|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO ECONÔMICA
Persistência é virtude, teimosias são doenças
BENJAMIN STEINBRUCH
Quando sobreveio o primeiro choque do petróleo,
em 1973, o Brasil voava em céu de
brigadeiro. Quem tem mais de 40
anos se lembra bem. A economia
brasileira apresentava o maior
ritmo de crescimento de que se
tem notícia na história do país, de
quase 14% ao ano, enquanto a
economia mundial crescia 7%.
Nesse clima, deu-se por aqui
pouca atenção à elevação brutal e
abrupta nos preços do petróleo, de
US$ 2,90 para quase US$ 12 o barril. Enquanto os demais países tomavam medidas para reduzir os
gastos com combustíveis, até mesmo impondo racionamentos, o
Brasil continuava aumentando o
consumo em torno de 6% ao ano.
Vigorava, então, a teimosa teoria de que a crise seria passageira
e de que o Brasil seria uma "ilha
de tranqüilidade", impossível de
ser atingida por choques externos.
Para manter o consumo de petróleo, que era 78% importado, gastava-se US$ 23 bilhões (em valores de hoje) por ano. E, por aí, o
país se endividou.
Teimosias em geral custam caro. A dos anos 70 custou uma crise
de balanço de pagamentos e uma
década perdida. Outras mais recentes igualmente mostram que
fórmulas mantidas por muito
tempo, contra a opinião geral,
acabam mal. Já teimamos em
combater a inflação com terapias
heterodoxas que nos levaram à
hiperinflação, com devastadores
efeitos sociais. Já teimamos com o
câmbio fixo e com outras traquitanas do gênero. No governo Fernando Henrique Cardoso, o dólar
foi corretamente usado para controlar a inflação no início do Plano Real, mas continuou como âncora durante longos anos, a despeito das críticas gerais. O real
forte prejudicou exportações, favoreceu importações e elevou o
déficit comercial. Resultado: o
país acumulou um déficit de US$
186 bilhões em suas transações
com o exterior durante os oito
anos do governo FHC. Uma conta
que o país paga agora.
Cito esses casos para observar
que estão no ar, hoje, duas teimosias que ameaçam o atual vôo de
brigadeiro da economia brasileira. De fato, o país terminou 2004
em situação bastante confortável.
Superávit comercial de US$ 33,7
bilhões, superávit em conta corrente de US$ 10 bilhões (até novembro), superávit fiscal, inflação
baixa e crescimento econômico de
5%.
A primeira teimosia que está no
ar é a do dólar. O Banco Central
está novamente cedendo à tentação de usar o câmbio para segurar a inflação. Não há como sustentar as exportações no nível
atual se persistir a teimosa indiferença em relação à valorização
do real, que mantém a taxa de
câmbio em torno de R$ 2,70.
Setores exportadores já perderam rentabilidade por conta dessa taxa e cabe ao Banco Central a
responsabilidade de intervir mais
firmemente no mercado para elevá-la pelo menos para a faixa de
R$ 3,00. Variadas experiências
históricas, principalmente de países asiáticos, mostram o extraordinário efeito do câmbio desvalorizado para anabolizar exportações e gerar emprego e renda.
A segunda teimosia é a dos juros. É quase consensual a idéia de
que as taxas de juros reais praticadas no Brasil nos últimos quinze anos são exageradas. Uma
aberração desnecessária tendo
em vista seu objetivo de segurar a
inflação, que hoje decorre menos
da demanda e mais de ajustes de
preços administrados pelo próprio governo.
Além de impedir os investimentos, as taxas elevadas atraem capitais voláteis e, por tabela, valorizam o real e prejudicam a balança de comércio. Mais grave: os
juros exorbitantes fazem estragos
nas contas públicas, porque aumentam as despesas financeiras e
a dívida interna. Persistência é
virtude, teimosias são doenças.
Benjamin Steinbruch, 50, empresário,
é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional e presidente do conselho de administração da empresa.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
Texto Anterior: Receita com serviços repõe as perdas Próximo Texto: Tributação: MP dificulta contestações ao fisco Índice
|