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LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA
Crise bancária e regulação
A crise é global, e isso fica claro
quando vemos Bolsas de países
não diretamente ameaçados
pela crise refletirem as dos EUA
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GEORGE SOROS afirmou que
esta é a pior crise financeira
desde a de 1929, e provavelmente ele está correto. Na semana
seguinte àquela em que ela rompeu,
eu escrevi nesta coluna que não era
apenas uma crise do mercado de títulos imobiliários americano, mas
uma crise financeira que atingia toda a economia dos Estados Unidos
porque sua causa subjacente era o
desequilíbrio elevado e prolongado
da conta corrente que reduzia a
confiança do mercado no dólar. Segundo, que, no plano bancário, ela
decorria de uma especulação sem
limite baseada em uma variedade
de "inovações" financeiras que não
estavam sendo devidamente reguladas e fiscalizadas. Nestas últimas
semanas, na medida em que a crise
se aprofundava e era coroada pelo
desastre no Société Générale, o presidente francês e o primeiro-ministro britânico cobraram maior regulação dos mercados financeiros, ao
mesmo em tempo que se voltava a
falar na necessidade de regulação
global das atividades financeiras.
De fato, essa crise é global, e isso
fica muito claro quando vemos os
preços das ações de Bolsas cujos
países não estão diretamente
ameaçados pela crise, como é o caso
da Bovespa, refletirem diretamente
as flutuações nas Bolsas americanas. Além disso, a crise assinala a
inerente irracionalidade dos mercados financeiros, que não se comportam como prevê a teoria econômica ortodoxa, baseada em "expectativas racionais", e, portanto, precisam de regulação.
Mas o que fazer diante da crise?
Reformar toda a "arquitetura financeira" mundial, como se tornou
corrente no final dos anos 1990?
Ainda que a globalização esteja impondo a criação de instituições globais em todos os setores, desde o
aquecimento global, até o combate
do crime organizado, não faz sentido esperar no curto prazo por uma
grande mudança da estrutura financeira do mundo. A grande mudança seria a da criação de uma
moeda internacional em substituição às moedas-reserva nacionais,
mas a perda de credibilidade no dólar não é ainda suficiente para levar
os Estados Unidos a admitirem sequer discutir esse problema. Mais
realista será a criação de uma agência internacional dentro do sistema
das Nações Unidas voltada para iniciar gradualmente essa maior regulação. Essa agência não pode ser o
FMI (Fundo Monetário Internacional) porque sua estrutura acionária lhe rouba credibilidade.
Por outro lado, os governos nacionais deverão aumentar os seus
controles sobre as organizações financeiras, tanto no sentido de ampliar a abrangência e a profundidade da fiscalização quanto no de exigir maior padronização e transparência de suas contas.
A alternativa neoliberal de nada
fazer porque "os agentes financeiros
aprenderão com essa crise como
aprenderam com as crises dos anos
1990" não faz sentido. Primeiro porque o aprendizado, então, não foi
dos agentes financeiros, mas dos governos dos países em desenvolvimento que desvalorizaram suas
moedas, passaram a realizar superávits em conta corrente e aumentar
suas reservas. Segundo porque
aquelas foram crises de balanço de
pagamentos decorrentes da política
de crescimento com poupança externa, enquanto a atual é uma crise
bancária causada pela especulação,
só podendo ser prevenida por maior
regulação.
LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA , 73, professor emérito
da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda, da
Reforma do Estado e da Ciência e Tecnologia, é autor de
"Macroeconomia da Estagnação: Crítica da Ortodoxia Convencional no Brasil pós-1994".
Internet: www.bresserpereira.org.br
lcbresser@uol.com.br
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