde preenchimentos incorretos de formulários até reconstituição de crimes sem a presença dos advogados de defesa.
Por outro lado, em várias instâncias do Poder Judiciário têm aparecido experiências espontâneas de melhoria. Em dezembro houve encontro de grupos de qualidade do Judiciário em Recife, com experiências interessantíssimas. Em uma delas, a correição passou a ser feita com notebooks e bancos de dados estruturados. Em dois dias, no máximo, se consegue levantar todos os processos nas varas de maior movimento, soltando relatórios e gráficos automaticamente.
As experiências já existem. Falta serem levantadas, selecionadas, padronizadas e, depois, multiplicadas. É aí que entra o papel do ministro. O Poder Judiciário é independente e diversificado. Há a Justiça federal, os tribunais estaduais, o Ministério Público e os clientes advogados e cidadãos. A idéia do ministro é juntar todas as pontas e definir os padrões. Depois, partir para um banco de dados centralizado e à digitalização de todos os processos, acabando com os papéis.
Aí se chegará a um novo patamar da Justiça. Com a digitalização, serão extraordinários os saltos de qualidade e de eficácia. No campo formal, formulários previamente padronizados impedirão erros de preenchimento. Haverá acompanhamento on-line da produtividade dos juízes e do teor das sentenças. A correição passará a ser feita estatisticamente. Em pouco tempo será possível identificar e atuar firmemente contra indústrias de liminares ou de substituição de garantias.
Já existe a massa crítica adequada de experiências bem-sucedidas no Judiciário. Já existem os soldados e comandantes da qualidade total. É hora de avançar na batalha final da modernização gerencial da Justiça.

E-mail - lnassif@uol.com.br


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