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São Paulo, quinta-feira, 10 de julho de 2003

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COMÉRCIO EXTERIOR

Para chanceler brasileiro, situação é melhor do que "bloqueio" de antes, mas ainda não é suficiente

Negociação na OMC é incógnita, diz Amorim

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LISBOA

O desfecho das negociações comerciais em andamento na OMC (Organização Mundial do Comércio) passou de "tudo bloqueado" para uma "incógnita", na avaliação do ministro brasileiro das Relações Exteriores, Celso Amorim, depois de uma viagem de sondagem a Genebra, onde fica a sede da OMC.
"Incógnita é melhor que o bloqueio total, mas não é o suficiente", completa Amorim.
Para o Brasil, a OMC é o principal fórum de negociações comerciais, dos três em que o país está envolvido (os outros dois são Mercosul/ União Européia e Alca, a Área de Livre Comércio das Américas).
O que substituiu o "tudo bloqueado" pela incógnita foi o anúncio de modificações na política agrícola européia. Era justamente o capítulo agrícola que emperrava totalmente as negociações na OMC -e, por extensão, complicava as duas outras.
A incógnita, no entanto, continua dada. "A reforma anunciada permite, mas não obriga a fazer certas coisas, e não se sabe ao certo o que a Comissão Européia vai querer ou poder fazer", avalia.
Por isso mesmo, o chanceler quer marcar reuniões bilaterais entre Mercosul e União Européia e Mercosul e Estados Unidos, para tentar influir no jogo. "Não podemos ficar só esperando que EUA e UE tomem suas decisões sobre como será a negociação para depois conversar com eles."
Providência recomendada pela memória: um entendimento entre EUA e Europa, na questão agrícola, o chamado "acordo de Blair House", desbloqueou a Rodada Uruguai, o ciclo anterior de liberalização comercial, terminado em 1994. Mas desbloqueou nos termos europeus e americanos, contrários aos países exportadores de produtos agrícolas.
Um segundo elemento contribui para fortalecer o que o ministro chama de "incógnita": a União Européia decidiu mudar o critério dos subsídios a seus produtores. Em vez de dá-los conforme a produção, será por tamanho de propriedade.
Em tese, a medida estimularia os agricultores europeus a produzir menos. Com isso, sobraria menos para exportar, a preços subsidiados, para terceiros mercados, abrindo espaço para a produção brasileira e do Mercosul.
Mas ninguém sabe se, na prática, isso vai de fato ocorrer. Os encontros bilaterais com europeus e americanos, se depender do desejo do Itamaraty, se darão daqui até a nova reunião miniministerial da OMC, marcada para o fim do mês em Montréal (Canadá).
As miniministeriais envolvem pequeno número de países (25 em Montréal, mas os membros da OMC são 145), como forma de tentar desbloquear a negociação.
"Se desbloquear a área agrícola, permite tentar tratar em Montréal com mais seriedade de outros temas", avalia o ministro brasileiro.
Mas, na conversa que Amorim teve ontem, em Genebra, com o diretor-geral da OMC, o tailandês Supachai Panitchpakdi, não foi informado de grandes avanços.
Um balanço que coincide com o de Stuart Harbinson (Hong Kong), presidente do grupo de negociações agrícolas da OMC.
Em informe distribuído ao Comitê de Negociações Comerciais, que coordena todas as negociações dos diferentes temas, Harbinson diz que "ficou fora de alcance" um acordo até sobre modalidades.
"Modalidades" é, na prática, uma pré-negociação, em que os países-membros definem como vão fazer a negociação propriamente dita.
Harbinson pediu "uma orientação coletiva" para poder preparar um novo texto que sirva de base para as negociações.
Tudo somado, a avaliação da diplomacia brasileira, conforme ouviu a Folha, é a de que Cancún, a cidade mexicana que sediará a próxima Conferência Ministerial, em setembro, não será nem Seattle nem Doha.
Ou seja, nem o fracasso estrondoso de 1999, que impediu o lançamento, naquela cidade norte-americana, do que então se chamava "Rodada do Milênio", nem o sucesso que significou a Ministerial seguinte, na capital do Qatar, em 2001.
Esta sim lançou o que passou a ser chamado de Rodada Doha de Desenvolvimento, com conclusão prevista para 2005.
Sempre segundo a avaliação ouvida no Itamaraty, Cancún deve produzir apenas o necessário para que as negociações prossigam.
Para o governo brasileiro, que tem no sucesso de Doha o seu plano A, um resultado morno significaria pensar em um plano B? Não, responde Amorim. Completa: "Apenas reforçará a necessidade de que o Plano A dê certo".


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