|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LUÍS NASSIF
O padrão JK
Para uma avaliação exemplar do governo Juscelino
Kubitschek, antes que ele seja
beatificado, e sem pretender que
seja demonizado, sugere-se a
leitura dos dois depoimentos de
Casemiro Ribeiro, ex-Sumoc,
dados ao CPDOC da Fundação
Getulio Vargas no final dos
anos 80.
Casemiro foi um dos primeiros economistas públicos, funcionário de carreira da Sumoc
(Superintendência de Moeda e
Crédito), responsável por boa
parte da construção monetária
brasileira, desde a parte monetária do Plano Trienal de Celso
Furtado, no governo Jango, até
contribuições à Lei de Mercado
de Capitais, no governo Castello
Branco.
O ponto central de seu depoimento é quando tenta convencer JK a reajustar tarifas, corrigir o câmbio e conter emissões
monetárias. "À medida que o
senhor permite que a tarifa de
avião Rio-São Paulo seja igual à
tarifa de ônibus, o número de
pessoas que anda de avião ou
que manda transportar carga
pesada por avião é uma brutalidade. Estamos importando
avião e nos endividando." JK
alegava que o Brasil precisava
de aviões, e ia além: "Você vai
aumentar as tarifas, vai aumentar o custo de vida; vai aumentar o transporte de avião, e vai
ser uma aberração da gasolina,
ih, rapaz, vou ser crucificado!".
"O senhor vai pagar o subsídio
de onde?", insistiu Casemiro. "O
preço, sendo mais baixo, vai ser
usado mais do que o necessário,
o senhor vai desequilibrar o balanço de pagamentos e vai ter
que emitir e fazer uma expansão monetária, elevando o custo
de vida."
Então, ele disse essa frase notável de político, conta Casemiro: "Casemiro, você não tem
sensibilidade política. (...) Pode
ser que, em eu emitindo para cobrir déficit de serviço público,
provoque uma emissão monetária e isso seja tão inflacionário
ou até mais do que o impacto
dos custos. Mas há diferença política enorme. Quando há emissão de papel-moeda para atender às atividades econômicas,
todo mundo bate palmas". Casemiro disse: "Mas dinheiro não
é capital, não é renda.". Ele retrucou: "Mas ninguém sabe disso, ninguém sabe. (...) Outro dia
o senador Vivácqua disse: "Falta
dinheiro neste país. Vejam o dinheiro per capita nos Estados
Unidos e o dinheiro per capita
do Brasil'". Casemiro insistiu:
"A comparação está toda errada".
Juscelino respondeu, encerrando a discussão: "Pode ser
que esteja errada, mas só você, o
Roberto, o Lucas e mais uma
meia dúzia de pessoas sabem.
(...) Quando os preços sobem, o
pessoal xinga o português da
quitanda. (...) Agora, quando é
por decreto, como no aumento
da gasolina... (xinga o governo)
Se eu fizesse no início do governo, eu poria a culpa no governo
anterior. O próximo governo vai
poder fazer -guardem esses
pareceres todos e não joguem fora não, porque eu acho que faz
sentido. (...) Essa vocês vão vender ao governo do Jânio. Ele vai
se candidatar, vai ganhar e vai
aceitar todas essas idéias de vocês. Com aquele tipo carismático, ele vai tocar pau no meu governo mesmo, e vocês vão poder
apresentar".
Jânio, de fato, herdou uma
economia em frangalhos, apesar dos "50 anos em 5".
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
Texto Anterior: Telefonia: Fundos querem controlar Telemig Celular até abril Próximo Texto: Economia Global: Bolsa de NY tem pico, mas Soros vê recessão em 2007 Índice
|