São Paulo, terça-feira, 12 de dezembro de 2000

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OPINIÃO ECONÔMICA

Barricada

BENJAMIN STEINBRUCH

O protecionismo dos países ricos passa dos limites. O próprio Banco Mundial, instituição dominada pelas nações desenvolvidas, acaba de divulgar informações comprometedoras sobre o comportamento dos ricos em matéria de barreiras comerciais.
Sempre que são criticados pelas tarifas impostas contra a importação de países do Terceiro Mundo, as nações desenvolvidas têm uma resposta na ponta da língua: nossas tarifas médias são muito mais baixas do que as de vocês.
De fato, elas têm razão sobre as tarifas médias. O estudo do Banco Mundial indica que, em média, o Canadá, a União Européia, o Japão e os Estados Unidos cobram tarifas entre 4,3% e 8,3%. Enquanto isso, as do Brasil atingem 13%, por exemplo. Além disso, os Estados Unidos ainda argumentam que apenas 311 produtos, de um total de 15 mil, sofrem taxação de importação com alíquota superior a 15%.
Tudo muito bom, tudo muito bem. Só que há um detalhe importante: embora essas tarifas médias sejam baixas, tais países praticam os chamados picos tarifários, ou seja, cobram alíquotas muito altas para alguns produtos. E adivinhem quais são os itens mais atingidos pelos picos tarifários? Exatamente os produtos mais competitivos, agrícolas ou industriais dos países em desenvolvimento.
Alguns exemplos:
A União Européia aplica tarifa de 180% sobre a importação de bananas que excede a cota prevista;
O amendoim descascado é taxado em 550% nos Estados Unidos e em 132% no Japão;
Carnes, açúcar, leite e chocolate são gravados em mais de 100% tanto na Europa como no Japão, Canadá e Estados Unidos.
Esses exemplos são do Banco Mundial. Mas há outros, bastante conhecidos e que afetam especificamente as exportações brasileiras para os Estados Unidos:
O suco de laranja sofre taxação aduaneira de US$ 418,20 por tonelada;
Calçados pagam tarifas de até 50%;
Carnes bovinas e de aves estão proibidas de entrar nos Estados Unidos sob a alegação do não-cumprimento de medidas fitossanitárias;
Produtos siderúrgicos estão barrados por processos antidumping e anti-subsídios;
O álcool sofre taxação ad valorem de 2,5% mais tarifa específica de 14,27 centavos de dólar por litro, que inviabiliza a exportação.
Depois dessa relação de picos tarifários e outras barreiras, o argumento de que as tarifas médias desses países são baixas faz lembrar a velha história do homem que tinha a cabeça no fogo e os pés no gelo. Sua temperatura média era ótima, mas estava morto, com a cabeça queimada e os pés congelados.
Essas barreiras deixam claro que há hipocrisia quando os países avançados tentam dar lições de liberalismo comercial e de globalização aos emergentes. Enquanto pregam o liberalismo, praticam o protecionismo para manter em funcionamento setores ineficientes. Sem as barreiras, muitos produtos primários ou industriais de países emergentes poderiam entrar facilmente nos mercados mais ricos e lá obter receitas em dólares.
O próprio diretor do grupo Perspectivas e Política Econômica, Uri Dadush, que preparou o estudo do Banco Mundial, usou a palavra "barricada" para descrever a situação retratada no trabalho.
Bem definido: são as barricadas comerciais das nações ricas. Com elas, mantêm a ineficiência de muitos setores produtivos, que não têm mais condições de competir em preço e qualidade com seus concorrentes dos países mais pobres.

Benjamin Steinbruch, 47, empresário, é presidente dos conselhos de administração da Valepar e da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail: bvictoria@psi.com.br


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