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São Paulo, quarta-feira, 10 de setembro de 2003

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VIZINHO EM CRISE

Governo e Fundo divergem sobre novo acordo; país deixa de honrar parcela de US$ 2,9 bi com a entidade

Argentina entra em moratória com o FMI

Folha Imagem
Manifestantes argentinos protestam contra acordo com o FMI, em Buenos Aires


ELAINE COTTA
DE BUENOS AIRES

O governo argentino não pagou a parcela de US$ 2,9 bilhões de uma dívida que vencia ontem com o Fundo Monetário Internacional e entrou tecnicamente em moratória com o organismo.
Pelo valor, essa é a maior moratória já enfrentada pelo FMI. Apesar de a Argentina ter interrompido o pagamento de seus débitos com credores privados, no ano passado, é a primeira vez que o país entra em "default" com o Fundo. Mas, pelas cláusulas do contrato assinado, o país ainda tem um prazo de 30 dias para regularizar a situação antes de sofrer sanções. Se o país acertar a situação dentro dessa data, não haverá consequências mais graves.
Em comunicado divulgado ontem à noite e assinado pela chefia de Gabinete argentino, o governo diz que preferiu não comprometer as reservas do país e suspendeu o pagamento ao Fundo.
A Argentina tem em suas reservas internacionais US$ 13,6 bilhões. Desde o início da semana, o chefe-de-gabinete argentino, Alberto Fernandez, afirmava que o governo não pretendia "sacar reservas para pagar o Fundo".
Ontem, após uma reunião com Fernandez, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Camaño, e o líder do governo no Senado, Miguel Angel Pichetto, divulgaram uma nota dizendo que "apoiavam a decisão do governo de não pagar" o FMI.
Os US$ 2,9 bilhões que não foram devolvidos referem-se a uma parcela de um acordo firmado em 2001, no valor de US$ 8 bilhões, que deveria ter sido paga (mas não foi) em agosto do ano passado. Um mês depois, a Argentina renegociou com o Fundo, e o vencimento passou para este mês. As regras do FMI impedem uma segunda renegociação.
O governo argentino esperava a liberação de um novo empréstimo do próprio Fundo para honrar o compromisso. A intenção era fechar um pacote de ajuda com duração de três anos (o último acabou em 31 de agosto).
O governo argentino e o FMI discutem esse novo acordo há mais de um mês. Mas há relutância do país em acertar diversos pontos do programa a que teria que se submeter para receber mais dinheiro. Entre os entraves estão a meta do superávit primário e o reajuste de tarifas públicas.
No documento de ontem, o governo disse que busca um acordo que não aumente a pobreza, que assegure o crescimento econômico e a oferta de emprego. A moratória técnica desafia o Fundo e o coloca em uma posição delicada. À Folha, um membro do FMI disse que a Argentina não pode ter tratamento diferenciado dos outros membros.
Pesquisa realizada por uma consultoria em Buenos Aires mostra que 70% dos entrevistados não concordavam com a possibilidade de o governo sacar as reservas para pagar o Fundo.
Segundo analistas no país, a decisão de não pagar é uma "estratégia política" do governo, que no próximo final de semana enfrenta eleições na Província de Buenos Aires e na capital federal. Para a prefeitura de Buenos Aires concorrem Anibal Ibarra (apoiado por Kirchner) e Mauricio Macri.
Se a Argentina não honrar o compromisso em 30 dias, fará parte de uma "lista negra" do Fundo, hoje formada por seis países: Iraque, Afeganistão, Sudão, Congo, Libéria e Zimbábue.
A entrada na lista tira do país o direito de solicitar qualquer tipo de ajuda do FMI. Fica também proibido de sacar recursos já foram negociados no passado com outras instituições, como o Banco Mundial ou o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento).


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