São Paulo, quarta-feira, 11 de junho de 2008

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VINICIUS TORRES FREIRE

Um PIB de três pês


Economia parece chegar ao pico do ciclo de alta e deve se desacelerar; dados indicam excesso de gasto público

PREVISÍVEL , positivo e no pico são os PPPs do PIB do primeiro trimestre. Apesar de bom, o crescimento parece ter chegado a um pico momentâneo. O melhor já passou, até que (ou se) ocorra uma retomada do ciclo de aceleração da economia, o que depende de inovações institucionais e/ou de política econômica. Ou de uma nova rodada de bênçãos divinas, as quais faz algum tempo rimam com China.
Do final de 2007 para o começo deste ano, houve uma desaceleração razoável do consumo privado ("consumo das famílias") e do investimento. Como as taxas de juros estão subindo, a economia mundial tropeça e, daqui para diante, o crescimento será medido em relação a uma base de comparação alta, é razoável considerar que a evolução do PIB, no atual ciclo, chegou a um pico e tende a se desacelerar (embora continue a crescer, atenção).
O que os economistas chamam de "absorção doméstica" (soma de consumo privado e do governo e investimentos) desacelerou-se (de alta de 2,6% no final de 2007 para 1,4% no início de 2008). O gasto do governo, porém, cresceu bem e até de modo inesperado. O dado pode soar contraditório de várias maneiras, dados a falação sobre a "gastança do governo" e o balanço das contas públicas do início do ano, quando o setor público teve superávit. Mas os números do gasto do governo no PIB não equivalem ao total da despesa no balanço das contas públicas (são descontados alguns itens). Ainda assim, o aumento pareceu forte demais. De qualquer modo, no acumulado de quatro trimestres, o gasto do governo (pela conta do PIB) vem crescendo desde o início de 2006.
As despesas de consumo privado e de governo, somadas, ficaram em 80,5% do PIB no primeiro trimestre. Desde a normalização econômica do governo Lula, a partir do início de 2004, tal soma flutua pouco em torno disso. Nesse período, o investimento subiu de 15,3% para 18% do PIB, o que ainda é muito pouco, mas é um progresso notável e o melhor resultado em pelo menos 13 anos. Mas tanto gasto das "famílias", do governo e de investimento não "caberiam" no PIB se a economia continuasse a ter o saldo externo de 2004-2007. Numa conta simples, mas nem por isso incorreta, é possível perceber que a soma de gasto privado, público e investimento está quase batendo em 100% do PIB.
O excesso tinha de ser compensado em outro lugar. Isto é, cai o saldo das contas externas (o país exporta menos bens e serviços, importa mais, a fim de atender a demanda doméstica), o que já se tinha percebido pelos dados da balança comercial e pelo déficit em conta corrente.
A fim de que não se reduza o consumo privado nem o investimento e, ao mesmo tempo, tenhamos um déficit em conta corrente administrável e taxas de juros menos indecentes, é preciso não apenas controlar o crescimento do gasto do governo como mudar sua composição (aumentar a fatia do investimento). Não é a solução mágica dos problemas do país, mas é o mínimo a fazer -e o mais simples. Incentivar a economia a incorporar setores produtivos da ponta tecnológica e da produtividade, a ser mais inovadora ou melhorar a qualidade da educação (da básica à superior) são coisas muitíssimo mais complicadas.

vinit@uol.com.br


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