São Paulo, sexta-feira, 10 de abril de 2009

Texto Anterior | Índice

Antes poupados, imóveis de Manhattan começam a perder valor

Enquanto em partes dos EUA preços dão sinais de recuperação, movimento de queda está só começando em Nova York; casas de luxo são as mais atingidas

JOSH BARBANEL
DO "NEW YORK TIMES"

Embora as vendas tenham se recuperado um pouco em alguns dos mercados de habitação mais abalados do oeste dos Estados Unidos, criando um vislumbre de esperança de que os preços no país possam estar chegando ao fim da queda, o mercado imobiliário de Manhattan acaba de começar um sério declínio, que acompanha o recuo do setor de serviços financeiros de Nova York. Os analistas de habitação dizem que a queda pode persistir por muito tempo, mesmo depois da cura dos demais mercados.
Os preços dos apartamentos voltaram a se tornar o assunto da cidade em Manhattan, mas desta vez o tom é de incerteza e gira em torno da queda dos números. Ainda que os corretores de imóveis digam estar vendo mais atividade nos últimos tempos, especialmente da parte de compradores de primeiro imóvel interessados em aproveitar os juros baixos, os analistas de habitação estão prevendo uma desaceleração prolongada nos preços e vendas que pode durar até cinco anos.
No primeiro trimestre deste ano, as vendas de apartamentos "co-op" (em regime de cooperativa, pelo qual os futuros moradores adquirem cotas do edifício para habitarem nele) em Manhattan caíram quase 60% ante igual período de 2008. Os preços médios desses apartamentos caíram até 24% no período, de acordo com diversos relatórios de mercado divulgados nesta semana.
Os preços das unidades em condomínios se mantiveram, até o momento, mas apenas porque compradores que assinaram contratos muito antes da crise estavam agora concluindo a aquisição de apartamentos em edifícios em final de construção. Alguns compradores estão tentando renegociar contratos, ou renegá-los. Apartamentos em condomínios e "co-ops", somados, respondem por 98% dos imóveis residenciais à venda em Manhattan.
O desgaste é mais severo no limite mais sofisticado do mercado. Existem cerca de 350 apartamentos e casas à venda em Manhattan cujo preço de referência supera os US$ 10 milhões (R$ 22 milhões), e esse estoque cresce. Ao ritmo atual de vendas, absorver todos esses imóveis requereria seis anos.
"Nos últimos três anos, maior era sempre melhor", disse Dolly Lenz, corretora da imobiliária Prudential Douglas Elliman. "Agora a chave são apartamentos menores, de qualidade e a preços acessíveis.
Antes, ninguém queria saber quanto custava o condomínio. Agora todo mundo quer."

Menos hipotecas
Manhattan foi poupada de alguns dos problemas de habitação que o restante do país teve de enfrentar durante essa desaceleração. O índice de hipotecas executadas lá continua baixo. Embora milhares de unidades em novos condomínios tenham sido construídas na ilha, a maioria se destinava a moradores, e não a especuladores, como era comum em Miami e em outros mercados excessivamente saturados. Mas os preços da moradia em Manhattan foram propelidos a uma imensa alta devido aos resultados e bonificações excelentes de Wall Street e caíram abruptamente quando o jogo virou no fim do ano passado.
A rápida queda de preços pode ser acompanhada por meio da experiência da filantropa e documentarista Abigail Disney, que um ano atrás colocou seu imenso apartamento de 17 cômodos na West End Avenue à venda por US$ 13,5 milhões.
Já que os imóveis de luxo vinham atraindo ofertas cada vez mais altas da parte dos titãs das finanças, Disney pediu pelo apartamento 20% a mais do que havia pago. O cantor e ator Harry Belafonte criou o imenso espaço muitos anos atrás ao adquirir dois apartamentos menores e derrubar as paredes que os separavam.
Depois de uma série de cortes de preços, Disney enfim encontrou compradores para o imóvel, por pouco menos de US$ 7,5 milhões, 46% abaixo de sua pedida inicial. Mas, para fechar o negócio, ela teve de aceitar um acordo sob o qual pagará pela reconstrução das paredes de separação, o que transformará o imóvel em dois apartamentos, a serem vendidos para dois compradores diferentes.

Sufoco no crédito
A despeito dos esforços do governo para aliviar a situação do crédito em todo o país, o mercado de Nova York está sendo sufocado pela disponibilidade limitada de crédito, especialmente para as hipotecas conhecidas como "jumbo", ou de valor superior a US$ 729.750. Mais de metade das vendas de apartamentos em Manhattan têm valores mais altos até mesmo que o limite expandido das hipotecas convencionais, as quais portam taxas de juros mais baixas.
Jonathan Miller, um avaliador de imóveis que produz um relatório trimestral sobre o mercado de Manhattan, diz que a queda continuará pelo resto deste ano e pelo próximo, especialmente se o crédito continuar difícil. Depois disso, afirmou, eliminar o excedente de estoque pode demorar anos.
A recuperação do setor de habitação também dependerá do estado da economia, e muitos analistas consideram que a cidade de Nova York pagará um preço desproporcional até que a recessão se encerre. Em Nova York, o setor financeiro responde por mais de 30% dos salários totais e por pelo menos parte da renda em metade dos domicílios de renda muito elevada, de acordo com a controladoria municipal das finanças.
Embora o índice de emprego tenha caído no país no ano passado, na verdade cresceu em Nova York, até setembro. Desde então, a cidade perdeu quase 85 mil empregos, até o fim de janeiro, e a controladoria municipal prevê a perda de 121 mil em 2009 e 83 mil em 2010.
Os condomínios em construção sofreram um baque especialmente forte, porque as novas regras hipotecárias dificultam aos compradores obter empréstimos convencionais a menos que 70% das unidades do edifício estejam vendidas.

Mudança de projetos
Isso fez com que muitos incorporadores tivessem de correr para alterar projetos de modo a transformar condomínios em imóveis para locação, ou a encontrar fontes alternativas de financiamento.
Na John Street, região sul de Manhattan, a Rockrose Development está convertendo um edifício Art Déco de 27 andares construído antes da Segunda Guerra Mundial em um condomínio com centenas de unidades; a Rockrose ofereceu um sistema que se resume em "alugue para comprar" e prometeu que recompraria os apartamentos adquiridos em prazo de cinco anos e por 110% do valor da compra. A incorporadora também começou a oferecer unidades em lotes de 15 apartamentos a investidores.
No fim dos anos 80, uma onda de construção de condomínios residenciais em Nova York levou a um excedente de oferta nessa categoria. Os preços atingiram um pico em 1989, caíram muito em 1991, chegaram ao ponto mais baixo em 1993 e se estabilizaram em 1995 e 1996.
Shaun Osher, presidente-executivo do Core Group Marketing, disse que nas últimas semanas começou a ver mais atividade, ainda que a preços muito mais baixos, com redução de até 40% nos preços dos apartamentos de luxo.
Miller diz que durante a última grande crise dos imóveis na ilha, quando os apartamentos menores ficaram tão baratos que ele chegou a considerar a hipótese de comprar um deles pagando com o cartão de crédito, as pessoas imaginavam que o mercado de imóveis de luxo jamais se recuperaria. Mas o mercado voltou.


Tradução de PAULO MIGLIACCI


Texto Anterior: Sanofi compra Medley e vira líder no país
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.