São Paulo, terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

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BENJAMIN STEINBRUCH

Saber o que não fazer


Em situações de risco como a atual, tão importante quanto pensar no que "fazer" é saber o que "não fazer"

COMO COSTUMAM dizer os brasileiros, o ano só começa depois do Carnaval. Então, 2008 começou cedo, ainda na primeira semana de fevereiro, o que não ocorria desde 1913. Será um ano de muito trabalho. Além de bissexto, com um dia a mais em fevereiro, 2008 terá quatro feriados em fins de semana. Haverá 254 dias úteis, um recorde para a década.
A despeito disso, o ano efetivamente se inicia sob ameaça de desaquecimento econômico. Janeiro até foi um bom mês: os principais setores industriais mantiveram o ritmo de crescimento, a produção de automóveis aumentou 24% sobre janeiro do ano passado e o comércio varejista faturou bem. Mas, infelizmente, não é esse o ritmo esperado para o ano todo. Em 2007, a economia começou morna e se aqueceu no segundo semestre. Agora, prevê-se que 2008, tendo começado aquecido, vai esfriar a partir de julho, por conta do contágio da crise americana, cada vez mais desenhada.
Em situações como essa, o administrador eficiente tende a se preocupar em definir o que fazer para prevenir-se contra a crise. Na atual conjuntura, porém, como o Brasil tem sido mestre em tomar medidas na contramão da tendência mundial, seria interessante elaborar um pouco sobre o que não fazer.
Neste ano perigoso, para não aumentar seu risco, o Brasil não deve cair na tentação de, movido pelo susto, acirrar o conservadorismo.
Essa é uma recomendação óbvia e básica. Até o FMI (Fundo Monetário Internacional), templo da ortodoxia, já bateu nessa tecla. O diretor-gerente, Dominique Strauss-Kahn, sugeriu ao Primeiro Mundo e aos países emergentes que adotem políticas fiscais expansionistas, com aumento de gastos públicos e reduções de impostos, uma receita keynesiana pouco comum na história do Fundo. A sugestão, portanto, é para que os governo tomem medidas que os economistas chamam de anticíclicas, para estimular a demanda e compensar a tendência natural de contração econômica.
O aumento dos juros básicos, por exemplo, idéia que já ronda as cabeças monetaristas do país, é inadmissível e desnecessário no momento. O corte de investimentos públicos, com o objetivo de manter o superávit fiscal em níveis exageradamente elevados, deve ser combatido.
O crédito, que segue trajetória de crescimento e passou de 30,7% do PIB em 2006 para 34,7% em 2007, foi o principal motor da recuperação da economia no ano passado. Não pode ser desestimulado. O Banco Central, na contramão, já tomou uma medida nesse sentido ao estabelecer depósito compulsório de 40% sobre os recursos captados para as operações de leasing dos bancos. O BNDES, que em 2007 aumentou seus desembolsos em 24%, para R$ 64,9 bilhões, não pode deixar cair a oferta de recursos, porque tem a missão incentivar investimentos.
Também não deve passar pela cabeça do governo a idéia de elevar impostos, como fez no início do ano para compensar as perdas decorrentes do fim da CPMF. Os R$ 20 bilhões perdidos pelo Tesouro são recursos ganhos pela economia para manter seu ritmo neste ano de perigo.
O esforço sincero para cortar gastos supérfluos e compensar a CPMF perdida não pode levar à redução dos dispêndios na área social. Programas como o Bolsa Família e orçamentos de saúde e educação, por exemplo, são intocáveis. E gastos eleitoreiros com vistas ao pleito municipal, inaceitáveis.
Para resumir, em situações de risco como a atual, tão importante quanto pensar no que "fazer" é saber o que "não fazer".


BENJAMIN STEINBRUCH , 54, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


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