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Fiesp pressiona bancos para liberar crédito
Paulo Skaf diz que setor bancário não pode "dormir" sobre recursos do compulsório e que paralisia de financiamentos ameaça projetos
Apesar de elogiar o BC na liberação do compulsório, ele diz que juro alto incentivou empresas a buscar operações de alto risco com câmbio
GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA
Nos últimos dias, o presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Paulo Skaf, tem conversado
quase que diariamente com
Henrique Meirelles (Banco
Central). O objetivo é acompanhar a situação do crédito no
país, uma das grandes preocupações da indústria.
Desde que paralisou o crédito no Brasil, em razão da crise
financeira global, a indústria,
segundo Skaf, passou a "repensar" (ele evita a palavra adiar)
seus planos de novos investimentos. O presidente da Fiesp
diz que a normalização do crédito é fundamental para a retomada dos projetos.
Para Skaf, o BC tem adotado
medidas corretas para incentivar a retomada do crédito, ao
flexibilizar o compulsório. A
responsabilidade agora é dos
bancos.
"Será uma enorme irresponsabilidade dos bancos se eles
dormirem em cima desse dinheiro do compulsório", diz.
Apesar do elogio, Skaf não
deixa de criticar o Banco Central pelos juros altos. Foram as
taxas elevadas, a seu ver, que levaram muitas empresas a fazer
apostas de alto risco no mercado de derivativos de dólar. As
empresas acreditaram que o
dólar iria continuar desvalorizado por muito mais tempo.
"O Banco Central que eu critico é o dos juros altos."
FOLHA - A crise econômica já desembarcou na indústria?
PAULO SKAF - É inconteste que
há uma gravíssima crise mundial. É inconteste que esse problema no sistema financeiro,
que começou nos Estados Unidos, já contaminou outras partes do mundo. É inconteste,
também, que, ao longo desta última década, muitos países se
alavancaram muito, com crescimentos de 8%, 9% ao ano. Só
que essa não foi a realidade do
Brasil. Nós tivemos um custo
ao longo desses últimos anos, o
de termos juros altos, o custo
de termos pouco crédito. Enquanto outros países tinham
100% de crédito sobre o PIB, o
nosso era de 25% sobre o PIB. A
realidade do Brasil é outra. Por
isso, o Brasil ainda não sentiu a
crise na mesma intensidade de
outros países. Até a semana
passada, a indústria continua
apresentando um bom desempenho. O mês de setembro inclusive foi muito positivo. O
que posso dizer é que a situação
das empresas e do sistema financeiro, pelo menos até a semana passada, era normal. O
Brasil construiu uma casa de tijolo e não de palha.
FOLHA - Mas a crise já mostrou a
cara no Brasil.
SKAF - Sim, era inevitável, até
porque o sistema financeiro é
todo interligado. Nós já começamos a sentir a crise, mas não
na demanda. Nesses últimos 15
dias, o problema não foi de queda de demanda, mas de redução
do crédito. É evidente que essa
queda do crédito, que já foi sentida, se não forem tomadas providências, pode provocar um
travamento na economia.
FOLHA - Mas as empresas já estão
cancelando investimentos.
SKAF - Com essa queda do crédito, os juros mais elevados e o
encurtamento dos prazos de financiamento, tudo isso provocou um susto na indústria. Esse
susto faz com que todo mundo
repense seus planos. Quem tem
um novo projeto, uma ampliação, vai aguardar um pouco os
acontecimentos. Já os investimentos em andamento continuam evoluindo, pelo menos
até o presente momento. É um
momento de indefinição. O que
aconteceu nas últimas semanas
foi um travamento do crédito.
O Banco Central tem ferramentas para corrigir esse problema.
FOLHA - O Banco Central está
usando as ferramentas corretas?
SKAF - O Banco Central agiu,
sim, corretamente ao liberar
parte do compulsório tanto para ajudar os bancos de pequeno
porte como também para irrigar o crédito. O que não pode
acontecer é o setor financeiro
dormir em cima desses recursos e não repassá-los para o
mercado. Seria uma irresponsabilidade muito grande dos
bancos. Mas nós estamos
acompanhando. Nos últimos
dez dias, tenho tido diariamente contato com o presidente do
Banco Central (Henrique Meirelles). Você sabe que eu não
sou um tradicional admirador
do Banco Central. Sou, aliás,
um crítico, principalmente,
dessa política de juros muito
elevados, mas, neste momento,
o Banco Central está tomando
medidas certeiras.
FOLHA - E se os bancos não reativarem o crédito?
SKAF - Nós vamos pressionar,
mas, se isso não acontecer, o
governo pode tomar providências. Os bancos oficiais, o Banco
do Brasil e a Caixa Econômica
Federal, terão a obrigação
maior, nesse momento, de
atender o mercado. Creio que
haverá sensibilidade por parte
do sistema financeiro. Os bancos não não vão deixar esse travamento do crédito continuar.
FOLHA - As medidas do BC são suficientes para corrigir o problema da
restrição do crédito?
SKAF - Ninguém conhece o tamanho do problema. Por isso,
não dá para dizer se são ou não
suficientes. O que se tem que
ter é a disposição para tomar as
medidas necessárias.
FOLHA - Como o sr. analisa essas
perdas das empresas por investimentos de alto risco em derivativos
de câmbio?
SKAF - Normalmente, empresas que operam assim não são
pequenas nem médias. São de
maior porte, mas é muito difícil
ter uma avaliação mais clara de
quais e quantas foram as que fizeram isso. Só saberemos ao
longo dos próximos dias ou semanas. O reflexo disso é a pressão sobre o dólar, que tende a
acabar quando as empresas fecharem suas posições. Neste
momento, o dólar tenderá a
cair.
FOLHA - As empresas não se arriscaram demais?
SKAF - Se houve uma operação
de risco? Operação de risco a
empresa é que fez. Ela tem uma
possibilidade de ganho ou de
perda e, possivelmente, em outros momentos, pode ter tido
ganhos. Agora, está perdendo.
FOLHA - Mas o dólar a R$ 2,30 pode
ter conseqüências graves para toda
a economia.
SKAF - Espera um pouco. Ninguém tem uma bola de cristal
para saber como ficará o dólar
nos próximos seis meses. Até
poucas semanas atrás, o dólar a
R$ 1,60 apavorava todo o mercado. Todo mundo dizia que o
real estava sobrevalorizado e
traria prejuízo à competitividade brasileira. Mas, agora, neste
momento de poeira no ar, não
se pode fazer uma análise detalhada. Tem que esperar a poeira baixar. Com US$ 207 bilhões
em reservas, o Banco Central
tem condições de enfrentar esse jogo. Assim como o dólar pode subir, também pode cair.
FOLHA - O que levou as empresas a
realizarem essas operações?
SKAF - Esse é o tipo da pergunta que tem que ser feita individualmente à empresa. Talvez
as empresas não acreditassem
numa desvalorização do real
tão cedo. Talvez também por
estarem perdendo no câmbio
valorizado e confiando na sobrevalorização do real por mais
tempo, tentaram gerar algum
ganho paralelo.
FOLHA - O sr. acha que elas acreditaram também que os juros altos
iriam manter o dólar baixo por muito tempo?
SKAF - Sim, acreditaram muito
nos juros altos. Algumas pessoas ou algumas empresas
apostaram que essa desvalorização do real não aconteceria.
Sem dúvida, isso pode ter sido
um fator.
FOLHA - O Banco Central então
tem sua parcela de culpa?
SKAF - Veja bem, vamos separar. O Banco Central que eu critico é o dos juros altos. Os últimos aumentos do Copom, por
exemplo, foram errados. Nós
tínhamos uma inflação provocada por aumentos de preços
agrícolas, tanto é que, quando
os preços das commodities
agrícolas baixaram, a inflação
baixou, e, mesmo assim, o Banco Central subiu os juros. Subir
juros no Brasil é só aumentar
gasto público.
FOLHA - Se o Banco Central baixar
os juros, isso não pode complicar
ainda mais a situação dessas empresas?
SKAF - O Copom tem três semanas, muitos dias pela frente.
Nada como um dia atrás do outro. Até lá tem que matar um
leão por dia. Num momento como esse, o Banco Central tem
que baixar os juros.
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