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GESNER OLIVEIRA
"Crepúsculo de jogo"
O Brasil teve o melhor
ambiente externo para
crescer nos últimos três anos,
mas os ventos mudaram
EXCESSO de otimismo é um perigo tanto em Copa do Mundo quanto em economia.
Ainda bem que o Parreira sabe disso. O mesmo não pode ser dito em
relação ao Copom (Comitê de Política Monetária), que divulgou a ata
de sua última reunião na quinta-feira.
O "cenário benigno" traçado na
ata do Copom é excessivamente otimista. A julgar pelo documento, a
economia estaria pronta para crescer de forma equilibrada. Em vez da
linguagem cifrada da política monetária, faltou dizer "abrem-se as cortinas e começa o espetáculo", na expressão conhecida de gerações de
torcedores que se sentem órfãos de
Fiori Giglioti.
O excesso de otimismo do Copom
reside em três pontos. Em primeiro
lugar, segundo a ata do Copom, "a
instabilidade da economia mundial
não configura um quadro de crise
tanto devido ao caráter transitório
de suas causas principais quanto
graças aos sólidos fundamentos da
economia brasileira". A maior volatilidade do mercado externo seria,
portanto, fenômeno passageiro,
não representando uma mudança
de qualidade no cenário mundial.
Tal leitura do quadro internacional subestima dois aspectos-chave.
De um lado, a reorientação simultânea das políticas monetárias dos
países desenvolvidos em direção à
elevação das taxas de juros. O período de dinheiro extremamente barato no mundo terminou. De outro, o
desequilíbrio de balanço de pagamentos nos Estados Unidos chegou
a um ponto insustentável. O déficit
em transações correntes representa quase 7% do PIB (Produto Interno Bruto) daquele país. E nada garante que o ajuste será suave.
Em segundo lugar, não é razoável
supor que o país esteja definitivamente blindado contra cenários adversos pelos "sólidos fundamentos
da economia brasileira". Essa expressão genérica exprime uma melhora real que ocorreu com os indicadores externos e de solvência em
razão da bonança externa e conseqüente redução da percepção de risco por parte de investidores externos. Tal fenômeno ocorreu em diferentes graus em praticamente todas
as economias emergentes.
Entretanto, os "fundamentos"
não podem ser considerados satisfatórios quando se considera a explosão de gastos correntes do governo que ocorreu nos últimos anos; e a
contenção, ou quase zeragem, do
investimento público. Some a isso o
total abandono da infra-estrutura e
a conseqüente elevação do chamado "custo Brasil".
Em terceiro lugar, a ata do Copom
continua ignorando qualquer tipo
de constrangimento ao desempenho de médio prazo do setor externo. Segundo o texto, "em relação ao
desempenho do comércio exterior,
a balança comercial continua apresentando um desempenho robusto
em 2006, corroborando avaliações
expressas em notas de reuniões anteriores do Copom acerca de mudanças estruturais importantes no
relacionamento comercial do Brasil
com o resto do mundo".
De acordo com tal entendimento,
teria havido uma mudança na taxa
de câmbio de equilíbrio da economia. O Brasil teria diversificado
produtos e mercados e aumentado
a produtividade relativamente ao
resto do mundo. Ainda segundo essa leitura otimista, residiria nesse
ponto a razão pela qual a taxa de
câmbio teria apreciado rapidamente, e não em um erro de dosagem na
elevação de taxa de juros em 2003/
04.
O problema é que não parece ser
esse o caso brasileiro. Não há evidência de aumento do número de
exportadores nem de continuidade
de diversificação de produto e de
mercados. Na realidade, a diversificação de produtos nem sequer ocorreu de forma mais pronunciada, e os
pequenos ganhos obtidos já foram
revertidos.
Mais grave ainda, as evidências indicam redução da produtividade relativamente ao resto do mundo, e
não o contrário. Isso não deveria
causar surpresa diante de tanta negligência com a infra-estrutura e a
políticas de inovação e competitividade.
Embora não tenha aproveitado
bem, o Brasil teve o melhor ambiente externo para crescer nos últimos
três anos. Mas os ventos mudaram.
É "crepúsculo de jogo", para lembrar uma vez mais o mestre Fiori.
Mas o leitor não precisa se preocupar tanto em relação à amanhã. A seleção não é obrigada a seguir o diagnóstico do Copom.
GESNER OLIVEIRA , 50, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), professor da FGV-EAESP,
presidente do Instituto Tendências de Direito e Economia e
ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
@ - gesner@fgvsp.br
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