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Aperto no crédito desafia crescimento da Índia
MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A NOVA DÉLHI
A resistência que a Índia vem
demonstrando ao contágio da
crise financeira mundial tem
pelo menos um ponto fraco.
Com o aperto no crédito, projetos de infra-estrutura começaram a sofrer atrasos, ameaçando o acelerado ritmo de crescimento que transformou o país
em um imenso canteiro de
obras nos últimos anos.
Segundo cálculos do governo, o país precisa investir perto
de US$ 500 bilhões até 2012 para melhorar estradas, portos,
ferrovias e a capacidade de geração de energia se quiser manter o crescimento anual acima
dos 8% que registra desde
2005. Mas a escassez de liquidez colocou essa meta em risco.
"Entre 15% e 20% dos projetos estão atrasados", diz Pronab Sen, do departamento de
estatísticas do governo. Os problemas mais graves são a precariedade das estradas e a geração
de energia, à qual apenas 40%
da população tem acesso.
O zumbido dos geradores é
um som familiar, mesmo em
grandes cidades como Délhi e
Mumbai. É uma demonstração
da frágil estrutura que sustenta
os impressionantes índices de
crescimento do país.
Embora o governo insista em
dizer que a turbulência global
só afetou o mercado financeiro,
a expansão da economia pode
perder o fôlego se o investimento em infra-estrutura for
reduzido significativamente.
Uma redução já é prevista para
algo em torno de 7,5% a 8%
neste ano, contra 9% em 2007.
"O investimento em infra-estrutura está atualmente em 5%
do PIB, mas pode cair se a crise
de liquidez piorar", diz o economista Sharwan Nigam, do Conselho Indiano de Pesquisa em
Relações Econômicas Internacionais. Ficam comprometidos
os planos de modernizar aeroportos e portos marítimos, fundamentais para ampliar o fluxo
econômico do país.
Fatores internos também influem negativamente, como a
complexa legislação sobre a
propriedade de terra. Na semana passada, o grupo Tata teve
de transferir a fábrica em que
desenvolvia o carro mais barato
do mundo, o Nano, após ruidosa disputa em torno da desapropriação das terras.
"As dificuldades de aquisição
de terras são o maior obstáculo
para o desenvolvimento de infra-estrutura na Índia e um
empecilho para o investimento
estrangeiro", diz Pronab Sen.
Num momento de aversão generalizada ao risco, a complexidade indiana tende a afugentar
os recursos externos.
Para os indianos, as incertezas domésticas parecem assustar mais que as turbulências externas. O tamanho do Estado é
a principal queixa. "Há uma extensa pauta de liberalização
que o governo precisa adotar
para deixar a economia crescer", diz Habil Khorakiwala,
presidente da farmacêutica
Wockhardt e um dos 40 homens mais ricos da Índia.
Entre as medidas mais urgentes, ele aponta, além da facilitação nas aquisições de terras,
o investimento na distribuição
de produtos agrícolas e o incentivo ao investimento estrangeiro. "Isso poderia compensar a
crise e manter o ritmo de crescimento dos últimos anos", diz.
De fato, nada parece capaz de
conter o milagre econômico da
Índia. Mesmo com 300 milhões de pessoas abaixo da linha da pobreza, uma arquitetura social que os próprios indianos não sabem explicar, um índice de abandono escolar de
90% e uma taxa de analfabetismo perto de 40%, o país continua exportando cérebros. Fôlego ainda para a indústria de tecnologia, em franca expansão.
O jornalista viajou a convite
da India Brand Equity Foundation
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