São Paulo, sábado, 11 de julho de 2009

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OPINIÃO

A armadilha que Obama precisa enfrentar

PAUL KRUGMAN
DO "NEW YORK TIMES"

TÃO LOGO a equipe de transição do governo Obama anunciou seu plano de estímulo -ainda antes da posse-, houve quem alertasse sobre a possibilidade de que o plano fosse insuficiente: nos preocupávamos também com que, em termos políticos, fosse difícil retornar para uma segunda rodada.
Infelizmente, surgiram provas de que essas preocupações eram pertinentes. Os números desfavoráveis do emprego em junho deixaram claro que as medidas de estímulo foram insuficientes. Também prejudicaram a credibilidade do governo no que tange à gestão da economia. Agora, há risco real de que o presidente Obama se veja apanhado em uma armadilha.
Comentarei sobre como é possível escapar dela, mais adiante. Mas primeiro permitam-me questionar de que maneira os cidadãos deveriam reagir às notícias decepcionantes. Deveríamos ser pacientes e dar tempo para que o plano de Obama funcione? Apelar por ações mais audaciosas? Ou decretar o fracasso das medidas e exigir que o governo cancele tudo?
Antes que você responda, considere aquilo que aconteceria em um período normal. Quando surge uma recessão do tipo mais ameno, o trabalho de combatê-la é atribuído ao Federal Reserve (o banco central dos EUA). O Fed reage por meio de cortes graduais nas taxas de juros. Reduzindo os juros um pouquinho de cada vez, a instituição continua cortando até que a situação da economia se reverta. Ocasionalmente, ela faz uma pausa para avaliar os resultados de suas ações; caso a economia continue fraca, os cortes são retomados.
Na recessão precedente, o Fed cortou as taxas de juros repetidamente enquanto a queda se prolongava -11 vezes em 2001. Então, em meio aos primeiros sinais de recuperação, fez uma pausa, para dar tempo para que os cortes funcionassem. Quando se tornou claro que a economia ainda não estava crescendo em ritmo rápido o suficiente para gerar empregos, novos cortes foram realizados.
Normalmente, portanto, nós esperamos que as autoridades respondam a dados desfavoráveis sobre o desemprego com uma combinação de determinação e paciência. Elas precisam dar tempo para que as medidas funcionem, mas também considerar se devem adotar providências mais vigorosas.
E é isso que o governo Obama deveria estar fazendo diante do seu pacote de estímulo fiscal (é importante lembrar que o estímulo era necessário porque o Fed, tendo cortado os juros até quase zero, estava sem munição para combater a crise). As autoridades devem manter a calma, reconhecendo que o plano requererá tempo. Mas também deveriam estar preparadas para ampliar o estímulo agora que está claro que a primeira rodada foi insuficiente.

Aspectos políticos
Infelizmente, o aspecto político da estratégia fiscal é muito diferente do aspecto político da questão monetária. Nos últimos 30 anos, fomos informados de que gastos públicos são malévolos, e a oposição dos conservadores a medidas de estímulo fiscal (que poderiam levar as pessoas a pensar melhor do governo) vem sendo amarga e incansável mesmo diante da pior crise desde a Grande Depressão. Previsivelmente, os republicanos, e até alguns democratas, tratam as más notícias como prova de fracasso, e não como motivos para adotar medidas ainda mais fortes.
Daí o perigo de que o governo Obama se veja preso em uma armadilha, na qual a própria debilidade da economia solaparia a capacidade do governo para responder de forma efetiva. É perfeitamente lícito que o governo defenda as medidas que tomou até agora. É bom ter o vice-presidente Joseph Biden em viagem pelo país para destacar o bem que as medidas de estímulo estão propiciando. Também é razoável que os economistas do governo apelem por paciência e apontem, corretamente, que o estímulo jamais deveria exercer seu pleno impacto neste trimestre, ou mesmo neste ano.
Mas há uma diferença entre defender o que foi realizado e ficar na defensiva. Foi perturbador que Obama tenha retratado a admissão, por Biden, de que o governo havia "interpretado erroneamente" a economia, declarando que "não teríamos feito nada de diferente". A declaração tinha algo do complexo de infalibilidade da era Bush, um indício de que o atual governo talvez compartilhe em alguma medida da incapacidade para admitir erros. E essa é uma atitude que nem Obama nem o país podem admitir.
O que Obama precisa fazer é ser franco. Precisa reconhecer que talvez não tenha feito o bastante. Argumentar que tenta conduzir o país por uma tempestade e que certas mudanças de curso -entre as quais uma segunda rodada de estímulo- podem ser necessárias.
O que ele precisa é fazer pela economia o que já fez pelas relações raciais e pela política externa -falar aos norte-americanos como adultos.

Tradução de PAULO MIGLIACCI



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