São Paulo, terça-feira, 10 de janeiro de 2006

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OPINIÃO ECONÔMICA

Corre-corre

BENJAMIN STEINBRUCH

A principal notícia da semana passada foi que o governo federal decidiu tocar obras de infra-estrutura e gastar uma parte de seu enorme superávit, que no ano passado excedeu em quase R$ 20 bilhões ao valor inicialmente estimado.
Já nesta semana, se as promessas forem cumpridas, começam a ser liberados R$ 440 milhões para a operação tapa-buracos em 26 mil quilômetros de rodovias em situação crítica. Na segunda quinzena de janeiro, o presidente Lula vai conversar com 14 governadores para acertar a segunda etapa do plano de recuperação definitiva de rodovias federais, com a utilização de recursos de R$ 1,8 bilhão, sendo 70% desse valor oriundo dos cofres federais, e 30%, dos estaduais. Em maio, serão licitadas quatro usinas hidrelétricas, em projetos para acrescentar 752 MW ao sistema elétrico nacional. Ao mesmo tempo, entrarão em licitação duas grandes hidrelétricas do complexo do rio Madeira, em Rondônia, que no longo prazo podem gerar 6.600 MW, metade de uma Itaipu. No setor ferroviário, o plano é construir 150 km da ferrovia Norte-Sul, entre Aguiarnópolis e Araguaína, em Tocantins, com investimentos de R$ 350 milhões. Outros R$ 500 milhões estão previstos para a ferrovia Transnordestina, ligando o município de Eliseu Martins, no Piauí, aos portos de Suape, em Pernambuco, e Pecem, no Ceará.
O pacote já vem muito tarde e é modesto diante das necessidades. Infelizmente, o governo passou três anos debruçado sobre as pranchetas do arrocho monetário e fiscal e falhou no planejamento para corrigir as enormes deficiências da infra-estrutura.
De qualquer forma, pessoas sensatas precisam admitir que a emergência se justifica na operação tapa-buracos por uma razão elementar: a buraqueira provoca acidentes e mata pessoas nas estradas. Além disso, aumenta absurdamente o custo dos transportes. Caminhões obrigados a trafegar a 5 km por hora são presas fáceis para assaltos nas rodovias. Na BR-251, na divisa entre Minas e Goiás, há tanto buraco que os caminhões e carros só conseguem passar trafegando pela contramão.
Em situações como essa, obviamente, não há como aguardar pela tramitação morosa das concorrências públicas. Mas a sociedade pode e deve exigir duas coisas. A primeira, transparência de critérios na contratação das empreiteiras. A segunda, vigilância implacável de órgãos como Ministério Público, tribunais de Contas, Justiça e Legislativo para que as obras, mesmo sem licitação, sejam conduzidas dentro da lei.
Além das rodovias, não há dúvida de que os setores energético e de transporte ferroviário necessitam de investimentos. O pacote anunciado não é nenhuma revolução em matéria de obras. A própria emergência é filha da falta de planejamento. De qualquer forma, representa um avanço, porque não se falava tão objetivamente em recuperar e ampliar a infra-estrutura havia muitos anos.
A privatização não é solução universal para rodovias. Em regiões distantes dos principais centros, o valor do pedágio a ser cobrado para garantir a manutenção da rodovia e a remuneração de empreiteiras tornaria inviável a operação. Mas cerca de 6% da malha rodoviária pavimentada está hoje entregue a empresas privadas e essa experiência tem tido sucesso. Pode, então, ser imediatamente ampliada no Sudeste, Sul, Centro-Oeste e até em algumas regiões do Nordeste.
Fora desses centros mais ricos, a responsabilidade é pública. Falta de recursos não é desculpa. Eles existem desde que foi criada a Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), em 2001, com o propósito específico de recolher fundos para a recuperação das estradas. De janeiro de 2002 a setembro de 2005, a Cide arrecadou R$ 28,1 bilhões. Apenas R$ 6,7 bilhões desse valor foi para as estradas. A maior parte engordou o superávit público. Assim não dá.


Benjamin Steinbruch, 52, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
E-mail - bvictoria@psi.com.br



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