São Paulo, sábado, 11 de julho de 2009

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G14 entra em cena nas cúpulas globais

Representantes dos países mais ricos concluem que G8 não é "idôneo" e que diálogo ampliado com emergentes passa a ser "parceria estável"

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A ÁQUILA

A anunciada morte do G8 acabou sendo sacramentada ontem pelo país que é o presidente de turno do grupo, a Itália, ao mesmo tempo em que se emitia o atestado de nascimento do sucessor, um certo G14, que, no entanto, é apenas uma etapa rumo ao que um centro de estudos norte-americano prefere chamar de Gx.
O G8 (Estados Unidos, Japão, Alemanha, França, Reino Unido, Itália, Canadá e Rússia) não é idôneo, decretou Silvio Berlusconi, o premiê italiano. Nada que outros líderes de países-membros, como a alemã Angela Merkel e a ministra francesa da Economia, Christine Lagarde, já não tivessem dito antes.
Como se esperava pouco ou nada da cúpula do G8 de Áquila, o atestado de óbito acaba sendo significativo porque começa a mudar a governança global.
Muda para G14 (o G8 mais Brasil, Índia, China, África do Sul, México e Egito, incluído neste ano no grupo chamado G5, a convite da Itália. Uma vez dentro, ninguém mais tira, o que eleva o número do novo G para 14).
O resumo das cúpulas, emitido pelo presidente, Silvio Berlusconi, é embrulhado na sempre nebulosa linguagem diplomática. Não fala em G14, mas diz que o diálogo com o G5, agora ampliado ao Egito, iniciado em 2007, muda agora "para uma moldura de parceria estável e estruturada".
Trocando em miúdos: os 14 vão ter um processo de reuniões setoriais prévias à sua cúpula anual, tal como ocorreu até agora com o G8.
Ambiciosa missão da nova diretoria informal do planeta, sempre de acordo com o resumo do presidente: "Contribuir para fortalecer a governança global e conjuntamente moldar o futuro".
O presidente Barack Obama, que, apesar das turbulências nos Estados Unidos, continua sendo o número 1 de qualquer G, explicou assim a necessidade de ampliar as fronteiras da gerência global além do clubinho restrito do G8: "Nenhuma nação pode enfrentar os desafios sozinha".
E passou a listar os tremendos desafios à frente: "A ameaça de mudança climática não pode ser contida por fronteiras em uma mapa, e o roubo de materiais nucleares mal controlados poderia levar ao extermínio de qualquer cidade na Terra. Ações descuidadas de uns poucos serviram de combustível para uma recessão que abrangeu o globo, e o aumento dos preços dos alimentos significa que 100 milhões de nossas cidadãos cairão em desesperada pobreza".
Mas Obama também disse que é um "momento de transição" no sistema de governança global, o que parece dar razão a um estudo da Fundação Stanley (EUA) que defende um mecanismo que chama de Gx. "Queremos que o Gx inclua mais das novas nações poderosas do mundo, particularmente aquelas que não têm voz no Conselho de Segurança da ONU ou no atual G8."
Obama, aliás, concorda com um papel mais forte para a ONU. "Dou um forte respaldo à ONU, mas ela tem que ser reformada e revitalizada. (...)Ter continentes inteiros como a África e a América Latina sem representação adequada nesses grandes fóruns internacionais e corpos decisórios não vai funcionar".
Música para os ouvidos do Brasil.
"Não podemos ter a pretensão de que [os vários Gês] substituam os foros globais e democráticos. É fundamental a participação da ONU", diz o chanceler Celso Amorim.
Mas, enquanto não se reforma a ONU, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva é bastante franco: "Se eu tivesse que escolher entre o G14 e o G20, ficaria com o G20, que tem mais representatividade".
O G20, até agora, focou apenas a crise econômica, tanto que Lula acha que é preciso "valorizar o grupo, pelo menos até que toda a discussão [sobre a crise] esteja encerrada".
Mas em Áquila deu-se um passo para introduzir no G20 também o componente político-estratégico: o prazo para que o Irã aceite renunciar ao uso militar da energia nuclear vai até a cúpula do G20 em setembro.
"Nós avaliaremos a situação no encontro de setembro", antecipa Obama.
O Brasil demonstra consciência de seu novo papel na gerência informal planetária: o presidente Lula disse ontem que gostaria de convencer seu colega iraniano Mahmoud Ahmadinejad de que deve fazer "como faz o Brasil", ou seja, usar a energia nuclear apenas para fins pacíficos.
Mas, com tantos gês e tantas cúpulas, bateu uma certa fadiga, a ponto de Obama ter dito que, em seus "apenas seis meses no cargo, houve uma porção delas. Temos que ter menos cúpulas e torná-las mais efetivas".


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