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ARTIGO
Brasil caminha para o desenvolvimento
JEFFREY SACHS
A maior história oculta de
desenvolvimento internacional de nosso tempo talvez seja
a decolagem econômica do Brasil.
Há dois anos a economia brasileira foi considerada morta, e de
modo geral se esperava que a eleição à presidência de Luiz Inácio
Lula da Silva, candidato do Partido dos Trabalhadores, desencadearia o naufrágio financeiro.
Pelo contrário, Lula governou
com extraordinária prudência, e o
Brasil tende a um rápido crescimento. Mas há algo mais fundamental em jogo: é possível que o
país esteja superando os obstáculos ao desenvolvimento econômico que o mantiveram atrasado
durante décadas.
Em janeiro de 2002, a direita
americana ficou aterrorizada com
uma possível revolução de esquerda, e os investidores estrangeiros foram tomados de pânico
diante da perspectiva de não-pagamento das dívidas externas. O
FMI, para variar, fez um bom trabalho e proporcionou financiamento provisório.
Em troca, Lula adotou políticas
macroeconômicas ortodoxas,
com o que fez desaparecer o pânico. As projeções de mercado para
o crescimento brasileiro para
2004 rondam os 4%.
Mas boa parte do mérito da mudança experimentada pelo Brasil
corresponde ao antecessor de Lula, Fernando Henrique Cardoso,
presidente de 1995 até 2002. Eu
atribuo a FHC, como ele é conhecido, quatro contribuições-chaves. Em primeiro lugar o Brasil
adotou firmemente os direitos
humanos, incluindo as eleições
democráticas e a justiça econômica para os negros e os indígenas
brasileiros. Como a maior parte
da América Latina, o Brasil nasceu nos moldes da conquista e da
escravidão.
Ainda no século 20, nem as populações indígenas nem os negros
descendentes de escravos tinham
muitas oportunidades de ordem
econômica e social. Isso está mudando rapidamente, e os grupos
indígenas ganharam uma dura
batalha por direitos sobre a terra
em seus territórios amazônicos
tradicionais.
Em segundo lugar, o Brasil está
aceitando finalmente os conhecimentos da economia global. Durante a maior parte do século 20,
as elites brasileiras pensaram que
com os recursos naturais -gado,
café, sucos de fruta e soja- ofereciam o suficiente. Com as reformas de FHC, a porcentagem de
matrículas no ensino secundário
disparou de 15% em 1990 para
71% em 2000 [na verdade, a taxa
de escolarização líquida, porcentagem do total de adolescentes de
15 a 17 anos matriculados no ensino médio, foi de 17,6% em 1991
para 33,3% em 2000, e a taxa de
atendimento, porcentagem do total de adolescentes de 15 a 17 anos
matriculados independentemente da série, foi de 62,3% em 91 para
83% em 2000].
A qualidade das universidades
também está melhorando. FHC
nomeou uma série de destacados
ministros da Ciência e Tecnologia, e o governo aumentou o investimento público em pesquisa e
desenvolvimento, um componente vital para o êxito dos países
do leste asiático. Exportações como os aviões da Embraer competem hoje com os fabricantes americanos e europeus no mercado
de jatos regionais.
Em terceiro lugar o Brasil está
concorrendo nos mercados mundiais, em vez de proteger os nacionais. Durante décadas, o protecionismo descontrolado fez que a
proporção entre as exportações e
o PIB brasileiro fosse uma das
mais baixas do mundo, mas aumentou de 6,7% em 1990 para
11,4% em 2001.
Em quarto lugar, o Brasil está se
concentrando na saúde e na produtividade de sua população. Sob
o governo FHC, foi um dos primeiros países a implementar uma
resposta eficaz contra a epidemia
de Aids. Além disso, a taxa de
mortalidade infantil diminuiu
drasticamente, de 48 por mil em
1990 para 29,6 por mil em 2001. A
taxa total de fertilidade (número
médio de nascimentos por mulher) também caiu drasticamente,
de 3,46 em 1990 para 2,38 em
2001. Como mais crianças sobrevivem até a idade adulta, as famílias pobres têm menos filhos e investem mais em sua saúde e educação, e isso no longo prazo proporciona um firme impulso ao
desenvolvimento econômico.
O Brasil continua enfrentando
enormes dificuldades. É necessário consolidar a estabilidade macroeconômica e reforçar o consenso político a favor da educação
universal, o comércio voltado para o exterior, a saúde para todos e
a economia orientada para a ciência e a tecnologia. O Brasil também deve prestar mais atenção na
gestão ambiental, especialmente
na frágil região amazônica, para
garantir um desenvolvimento
sustentável em longo prazo.
Grandes desafios, de fato, mas
parece que o país está com ânimo
para enfrentá-los.
Jeffrey Sachs é professor de economia
e diretor do Instituto da Terra da Universidade Columbia (EUA).
Tradução de Luiz Roberto
Mendes Gonçalves
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