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COMÉRCIO EXTERIOR
Para chanceler brasileiro, situação é melhor do que "bloqueio" de antes, mas ainda não é suficiente
Negociação na OMC é incógnita, diz Amorim
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LISBOA
O desfecho das negociações comerciais em andamento na OMC
(Organização Mundial do Comércio) passou de "tudo bloqueado" para uma "incógnita", na
avaliação do ministro brasileiro
das Relações Exteriores, Celso
Amorim, depois de uma viagem
de sondagem a Genebra, onde fica a sede da OMC.
"Incógnita é melhor que o bloqueio total, mas não é o suficiente", completa Amorim.
Para o Brasil, a OMC é o principal fórum de negociações comerciais, dos três em que o país está
envolvido (os outros dois são
Mercosul/ União Européia e Alca,
a Área de Livre Comércio das
Américas).
O que substituiu o "tudo bloqueado" pela incógnita foi o
anúncio de modificações na política agrícola européia. Era justamente o capítulo agrícola que emperrava totalmente as negociações na OMC -e, por extensão,
complicava as duas outras.
A incógnita, no entanto, continua dada. "A reforma anunciada
permite, mas não obriga a fazer
certas coisas, e não se sabe ao certo o que a Comissão Européia vai
querer ou poder fazer", avalia.
Por isso mesmo, o chanceler
quer marcar reuniões bilaterais
entre Mercosul e União Européia
e Mercosul e Estados Unidos, para tentar influir no jogo. "Não podemos ficar só esperando que
EUA e UE tomem suas decisões
sobre como será a negociação para depois conversar com eles."
Providência recomendada pela
memória: um entendimento entre EUA e Europa, na questão
agrícola, o chamado "acordo de
Blair House", desbloqueou a Rodada Uruguai, o ciclo anterior de
liberalização comercial, terminado em 1994. Mas desbloqueou nos
termos europeus e americanos,
contrários aos países exportadores de produtos agrícolas.
Um segundo elemento contribui para fortalecer o que o ministro chama de "incógnita": a União
Européia decidiu mudar o critério
dos subsídios a seus produtores.
Em vez de dá-los conforme a produção, será por tamanho de propriedade.
Em tese, a medida estimularia
os agricultores europeus a produzir menos. Com isso, sobraria menos para exportar, a preços subsidiados, para terceiros mercados,
abrindo espaço para a produção
brasileira e do Mercosul.
Mas ninguém sabe se, na prática, isso vai de fato ocorrer. Os encontros bilaterais com europeus e
americanos, se depender do desejo do Itamaraty, se darão daqui
até a nova reunião miniministerial da OMC, marcada para o fim
do mês em Montréal (Canadá).
As miniministeriais envolvem
pequeno número de países (25
em Montréal, mas os membros da
OMC são 145), como forma de
tentar desbloquear a negociação.
"Se desbloquear a área agrícola,
permite tentar tratar em Montréal
com mais seriedade de outros temas", avalia o ministro brasileiro.
Mas, na conversa que Amorim
teve ontem, em Genebra, com o
diretor-geral da OMC, o tailandês
Supachai Panitchpakdi, não foi
informado de grandes avanços.
Um balanço que coincide com o
de Stuart Harbinson (Hong
Kong), presidente do grupo de
negociações agrícolas da OMC.
Em informe distribuído ao Comitê de Negociações Comerciais,
que coordena todas as negociações dos diferentes temas, Harbinson diz que "ficou fora de alcance" um acordo até sobre modalidades.
"Modalidades" é, na prática,
uma pré-negociação, em que os
países-membros definem como
vão fazer a negociação propriamente dita.
Harbinson pediu "uma orientação coletiva" para poder preparar
um novo texto que sirva de base
para as negociações.
Tudo somado, a avaliação da diplomacia brasileira, conforme ouviu a Folha, é a de que Cancún, a
cidade mexicana que sediará a
próxima Conferência Ministerial,
em setembro, não será nem Seattle nem Doha.
Ou seja, nem o fracasso estrondoso de 1999, que impediu o lançamento, naquela cidade norte-americana, do que então se chamava "Rodada do Milênio", nem
o sucesso que significou a Ministerial seguinte, na capital do Qatar, em 2001.
Esta sim lançou o que passou a
ser chamado de Rodada Doha de
Desenvolvimento, com conclusão
prevista para 2005.
Sempre segundo a avaliação ouvida no Itamaraty, Cancún deve
produzir apenas o necessário para que as negociações prossigam.
Para o governo brasileiro, que
tem no sucesso de Doha o seu plano A, um resultado morno significaria pensar em um plano B? Não,
responde Amorim. Completa:
"Apenas reforçará a necessidade
de que o Plano A dê certo".
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